Deise Campos
Notas Báquicas
Como tirar melhor proveito da clássica experiência gastronômica: queijos e vinhos
Vinhos e queijos andam juntos há milhares de anos. Vestígios arqueológicos atestam a existência desses dois grandes alimentos nos anos de 6.000 antes de Cristo. Nasceram juntos, logo a seguir ao momento da história em que a humanidade aprendeu a domesticar animais e viver deles, bem como da agricultura. Desde então o processo de produção evoluiu, diversificando-se conforme as peculiaridades e cada região e cultura.
São mais de mil os diferentes tipos de queijos existentes no mundo. Cada qual com seu gosto peculiar e personalidade própria. Só a França é responsável por mais de 350. Vinhos também, se os classificarmos pelas regiões produtoras e tipos (tinto, branco, rose, fortificados, espumantes), será muito acima do milhar a diversidade, talvez até maior que a dos queijos.
Apesar da enorme diversidade, nada de muito complicado. Ambos combinam às mil maravilhas. Basta um copo de vinho e um pedaço de queijo, sejam quais forem, um pão a escoltar os dois, e sempre dá muito certo. É a chamada Santíssima Trindade da mesa: pão, queijo e vinho.
Nem precisa dizer que vinho tinto ama o queijo e vice-versa. Agora, notem que também o vinho branco vai lindamente. Em muitos casos até melhor do que o tinto. Por exemplo, com um queijo de cabra, um vinho branco, vivaz e perfumado, é o paraíso. Vinhos fortificados, especialmente o Vinho do Porto, são acompanhantes universais, em especial para os grandes queijos. Também espumantes, notadamente com queijos mais leves e suaves.
Os queijos derivam do leite de três animais: vaca, ovelha e cabra. Em geral os de vaca são mais adocicados, enquanto os outros dois mais pungentes. Mas não é só o tipo de leite que define o sabor do queijo. A cura, ou seja, o tempo que o queijo é deixado a maturar antes de ser vendido, é outro fator da maior importância. Quanto mais curado, mais pungente e complexo torna-se o queijo. Há também o fator das leveduras, maneira de fazer e outros mais.
No serviço das refeições, o queijo é servido após o último prato e antes da sobremesa. Vai com o último vinho ou, melhor ainda, serve-se um vinho só para o queijo, neste caso em geral um vinho de sobremesa.
Como o leitor já percebeu faz tempo, as combinações entre queijos e vinhos são infinitas e sempre muito atraentes. A grande festa são as mesas de queijos e vinhos, onde vale a imaginação de cada um, com a disponibilidade existente no mercado.
Nada como reunir amigos ou familiares em torno de uma mesa com diversos tipos de queijos e até mesmo de vinhos, para ficar bebericando e comendo, com a conversa e animação crescente. Sempre escoltado por um ou mais tipos de pães. Às vezes também com frios e embutidos, além de algumas frutas, que ajudam a refrescar o paladar de quando em quando. A seguir, algumas dicas inspirar as mesas de queijos e vinhos.
Dicas para a harmonização perfeita:
- O primeiro mandamento é não se intimidar na escolha. A variedade de queijos e vinhos disponíveis é muito grande. Basta escolher aquilo que mais dá vontade. Sempre dará certo. Cada um terá seu paladar, a preferir esta ou aquela combinação. A conversa sobre as harmonizações à mesa, as preferências de cada qual, é outro fator estimulante.
- Queijo e vinho da mesma região sempre se dão muito bem. O leitor encontrará com facilidade na internet as regiões dos queijos e poderá então descobrir os respectivos tipos de vinhos e vice-versa. Aproveita e faz uma viagem sem sair de casa, um grande passatempo, que também estimulará muitas boas conversas.
- Também pode descobrir alternativas, com vinhos de outras regiões, mas de castas ou personalidade semelhantes, que fecham com o queijo. Por exemplo:
- Com Granna Padano ou o Parmegiano-Reggiano, os vinhos regionais seriam os da Emilia-Romagna na Itália, o que vale dizer uma multiplicidade de tintos e brancos, como piemonteses, do Veneto, Lombardia e mesmo da Toscana. Já de outro local, os malbecs da Argentina.
- Com Roquefort, brancos de sobremesa com a Moscatel, como Muscat de Rivesaltes ou de Beaumes de Venise. Também casa lindamente um glorioso Sauternes, de região adjacente. Ou ainda, de origem mais distante, o Vinho do Porto, espetacular com esse queijo e com todos aqueles com base em leite de ovelha ou ainda os demais queijos azuis. - Há países e regiões que produzem grandes queijos, mas não fazem vinhos que contem. Por exemplo, Holanda, Inglaterra e mesmo na França, regiões como Normadia e Isle de France. Vinhos de outras origens caem lindamente. Por exemplo:
- O Stilton, inglês (um queijo azul como o Roquefort ou o Gorgonzola), é par ideal para o Vinho do Porto.
- Os famosos Gouda, Maasdam e Edam, holandeses, falam às mil maravilhas com tintos de Cabernet, Merlot e brancos de Chardonnay, Riesling ou Gewurztraminer.
- O Camembert, da Normandia (terra da cidra e do calvados, aliás perfeitos com esse queijo) vai lindamente com vinhos de Gamay, tipo Beaujolais, e também Cabernet ou Merlot.
- O Brie, da região vizinha de Isle de France, dá-se muito bem com vinhos tintos frutados, sem muito peso, como Pinot Noir por exemplo.
- O Canastra, grande queijo brasileiro, da serra de mesmo nome em Minas Gerais, vai lindamente com tintos portugueses e mesmo alguns brancos mais intensos, como Douro, Dão e Bairrada. Ou o famoso vinho do Pico, dos Açores, porém raro e difícil de achar fora da região. - Há certos tipos de vinhos que são coringas com os queijos. Dão-se bem quase sempre. Por exemplo:
- Tintos frutados e de acidez contida, sem corpo excessivo, como aqueles oriundos de regiões mais quentes, por exemplo do sul da Itália, França, e da Espanha. Também, de Portugal, do Alentejo, Lisboa e Tejo. Ou os tintos do Novo Mundo, sejam de Pinot Noir, Syrah, Cabernet ou Merlot.
- Entre os brancos, os Chardonnay são os campeões.
- Vinhos de sobremesa, em especial o Vinho do Porto, também costumam escoltar muito bem a maior parte dos queijos. O teor alcoólico mais elevado, intensidade em geral maior e o adocicado combinam lindamente com a untuosidade, força e o salgado dos queijos. - Queijos de ovelha em geral pedem vinhos mais potentes. Os de cabra, vinhos mais leves, e em especial os brancos. Queijos à base de leite de vaca, tintos e brancos equilibrados e frutados.
- Evite abrir as garrafas de vinhos mais especiais com os queijos. Salvo uma ou outra exceção, quase sempre a força do queijo passa por cima e abafa a complexidade mais refinada dos maiores vinhos. Não é que não fique bom. Ocorre que se perde muito daquele algo mais que um vinho especial tem para dar, sem maior vantagem em relação à harmonização.