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Lia Quinderé: a pesquisadora da confeitaria do Brasil
Natural de Fortaleza, Lia Quinderé foi estudar pâtisserie na França, terra da arte em açúcar. Estudou na conceituada Le Cordon Bleu e depois foi aos Estados Unidos especializar-se em Cake Design na Wilton School, em Chicago, e voltou ao Brasil para abrir a Sucré. Dos primeiros macarons à jujuba de caju, criação sua, a cearense agregou à técnica clássica a busca pela identidade brasileira. Reconhecida como uma das chefs pâtissières mais importantes do Brasil, Lia deixou de lado os estudos em Direito para se dedicar aos doces. Concluiu os estudos depois, para ter a formação, mas não atuou na área. Sua decisão se mostrou acertada: começou preparando doces em casa e em 2008 abriu a primeira Sucré, sua confeitaria que hoje tem mais de 20 pontos de venda no Brasil, e três lojas em seu estado natal.
O Bom Gourmet conversou com Lia Quinderé por telefone sobre confeitaria brasileira. Confira:
BG: O que você identifica como confeitaria brasileira?
Lia Quinderé: Mais que técnica, a confeitaria brasileira é ingrediente. Tem mistura de técnica de outros países, como dos conventos portugueses e a tradicional francesa, mas ao longo do tempo fomos mostrando a confeitaria brasileira pelo uso do ingrediente e pela preferência de sabor. Mousse de maracujá, doce de goiaba com leite Ninho ou creme de leite, doce de banana com queijo coalho, tapioca com leite condensado e lascas de coco… São doces da nossa infância aqui no Ceará e representam bem nossa maneira de comer doce.
BG: E como é essa preferência brasileira para doces?
Lia Quinderé: Gostamos do gosto do açúcar presente. Tem chef que tem vergonha de dizer que gosta de comer chocolate ao leite. Eu não tenho. O meio amargo também é legal, mas o ao leite me remete à infância e nenhum chocolate vai ter a mesma textura e derreter na boca dessa maneira. Quando eu estudava na França, cada um dos alunos fazia um almoço para reunir todo mundo. Na minha vez fiz feijoada, churrasco, brigadeiro e doce de leite, mas ninguém conseguiu comer, porque diziam que era muito doce. Eu e minha colega brasileira comemos sozinhas.
BG: Na sua opinião, como está a confeitaria brasileira autoral?
Lia Quinderé: Há uma dormência em relação à identidade da confeitaria. De uns tempos para cá fomos influenciados pela pesquisa em ingredientes nacionais que chefs como Alex Atala têm valorizado. Mas ainda estamos engatinhando, há muitos confeiteiros que só olham para fora. O que a gente deve valorizar, por uma questão logística, é o que é produzido próximo de nós e incentivar toda a cadeia gastronômica, do produtor ao consumidor final. Mas há demanda para doces como macaron de framboesa. Nós também fazemos isto na Sucré, mas não é o principal.
BG: O que você está pesquisando atualmente?
Lia Quinderé: Na Páscoa fizemos um ovo de chocolate com farofa de farinha d’água de uma comunidade do Maranhão,com castanha de caju, manteiga e açúcar mascavo. Faço jujuba de caju, estou desenvolvendo um chocolate de cupuaçu e também um trabalho com queijo de cabra da região e rapadura preta, que é um resgate de um produto que sofre preconceito. Todo mundo acha que essa rapadura é menos pura porque é a borra do tacho, mas é mais saudável e gostosa que a alva.