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Mauro Colagreco, do premiado Mirazur, defende a transformação pela gastronomia.

Tendências

Basque Culinary Institute Talks: chefs reforçam o poder da transformação pela gastronomia

Gisele Rech
26/05/2021 21:50
Chefs de cozinha de várias partes do mundo foram os protagonistas do Basque Center Culinary Price Talks, com foco no poder da transformação pela gastronomia. O evento foi promovido pelo Basque Culinary Center (Centro Culinário Basco), da Espanha, e é uma prévia da premiação, que reconhece profissionais do setor responsáveis por iniciativas transformadoras, em áreas como inovação, meio ambiente e desenvolvimento social. O vencedor deste ano será conhecido em julho e as indicações serão feitas até segunda (31).
Em linhas gerais, os profissionais reforçaram a necessidade de repensar o modo de consumo dos alimentos e apontaram quais são os caminhos possíveis para a quebra de paradigmas arraigados na cena gastronômica e que, em maior ou menor grau, afetam a sustentabilidade e colocam em risco o futuro do planeta.
Para o premiado chef Mauro Colagreco, à frente do francês Mirazur, a tendência cada vez mais forte é a reconexão com os produtos que entram na cozinha. "Os cozinheiros manipulam o alimento para transformá-los. Para fazermos isso, precisamos conhecer não apenas sabor, mas o que está por trás desde alimento desde a ponta da cadeia. É um desafio em especial paras as novas gerações. Somos geradores de mudanças", acredita.
Transformação da gastronomia passa pelo conceito de sustentabilidade.
Transformação da gastronomia passa pelo conceito de sustentabilidade.
Na busca por essa reconexão, a chef colombiana Leonor Espinosa, vencedora do prêmio em 2017, reforça a importância da valorização da cultura gastronômica de cada país e de cada região. "Mais do que nunca, o momento é fundamental para reflexão e para entender a importância de se voltar cada vez mais a nossas raízes e aos nossos produtos, valorizando a cadeia produtiva". Essa é uma das frentes da Fundacíon Leo Espinosa, que trabalha com comunidades rurais das regiões do Pacífico e do Caribe Colombiano. A última realização da instituição foi a abertura de um restaurante comandado por mulheres destas comunidades, que funciona em um processo de cocriação.
Dar visibilidade às comidas regionais também é o foco do trabalho do chef Dieuveil Malonga, líder do coletivo Chefs in Africa, que busca tornar a comida dos países do continente africano mais conhecida. "Muitas vezes me perguntam o que comemos na África e se esquecem que a África é um continente composto por muitos países, com culturas gastronômicas bem distintas". No projeto, a ideia é buscar conexões entre profissionais, produtores e novos chefs, com a valorização dos pratos, dos produtos e ingredientes locais.
Na linha de valorização dos produtos locais, a pescadora peruana Karin Abensur reforça a importância do trabalho de pesca artesanal, encampado por ela na EcoFish. "O melhor pescador é o responsável. Quando comecei a pescar, ia atrás de peixes considerados nobres. Até que um dia, um chef perguntou se eu não tinha sardinhas peruanas. Ali, vi uma possibilidade de começar a valorizar outros produtos, que antes recebiam pouca atenção".
E por falar em peixe, o chef australiano Josh Niland, mais do que falar de espécies, defendeu a tendência do "nose to tail" - do nariz ao rabo - em tradução literal. "A ideia é incentivar o aproveitamento máximo do peixe, experimentando técnicas que possam servir para todas as partes dele. Como chef, é importante que use meu conhecimento para educar as novas gerações sobre as responsabilidades que envolvem o ato de cozinhar".
Pesca artesanal e aproveitamento integral do peixe fazem parte da transformação pela gastronomia. Foto: Pixabay
Pesca artesanal e aproveitamento integral do peixe fazem parte da transformação pela gastronomia. Foto: Pixabay

Educação e transformação pela gastronomia

O chef espanhol Juan Llorca trouxe ao debate o trabalho realizado no projeto #PorUnaEscuelaBienNutrida, que defende a transformação na gastronomia por meio da educação infantil, com a introdução de ingredientes vindos diretamente dos produtores, sem processamento. Para que isso seja possível, a estratégia passa pela valorização dos cozinheiros responsáveis pela alimentação dos pequenos nas escolas. "Com mais conhecimento de técnicas de preparo, é possível ajudá-los a extravasar a criatividade". A ideia é, aos poucos, eliminar alimentos processados e introduzir mais vegetais, legumes e frutas nos preparos servido à criançada, que está com o paladar em processo de transformação.
Um trabalho muito similar é realizado pela chef inglesa Nicole Pisani à frente do projeto Chefs in Schools, desenvolvido em Londres. A missão do projeto é sensibilizar tanto as escolas que ainda não trabalham com uma alimentação mais sustentável, como chefs que buscam novos desafios na carreira e aceitem o desafio de ajudar na transformação da merenda das escolas inglesas. "É gratificante fazer algo que busca mudar a relação das pessoas com a comida desde cedo", diz Nicole.
Para o chef novaiorquino Matt Joswiak, CEO do Rethink Food, também é necessário reforçar o processo educativo em adultos e reitera a necessidade de se repensar as relações humanas com a comida, mas com foco, também no consumidor final, que está na ponta da cadeia. "É fundamental pensar no que as pessoas querem, o que elas buscam comer e qual a relação delas com o alimento. A partir daí, é possível promover reflexões e transformações de impacto", finaliza.