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Festa da Uva de Santa Felicidade comemora 60 anos em 2018
Se há 60 anos alguém dissesse ao senhor Armando Túlio que a quermesse da Paróquia de Santa Felicidade atravessaria mais de meio século de vida, ele daria risada. Mas hoje, ao olhar o tamanho que a Festa da Uva tomou, o neto de imigrantes italianos sorri de orelha a orelha: “Quando alguém começa uma festa assim, não imagina onde vai parar, não é?”, diz ele com um sotaque típico.

FOTO: ROGERIO THEODOROVY / GAZETA DO POVO
Junto dele, mais de 18 mil pessoas são esperadas nos três dias da tradicional Festa da Uva, que chega a 2018 comemorando seis décadas de criação. Entre os dias 2 e 4 de fevereiro, os descendentes de italianos de Santa Felicidade vão servir um verdadeiro banquete no Bosque São Cristóvão.
Os números da festa são superlativos: quatro mil quilos de macarrão, quatro mil de risoto, cinco mil de polenta e seis mil de frango a passarinho. Tudo isso será servido com a ajuda de 300 voluntários. De acordo com José Carlos Casagrande, um dos organizadores do evento, a Festa da Uva é um dos principais festejos do bairro, e também o mais longevo da história. “Quando foi criado, era apenas uma quermesse no pátio da Paróquia”.
Mas a Festa da Uva não é só de muito vinho e comida. Durante os três dias de evento, os grupos folclóricos e bandas de Santa Felicidade irão apresentar músicas tradicionais italianas e performances de dança para quem estiver lá. “O objetivo, além de arrecadar fundos para a as obras assistenciais da igreja, é mostrar que a cultura italiana tem mais do que apenas o macarrão e a Tarantella”, completa o organizador.
No primeiro dia de festa, na sexta-feira (2), serão distribuídos gratuitamente 400 quilos do Suculento Macarrão, uma porção-degustação de macarronada com molho bolonhesa e queijo ralado. A abertura tem a presença de autoridades locais e a apresentação do Grupo Folclórico Ítalo Brasileiro de Santa Felicidade, ao som de canções italianas do grupo musical “I Veneti in Brasile”.

História
A Festa da Uva começou como uma pequena feira onde os imigrantes vendiam as uvas plantadas nas chácaras do bairro. Armando Túlio, neto de imigrantes, tem 73 anos e participou do evento desde a primeira edição. “Eu moro na frente da Paróquia, é só atravessar a rua, e isso aqui virava uma festa naquela época”, conta. Antigamente, evento era realizado no pátio da igreja.
O pai de Armando não plantava uvas, mas vendia os cestos de vime que eram usados para transportar a fruta. A família dele é uma das 15 primeiras que vieram principalmente da região do Vêneto, no norte da Itália. Foram cerca de 900 pessoas em busca de melhores condições de vida, em um processo migratório que se intensificou na virada do século.
Naquela época, no começo dos anos 1900, Santa Felicidade já contava com mais de 200 famílias italianas plantando e produzindo de tudo um pouco. Embora o bairro seja conhecido pela produção de uvas e de vinhos, o bisavô do administrador Cláudio Lucca chegou para plantar milho. Ele explica que as parreiras demoravam a se desenvolver, e a família tinha de “pagar as contas”.

Mas, assim que conseguiu, a família de Cláudio Lucca começou a produzir suco de uva. “Tudo era feito em casa, até eu tinha de pisar na uva. Passava o dia inteiro macerando a fruta. Foi um tempo difícil, muito difícil”. Naquela época, os imigrantes trouxeram ramos de uvas principalmente da espécie Isabel, que se adaptou ao solo da região. Ele conta, ainda, que de Santa Felicidade saía todo tipo de alimento para abastecer Curitiba, todos os dias bem cedinho.
A Avenida Manoel Ribas, que hoje é toda pavimentada, antigamente era de terra e o único acesso do bairro ao Centro da capital. “Santa Felicidade era a horta de Curitiba, e as carroças com os alimentos começavam a sair às 5h30 da manhã”, conta Armando Túlio. “Vinha gente do Botiatuvinha e de Campo Largo para descarregar aqui antes de ir para o Centro”, completa.
O excedente da produção era então vendido na Festa da Uva, que teve a primeira edição realizada no dia 21 de janeiro de 1959 como uma evolução da antiga quermesse do movimento das Filhas de Maria, para festejar sua padroeira. O organizador, José Carlos Casagrande, conta que no começo as famílias vendiam apenas uvas, e depois que passaram a comercializar outros alimentos. E não existiam barracas, eles colocavam as caixas com os produtos no chão e vendiam.

Hoje em dia, as uvas vendidas na festa quase não são mais plantadas no bairro. A maior parte vem do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, inclusive variedades usadas para a produção de vinhos finos, como merlot, cabernet sauvignon e cabernet franc. A Isabel, aquela trazida pelos primeiros imigrantes, é utilizada nos vinhos de mesa.