Histórias
O que é necessário para ser um grande chef de cozinha?
O que há por trás de um grande chef? No dia em que é comemorado o dia nacional deste profissional à frente da cozinha, o Bom Gourmet procurou os dois chefs paranaenses mais premiados para ajudar a responder essa questão. Atualmente, Alberto Landgraf carrega duas estrelas Michelin pelo Oteque, no Rio de Janeiro, mas também recebeu a distinção quando era sócio do Epice, em São Paulo. Os dois estão na lista do Latin America's 50 Best Restaurants e do The Best Chef Awards, onde Manu Buffara ganhou o prêmio de chef em ascensão de 2020.
Coincidentemente, além da trajetória de reconhecimento internacional, a despeito de terem iniciado suas carreiras na gastronomia da capital paranaense, Alberto Landgraf, hoje à frente do carioca Oteque, e Manu Buffara, do curitibano Manu, os dois cresceram em Maringá, no Norte do Estado.
Mais do que serem conterrâneos, a dupla tem em comum o fato de colocarem o repertório como fator decisivo na carreira de um profissional de destaque na cozinha. "Um bom chef precisa desenvolver a criatividade, ter conhecimento, estudar, ler e viajar muito. É isso que me inspira. E também é necessário ter humildade ao lidar com a equipe", afirma Manu.
Para Alberto, o segredo do sucesso está em investir alto no aprimoramento do paladar, sentido fundamental no exercício da gastronomia. "Um chef deve comer o máximo possível, no máximo de lugares possíveis para construir repertório. A técnica hoje se aprende até pela internet, mas o paladar você desenvolve pegando avião, sentindo os sabores. É preciso saber o que é bom para fazer o que é bom".
O exercício criativo é outra ferramenta de aperfeiçoamento que pode fazer a diferença para ser um bom profissional. Por isso, com o conhecimento cada vez mais democratizado com a grande acesso de conteúdo, o chef dá total liberdade na sua cozinha. "Qualquer pessoa da minha equipe pode vir com ideia de prato, técnica ou processo. Minha obrigação é dar condições para essa criatividade aflorar e ter a responsabilidade de se der alguma bronca", diz.
Esse espírito libertário, que coloca sua equipe no mesmo patamar em que ele se encontra, joga por terra qualquer diferenciação clássica entre chef e cozinheiros. "Pra mim não há diferença alguma. Todo mundo é cozinheiro e chef é apenas a profissão. O organograma na cozinha é cada vez mais horizontal, com as responsabilidades divididas de maneira praticamente igual. Quem comanda a cozinha, tem um papel tão importante quanto o do cara que lava a louça. Não existe isso do chef lá em cima, num trono, e o cozinheiro lá embaixo, descascando batata", afirma.
Como reflexo deste pensamento, Alberto faz questão de dar a todos das suas cozinhas a chance de representar o restaurante em grandes premiações. "É bom para as pessoas não enjoarem da minha cara e uma forma de valorizar o time. E algo que motiva", acredita o chef.
Manu também acredita que, ao contrário da percepção de que muitas vezes o chef é colocado em um pedestal, o posto de chef é apenas uma decorrência de ser um cozinheiro. "Você vai se tornando chef por conta de sua experiência de vida, na cozinha e na gestão. Também pela liderança, maturidade e conhecimento. As pessoas se espelham em você e isso é muito bacana".
Gestão como diferencial
Se por um lado, entre fogões e panelas, as funções de chef e cozinheiro sejam simbióticas, quando o assunto é gestão, o responsável pela cozinha carrega a necessidade de habilidades empresariais mais aguçadas , fundamentais para que tudo funcione a contento em um restaurante. Mais do que nunca, durante a pandemia, tais qualidades ganharam ainda mais destaque.
Para Manu, a criatividade ficou mais aflorada por conta do coronavírus, que trouxe como consequência distanciamento social e outras medidas que impactaram o setor. "Costumo dizer que sou paga para criar. É esse o meu trabalho aqui. Mais do que nunca é transformar o simples no inusitado. O Manuzita é um exemplo disso, uma ideia tirada da cartola, de transformar uma janela em um local para servir comida".
Já Alberto acredita que aqueles que já possuíam uma boa base organizacional, conseguiram manter o equilíbrio em meio à crise. "Quem já tinha uma gestão bem estruturada acabou levando vantagem e seguindo adiante. Muitos que não tinham, acabaram se perdendo", reforça Alberto. Em meio à pandemia, o Oteque não apenas seguiu firme em seu propósito, como conquistou sua primeira estrela Michelin, um reconhecimento que, ao contrário do que possa parecer, não traz um peso.
"Estrela Michelin não traz mais responsabilidade. A responsabilidade é satisfazer o cliente. Prêmios são consequências de trabalhar com qualidade e tentar sempre ser um cozinheiro com uma equipe focada e com um propósito comum. É pensar toda a cadeia, de quem produz a quem come", finaliza o chef.