Trama revigora e enfatiza criatividade ímpar do chef Lênin Palhano

Lênin Palhano está de volta. Sim, aquele Lênin Palhano criativo, ousado, pesquisador, garimpador de novos produtos e novas texturas reapareceu brilhando.

Não que não estivesse por aqui. Pelo contrário, exerce com eficiência a função de chef executivo e diretor do Grupo Acuro – ao qual o Trama se integra -, responsável também pelos restaurantes Feér e Bee.O Café. Só que lá a pegada é diferente, um tanto mais formal, embora sem deixar de apresentar as nuanças que sua personalidade como cozinheiro costuma proporcionar.

Quer dizer: nada é tão simples assim, como parece. No conceito, sim, mas cada prato exibe um item que talvez outra pessoa nem pensasse. Exemplo: os Croquetes de shiitake, que brilham como entrada no novo menu do Feér (escrevi a respeito dias atrás, confira aqui, quando anunciei que o Trama estaria por chegar).

E veio o Trama. Com ele, a retomada daquele chef irrequieto, que nos deixava saudades dos tempos do Nomade e da primeira fase do Obst., quando se doava por inteiro a conceber cada item, cada etapa dos menus que apresentava.

É o que se sente hoje no Trama, que tem abertura oficial marcada para esta sexta-feira (21). Tive o privilégio de pode antecipar esta sensação, esta vibração, em duas oportunidades. A primeira delas, no aniversário de uma pessoa muito querida (e muito ligada a Palhano), que fez sua festa lá. A segunda, na exposição formal da casa para um grupo de amigos, fornecedores e um e outro da imprensa. E a somatória das duas vezes me renovou a certeza de estarmos novamente à frente do chef que não tinha limites para conquistar reconhecimento e prêmios.

O Trama ocupa um espaço relativamente pequeno na Prudente de Moraes e passa uma sensação muito intimista. Faz predominar as cores preta e dourada e é dividido em dois salões, uma cozinha aparente, à vista do cliente, e um quintal, com algumas mesas postas para os dias de tempo bom. Dá para dizer tratar-se de um refúgio intimista, no qual a gastronomia criativa encontra a sensibilidade de quem valoriza cada detalhe da experiência culinária.

Nas duas experiências, tive a regalia de poder sentir toda a energia na essência que Lênin Palhano provoca em suas criações. Os menus expuseram diferenças, mesmo nos pratos que teoricamente foram repetidos. Como uma apresentação de massa com rabada. Na primeira oportunidade, serviu Agnolini com recheio de rabada, caldo de mocotó e pimenta cambuci. Na outra, Tortellini, recheio de rabada, rabada, agrião e caldo de mocotó – o caldo de mocotó caiu divinamente na combinação da receita. Em qualquer uma das versões, o que ficou marcado foi o intenso sabor na combinação das duas carnes, de se repetir e repetir.

O Denver também ganhou duas feições. Primeiro, Denver com batatas e cogumelos e depois somente Denver e cogumelos, com o toque dos fungos no molho, cremoso e aconchegante, e um surpreendente cogumelo morille (acho incrível) roubando a cena. Denver, aliás, é o corte – de dianteiro – queridinho de momento. E realmente compensa a fama, é muito bom.

Uma das sobremesas também teve dupla interpretação. Em uma vez, Sagu de amora, lavanda e morango. Na outra, Sagu de amora, lavanda, matcha e morango. Um pequeno toque que dá a diferença, apesar de o cerne da criação permanecer inalterado.

Nessas duas experiências, algumas combinações de sabores me marcaram. O Zabaione com uni (ouriço) e limão é arrebatador – sou suspeito, sei, venero o uni -, com uma cremosidade a mexer com o paladar. Também conquista o Caranguejo com flocos e milho e algas, ressaltando a delicadeza da carne desse crustáceo (ali, centolla). O incomparável atum bluefin também chegou em duas versões. Primeiro, Bluefin com brioche e ovas e daí Bluefin tataki com molho de mexilhões e salada.

Duas entradas frias, que chegaram juntas, convidam o comensal a seguir adiante: Tartar de vieira com ovas de mujol e lardo e Ostra ao molho de capim-limão e laranja. No outro dia vieram juntas, vieira e ostras, em prato principal:  Vieira, com maçã, capim-limão e ostra. Já o pururuca do Frango frito com creme de pecorino e trufas dá outra conotação às entradas.

Foi uma bela mostra do que virá por aí a partir desta sexta-feira, com a abertura oficial do Trama. Ao contrário de experiência anterior de Lênin Palhano, o cardápio não deve alterar diariamente e, sim, manter uma regularidade, com alterações pontuais, no caso de inspiração por algum ingrediente ou insumo que possa surgir.

Com uma proposta que vai muito além de um simples jantar, o Trama é um convite para explorar novas combinações de sabores, texturas e aromas. Do mobiliário e obras de arte à iluminação pensada para criar uma atmosfera única, o restaurante chega com a proposta de ser uma casa para aqueles que buscam experiências gastronômicas transformadoras. Como Palhano faz questão de enfatizar, o Trama é um espaço proposto para refletir maturidade, experiência, reflexão e tempo de cozinha. O trabalho ali é com a gastronomia criativa e de produto, trazendo insumos de extrema qualidade. Cada prato é cuidadosamente elaborado com ingredientes frescos e de fornecedores regionais e nacionais especialmente selecionados, sempre respeitando a sazonalidade e a proposta de uma culinária autoral e inovadora.

Com a cozinha aberta, os clientes terão a oportunidade de acompanhar de perto o processo de criação, testemunhando a arte de transformar insumos simples em obras-primas. O foco está na pesquisa, na qualidade dos produtos e na busca constante pela evolução do sabor.

A carta de vinhos, também pensada com atenção aos detalhes, se destaca pela sua diversidade, dinamismo e pela busca por rótulos inovadores. Combinando vinhos de diversos fornecedores e rótulos de renome internacional, ela complementa o conceito de um restaurante que desafia o público a explorar novas possibilidades.

São 100 rótulos escolhidos pelo experiente sommelier Emiliano Lauriano – dos quais alguns nacionais de respeito, como a linha da Cata Terroirs -, sendo 40 deles também disponíveis em taças, já que a casa conta com a tecnologia do equipamento Coravin, aquele sistema que permite servir vinhos em taça sem precisar remover a rolha da garrafa, mantendo seu frescor e sua qualidade.

Isso tudo, enfim, resume o que representa Lênin Palhano em sua ressurreição. E, no fundo do fundo, era tudo o que, certamente, nós todos ansiávamos em querer fazer acontecer.

Em tempo: inevitável querer saber da razão de o nome “Trama” ter sido escolhido. Saiu do nada, conforme ouvi de Lênin Palhano. Veio ao acaso. Na fase preparatória, estavam na cozinha realizando uma sessão de massas e aí estas começaram a formar uma rede de glúten, uma trama de glúten. Foi o estalo. Além de poder significar uma boa trama de ideias, de conversa... e aí o restaurante foi batizado.

Alameda Prudente de Moraes, 1118 - Centro

Horário: Terça a sábado, das 19h às 23h

Reservas: @trama.restaurante