Pessoas
Pai e filho plantam seus ingredientes e defendem a comida orgânica em Maceió
Depois de nove edições em Curitiba, o Gastronomix aterrissou em Santa Catarina no último fim de semana, com 11 pratos exclusivos que custaram de R$ 10 a R$ 20. Entre os maiores sucessos do evento estava o sanduíche de filé de porco desfiado com cebola criolla, catchup de açaí e queijo do reino, elaborado pelos chefs André e Vitor Generoso, do Divina Gula, em Maceió.
André, o pai, trocou Minas Gerais por Alagoas há mais de trinta anos, onde criou o premiado Divina Gula. Sua paixão não é apenas a cozinha, mas o mato, as sementes, e a sustentabilidade. A formação de engenheiro ambiental impacta toda a rotina do restaurante, cujos ingredientes orgânicos vêm do sítio da família, inclusive a carne de porco, o lixo é reciclado e há toda uma infraestrutura para economizar água e energia.
O filho acabou de se formar no prestigioso Instituto Paul Bocuse, na França, e se reveza entre o estabelecimento da família e eu um estágio no Peru.
Mesmo com formações distintas, pai e filho mostram grande sintonia na cozinha. O prato preferido dos dois, no Divina Gula, é o mesmo, a desfiada confiada: um purê de inhame com batatas, abobrinha e queijo minas misturado à carne de sol desfiada e refogada com tomate, cebola, manjericão e salsinha.
Ambos também compartilham a preferência pela comida brasileira e dispensam o rótulo de alta gastronomia.
Que prato vocês trouxeram para o Gastronomix?
André: É uma receita que eu pensei junto com o meu filho, tem um toque francês porque ele acabou de se formar lá, no Institut Paul Bocuse, em Lyon. Ele fez uma maionese com óleo defumado no carvão. Assamos o alho na churrasqueira também, para pegar o gostinho de defumado. Eu queria usar o açaí, que eu estou plantando no meu sítio: eu planto para fornecer para o meu restaurante, numa cidade perto de Maceió. Então eu peguei uma receita clássica de catchup e substituí: usei 20% de tomate e 80% de polpa de açaí, que eu mesmo faço. Deu uma consistência boa e o pessoal ficou muito curioso, todo mundo queria provar. Estou até começando a pensar em engarrafar esse catchup.
André: É uma receita que eu pensei junto com o meu filho, tem um toque francês porque ele acabou de se formar lá, no Institut Paul Bocuse, em Lyon. Ele fez uma maionese com óleo defumado no carvão. Assamos o alho na churrasqueira também, para pegar o gostinho de defumado. Eu queria usar o açaí, que eu estou plantando no meu sítio: eu planto para fornecer para o meu restaurante, numa cidade perto de Maceió. Então eu peguei uma receita clássica de catchup e substituí: usei 20% de tomate e 80% de polpa de açaí, que eu mesmo faço. Deu uma consistência boa e o pessoal ficou muito curioso, todo mundo queria provar. Estou até começando a pensar em engarrafar esse catchup.
A gente pensou no queijo, que é tipo um gouda, bem parecido. Fizemos alguns testes com carne de porco e descobrimos que o filé é o que tem menor perda na cocção. O lombo é mais seco e o pernil daria muito trabalho para desfilar. Enfim, mineiro, né? Mineiro adora uma carne de porco. Nordestino não tem tanto esse costume. Agora até está voltando esse negócio de cozinhar com banha de porco. A gente aproveita essa gordura para fazer, lá no Divina Gula, o tutu, o feijão tropeiro, refogar a couve.
O trabalho que vocês fazem no Divina Gula pode ser chamado de alta gastronomia?
André: Não. Eu prefiro dizer que é comida brasileira bem feita. A essência do nosso restaurante, que completa 30 anos em janeiro, é lembrar o gostinho de casa, de antigamente. Eu acho que o brasileiro está com essa mania de elitizar, a gente tem que colocar o pé no chão e lembrar quem somos. Todo mundo está enjoado demais.
André: Não. Eu prefiro dizer que é comida brasileira bem feita. A essência do nosso restaurante, que completa 30 anos em janeiro, é lembrar o gostinho de casa, de antigamente. Eu acho que o brasileiro está com essa mania de elitizar, a gente tem que colocar o pé no chão e lembrar quem somos. Todo mundo está enjoado demais.
O Divino Gula é um restaurante familiar. Toda a família trabalha nele. Os seus filhos sempre pensaram ir para esse caminho da gastronomia também?
André: O mais velho fez Administração em Curitiba e resolveu fazer gastronomia também. Mas ele fica com essa parte de gestão mesmo. O único prato que ele faz em casa é lasanha. Eu costumo dizer que vou lançar lá no restaurante e vai se chamar a lasanha mais cara do mundo, porque eu tive que pagar uma faculdade para esse menino aprender a fazer uma lasanha. E o Vitor foi estudar gastronomia também por causa do Gastronomix. Na segunda vez que eu fiz o evento, ele foi junto. E foi muito pauleira, de 600 a 800 pratos por dia. Quando terminou o evento, eu falei para ele que isso era cozinha de verdade e
perguntei se era isso mesmo que ele queria. E o menino quis mesmo assim. Então, falei para ele estudar.
André: O mais velho fez Administração em Curitiba e resolveu fazer gastronomia também. Mas ele fica com essa parte de gestão mesmo. O único prato que ele faz em casa é lasanha. Eu costumo dizer que vou lançar lá no restaurante e vai se chamar a lasanha mais cara do mundo, porque eu tive que pagar uma faculdade para esse menino aprender a fazer uma lasanha. E o Vitor foi estudar gastronomia também por causa do Gastronomix. Na segunda vez que eu fiz o evento, ele foi junto. E foi muito pauleira, de 600 a 800 pratos por dia. Quando terminou o evento, eu falei para ele que isso era cozinha de verdade e
perguntei se era isso mesmo que ele queria. E o menino quis mesmo assim. Então, falei para ele estudar.
A tua formação de engenheiro florestal influenciou a tua cozinha?
André: Então, eu praticamente introduzi a cultura orgânica no estado de Alagoas. O pessoal plantava muito fumo no interior e quando deu uma queda nessa produção. Junto com o Sebrae, a gente conseguiu transformar isso, esse pessoal do fumo hoje planta orgânico: mandioca, coentro. Eu ficava indignado porque Alagoas, um estado tão rico, importava alface. A maior parte dos meus ingredientes do restaurante eu mesmo planto: frutas, açaí, pimenta do reino. A gente também sempre fez um trabalho de economizar água. Agora vou construir uma usina fotovoltaica, que vai abastecer em 40% a energia do restaurante. O lixo sempre foi reciclado. Eu faço um projeto também chamado Caixinha do Lixo. É uma espécie de fundo, abastecido pelo dinheiro do lixo que eu vendo, e serve para ajudar quem perdeu o telhado por causa da chuva, essas coisas.
André: Então, eu praticamente introduzi a cultura orgânica no estado de Alagoas. O pessoal plantava muito fumo no interior e quando deu uma queda nessa produção. Junto com o Sebrae, a gente conseguiu transformar isso, esse pessoal do fumo hoje planta orgânico: mandioca, coentro. Eu ficava indignado porque Alagoas, um estado tão rico, importava alface. A maior parte dos meus ingredientes do restaurante eu mesmo planto: frutas, açaí, pimenta do reino. A gente também sempre fez um trabalho de economizar água. Agora vou construir uma usina fotovoltaica, que vai abastecer em 40% a energia do restaurante. O lixo sempre foi reciclado. Eu faço um projeto também chamado Caixinha do Lixo. É uma espécie de fundo, abastecido pelo dinheiro do lixo que eu vendo, e serve para ajudar quem perdeu o telhado por causa da chuva, essas coisas.
Você pensa em se aposentar e passar o posto para o filho?
André: Não vou largar a cozinha agora, mas o que me cansa é essa parte de gestão, de ter que resolver as coisas. Eu quero ficar mais no mato, cuidando das sementes, da criação. Acho que o Vitor não está novo para assumir o posto. São só 22 anos. Ele precisa rodar mais e encontrar a própria identidade.
Ele se formou ano passado na França, agora está fazendo um estágio no Peru.
André: Não vou largar a cozinha agora, mas o que me cansa é essa parte de gestão, de ter que resolver as coisas. Eu quero ficar mais no mato, cuidando das sementes, da criação. Acho que o Vitor não está novo para assumir o posto. São só 22 anos. Ele precisa rodar mais e encontrar a própria identidade.
Ele se formou ano passado na França, agora está fazendo um estágio no Peru.
Ele também vai fazer um curso de seis meses no Instituto Basco de Gastronomia, para quem já estudou e trabalha no ramo. Eu falo muito para essa meninada da gastronomia, que só quer tirar foto e sair na revista, que eu, com 30 anos de carreira nas costas, ainda preciso trabalhar às vezes de sete da manhã às duas da madrugada.
O seu pai tem uma formação com base na experiência, na cultura familiar, e você agora tem um formação clássica. Na cozinha do Divina Gula, elas se complementam?
Vitor: Sim. Meu pai sempre tem umas ideias novas na cabeça e eu sou mais da parte da técnica. Tem coisa que ele já faz que fica bom, mas dá para aperfeiçoar com os métodos que eu aprendi lá fora. Então a gente sempre cria coisas juntos, como a receita que a gente trouxe aqui hoje, o porquinho arretado. Ele é um mix de nós dois juntos. No restaurante, a gente fica mais em espaços separados. Ele cuida muito da parte da burocracia junto com a minha mãe e eu tenho ficado mais com o pé na cozinha, supervisionando o pessoal. Mas nos fins de semana, dias de grande movimento, é sempre nós dois juntos na cozinha. E para sobremesa nós dois somos parecidos. Não gostamos muito, não. E meu pai, sem gostar muito, criou o quero-quero, que é um biscoito de castanha com cream cheese adoçicado e calda de goiabada. Faz muito sucesso. E eu não me imagino fazendo outra coisa que não seja cozinhar. Não consigo pensar em outro emprego.
Vitor: Sim. Meu pai sempre tem umas ideias novas na cabeça e eu sou mais da parte da técnica. Tem coisa que ele já faz que fica bom, mas dá para aperfeiçoar com os métodos que eu aprendi lá fora. Então a gente sempre cria coisas juntos, como a receita que a gente trouxe aqui hoje, o porquinho arretado. Ele é um mix de nós dois juntos. No restaurante, a gente fica mais em espaços separados. Ele cuida muito da parte da burocracia junto com a minha mãe e eu tenho ficado mais com o pé na cozinha, supervisionando o pessoal. Mas nos fins de semana, dias de grande movimento, é sempre nós dois juntos na cozinha. E para sobremesa nós dois somos parecidos. Não gostamos muito, não. E meu pai, sem gostar muito, criou o quero-quero, que é um biscoito de castanha com cream cheese adoçicado e calda de goiabada. Faz muito sucesso. E eu não me imagino fazendo outra coisa que não seja cozinhar. Não consigo pensar em outro emprego.
Quando você pensa numa nova criação, ela parte de um ingrediente ou de uma técnica?
Vitor: Eu penso no ingrediente e no que eu posso fazer com ele. Eu já tinha feito um estágio num restaurante com estrela Michelin na França, o Domaine de Clairefontaine. Mas pensei em ir para Lima, no restaurante Malabar, porque eles têm esse foco no ingrediente e eu gosto muito de comida peruana.
Vitor: Eu penso no ingrediente e no que eu posso fazer com ele. Eu já tinha feito um estágio num restaurante com estrela Michelin na França, o Domaine de Clairefontaine. Mas pensei em ir para Lima, no restaurante Malabar, porque eles têm esse foco no ingrediente e eu gosto muito de comida peruana.
No sanduíche de carne de porco que a gente trouxe ao Gastronomix, tem a cebola criolla, inclusive, que é uma cebola com vinagrete peruano. E lá eu realmente me achei mais porque os produtos deles também podem ser encontrados no Brasil. O chef do Malabar também usa muitos ingredientes amazônicos. Eu aprendi muita fermentação de frutas e verduras lá. Uma das receitas que já deve entrar no cardápio do Divina Gula, na semana que vem, é a banana fermentada com camarão grelhado.
Depois do estágio no Peru, você fica de vez no Divina Gula?
Ainda não. Em fevereiro vou fazer uma pós na Espanha por 10 meses, no Instituto Basco de Gastronomia. Depois quero rodar uns dois anos, antes de voltar para o Divina Gula. Lá eu não posso mexer muito na cozinha, porque é um restaurante clássico, tem 30 anos. O povo ia me matar. Então eu penso em criar alguma coisa para mim em Maceió, meu próprio tipo de cozinha, uma mistura do que eu já aprendi e o que vou aprender ainda.
Ainda não. Em fevereiro vou fazer uma pós na Espanha por 10 meses, no Instituto Basco de Gastronomia. Depois quero rodar uns dois anos, antes de voltar para o Divina Gula. Lá eu não posso mexer muito na cozinha, porque é um restaurante clássico, tem 30 anos. O povo ia me matar. Então eu penso em criar alguma coisa para mim em Maceió, meu próprio tipo de cozinha, uma mistura do que eu já aprendi e o que vou aprender ainda.
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