Restaurantes
Bar serve vinhos e tapas escondido em estrada entre Punta e o interior do Uruguai
MONTEVIDÉU, URUGUAI — Parece até locação de filme: uma rotatória divide as estradas que dão para o interior do Uruguai de um lado e, do outro, o asfalto em linha que leva ao balneário milionário de Punta del Este. A menos de 100 metros dali, logo depois de um posto de gasolina Ancap, letras coloridas em um cavalete de lousa convidam o passante a provar os “vinos y tapas!” do dia. Mas é preciso atenção. Antes do pôr do sol, o bar Solera passa imperceptível aos motoristas distraídos de Jose Ignacio, no distrito de Maldonado. É apenas à noite que o deque de madeira posicionado em meio a dois contêineres pintados de azul claro esbanja todo o seu charme.
É o tipo de lugar onde você se sente em casa nos primeiros minutos. À medida que os olhos se acostumam com a iluminação amarelada do varal de lâmpadas incandescentes e das velas robustas nas
mesas baixas e altas, cada detalhe do cenário merece ser guardado na memória. À esquerda, um dos contêineres funciona como uma cozinha estreita e alongada onde dá para ver três cozinheiros numa coreografia harmonizada com ingredientes frescos e caldos perfumados.
mesas baixas e altas, cada detalhe do cenário merece ser guardado na memória. À esquerda, um dos contêineres funciona como uma cozinha estreita e alongada onde dá para ver três cozinheiros numa coreografia harmonizada com ingredientes frescos e caldos perfumados.
À direita, o segundo contêiner é ocupado por poucas mesas e muitas prateleiras de vinhos – 280 rótulos
do mundo todo, 60 deles uruguaios. O corredor que liga as duas estruturas é o bar de Soledad Bassini. A idealizadora de todo o espaço vem de lá com duas garrafas nas mãos ao som de Zaz. “Hola, hola, como están? Vamos começar com um Alvarinho Garzón?”, diz ela sorrindo enquanto organiza as taças na mesa com a destreza que só alguém que trabalhou por 16 anos como sommelière pode ter.
do mundo todo, 60 deles uruguaios. O corredor que liga as duas estruturas é o bar de Soledad Bassini. A idealizadora de todo o espaço vem de lá com duas garrafas nas mãos ao som de Zaz. “Hola, hola, como están? Vamos começar com um Alvarinho Garzón?”, diz ela sorrindo enquanto organiza as taças na mesa com a destreza que só alguém que trabalhou por 16 anos como sommelière pode ter.
Sole quis abrir o próprio bar desde o começo de sua carreira com vinhos, mas foi apenas em dezembro de 2017, aos 40 anos, que o sonho se concretizou. Tudo no Solera foi pensado por ela. Junto com o marido, Fernando Rodriguez, reformou e decorou os quase 100 metros quadrados do ambiente, selecionou as marcas de vinhos que entrariam para o portfólio e definiu item por item do cardápio.
Sua passagem como especialista em tintos, brancos, espumantes e rosés pelos melhores restaurantes do Uruguai foi mais eficaz do que se tivesse apostado, também, em um curso de gastronomia: cada tapa que sai da cozinha, seja ela quente ou fria, feita com frutos do mar ou com carne vermelha, é prova de um paladar exigente e repleto de referências.
“Todos esses anos eu experimentei coisas muito diferentes e deliciosas. Isso aqui não me deixa negar”, exclama Soledad, rindo, enquanto aponta para os quadris largos emoldurados por uma jeans escura.
“Quando montei o cardápio, queria coisas que eu gosto muito: queijos, vinhos e sempre algo fresco para compartir. Esse peixe que você provou, por exemplo, foi pescado hoje às duas da tarde. No início, nós até tentamos congelar por um ou dois dias, mas decidi que só sirvo peixe fresco. Se está chovendo, não tem”. Sazonalidade é um termo sagrado para ela. Isso ficou claro para mim em uma segunda visita ao Solera, em agosto deste ano.
Muitos dos petiscos que provei cinco meses antes não estavam mais disponíveis, como as delicadas amêijoas de Coronilla servidas no caldo quente de vinho branco, tomilho fresco e alho, ou a inesquecível compota de kinkan (feita pela mãe de Sole) acompanhada de queijo de cabra, uvas em cacho e torradas finíssimas de baguete.
No lugar delas, entraram espetinhos de camarões al ajillo e um ensopado de frutos do mar tão aconchegante quanto o abraço da pessoa amada. Para minha alegria, os pimientos de piquillo continuaram no cardápio de inverno: pimentões menores que a palma da mão conservados em azeite e recheados com uma mistura de queijo de cabra fresco, ervas e nozes. Chegam à mesa salpicados de chia e servidos sobre a mesma torrada de baguete da compota de quinotos.
“Venha, agora prove este”, diz a uruguaia. Desvio o olhar ainda incrédulo dos pimientos para uma segunda taça colocada à minha frente. Nem preciso ver o rótulo antes de beber um gole para saber que Soledad acertará na escolha. De novo.
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