Bom Gourmet
Três curiosidades sobre o Ile de France que talvez você não conheça
![Thumbnail](https://resize.casapino.com.br/?u=https://cms-bomgourmet.s3.amazonaws.com/bomgourmet/2023/02/04104250/Ile-de-France.jpg&w=480)
O moderno Ile de France, no Batel desde 2021. Divulgação/Ile de France
Curitiba guarda preciosidades que ajudam a contar a história da cidade. Parte delas passa pelo circuito gastronômico criativo e inovador, que com o passar dos anos se consolida também como uma espécie de ponto turístico da cidade. Não há turista que saia de Curitiba sem dizer que experimentou as melhores refeições em restaurantes locais. Com mais de 70 anos de atividade, o Ile de France, símbolo da culinária francesa e um dos melhores restaurantes do Paraná segundo o Prêmio Bom Gourmet 2024, guarda algumas boas histórias, que talvez você ainda não conheça.
Ile 'censurado'
O início dos anos 1970 foram de encrudescimento da ditadura militar no Brasil. A maneira com que o governo da época endureceu a perseguição a quem entendia ser o 'inimigo' está registrada no filme Ainda Estou Aqui, com base em livro do mesmo nome, do escritor Marcelo Rubens Paiva. A fiscalização bem acima do tom foi tanta que até a censura apertou o certo, e atingiu, entre tantas outras esferas da sociedade, o Ile de France. Uma lista, com data de 31 de dezembro de 1971, definiu quais músicas estavam proibidas de serem executadas no estabelecimento no mês de janeiro do ano seguinte.
![O documento da Censura Federal com a lista de músicas proibidas, hoje emoldurado logo à entrada do Ile de France. Registro histórico. Foto: Bom Gourmet](https://resize.casapino.com.br/?u=https://cms-bomgourmet.s3.amazonaws.com/bomgourmet/2025/02/07173501/censura-ile-de-france-1024x782.jpg&w=661)
O documento, em duas páginas, foi transformado em um quadro, e está pendurado na parede repleta de lembranças logo à entrada do Ile de France, hoje no Batel. Com o carimbo da delegacia regional do Paraná do Departamento de Polícia Federal, definia quais canções o restaurante não poderia executar. Entre as francesas, "Paris en Collére", de Maurice Jarre, ", Isabelle", de Charles Aznavour, "A Couer Perdu", de J. Demarly, e a clássica "Je ne t'aime, plus", de Christophe (não confundir com "Je ne t'aime... moi no plus" de Serge Gainsbourg, eternizada com a participação de Jane Birkin).
Canções brasileiras também entraram na tesoura da censura, como "Com açúcar, com afeto", de Chico Buarque, e "Lata d'água", de Ataulfo Alves, interpretada por Elizete Cardoso. "My Sweet Lord", de George Harrison, e "Yesterday", dos Beatles, mas esta, na versão de Matt Monroe, também foram vetadas.
Taças da Normandia
![Foto: Bom Gourmet](https://resize.casapino.com.br/?u=https://cms-bomgourmet.s3.amazonaws.com/bomgourmet/2025/02/07171941/taca-651x1024.jpeg&w=661)
Marcia Oliveira, sócia e gestora do Ile de France, encontrou no acervo do restaurante umas taças pequenas que não estavam sendo utilizadas no dia a dia da casa. Em uma conversa com o proprietário Jean Paul Decock, foi informada de que se tratavam de taças dos pais dele, Janine e Emile Decock, utilizadas no Les Palmier, restaurante da família na Normandia. O casal era proprietário também de um hotel na região antes da Segunda Guerra Mundial, antes de virem para o Brasil, em 1948.
"No pé da tacinha, está escrito o nome, Les Palmier", informa Marcia. "Falei, 'vou resgatar isso. Não acredito em nada com um valor sentimental tão grande guardado no armário. Quero que os clientes vivam essa história", celebra. As taças chegaram a ser utilizadas passado do Ile de France, que iniciou as atividades em Curitiba em 1953, mas ao que tudo indica, em algumas ocasiões.
As tacinhas são parte de um acervo que a família Decock conseguiu salvar do período da Segunda Guerra, e que veio com eles para o Brasil. Além delas, há também algumas baixelas de prata, mapas e documentos. Dá próxima vez que você for ao Ile de France e receber o sorbet entre a entrada e o prato principal, confira o nome no pé da taça e perceba que ali está parte da história do restaurante e um registro, ainda que pequeno, da história do século 20.
Uma vizinhança pouco ortodoxa
![O primeiro endereço do Ile de France, na Rua Dr. Muricy, em Curitiba, que durou de 1953 a 1957. Reprodução/Ile de France](https://resize.casapino.com.br/?u=https://cms-bomgourmet.s3.amazonaws.com/bomgourmet/2025/02/07175159/ile-1024x669.jpg&w=661)
A primeira sede do Ile de France em Curitiba, em 1953, foi no andar térreo de um sobrado na Rua Dr Muricy. Ali, o casal Emile e Janine inaugurou, em 13 de fevereiro daquele ano, o restaurante que se tornou, com o passar dos anos, sinônimo da boa culinária francesa. Eram poucas mesas, mas a elegância do serviço já dava sinais que ela seria um dos predicados do estabelecimento ao longo dos anos.
O que o casal de fundadores não percebeu logo no início é que, no andar de cima, funcionava um estabelecimento, digamos, de movimentação pouco ortodoxa, mas que durou pouco tempo, e logo o imóvel passou a ser ocupado apenas pelo restaurante. Nem esse eventual contratempo abalou o modo generoso com que Emile e Janine serviam e a qualidade da culinária francesa oferecida naquele fim da primeira metade do século 20, quando Curitiba contabilizava pouco mais de 180 mil habitantes, o estádio Durival de Brito era o terceiro em tamanho no Brasil, e o o curitibano ainda usava o bonde para ir aos bairros do Batel e Seminário, Água Verde e Portão, Juvevê e Bacacheri.