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“Aprendemos que somos vulneráveis e que precisamos ser humildes”, diz um dos chefs mais influentes do mundo
Se por um lado a crise provocada pelo novo coronavírus afetou em cheio o setor da gastronomia em escala mundial, por outro a parada obrigatória do setor trouxe tempo para refletir sobre o futuro da gastronomia e qual será a relação das pessoas com a comida daqui para frente.
Estes foram alguns dos assuntos abordados pelos maiores nomes da gastronomia mundial no primeiro dia do simpósio Sangue na Guelra, com o tema o The Power of Food (o poder da comida). Organizado pela Amuse Bouche, empresa portuguesa de comunicação com foco na gastronomia, o objetivo do evento, que termina nesta terça, 5, é promover o debate entre chefs e empresários do setor, com foco nas estratégias para dinamizar as operações. As lives são transmitidas ao vivo pelo Facebook e Youtube.
Para o premiado chef Joan Roca, do restaurante El Celler de la Roca, de Girona (nordeste da Espanha), a maior lição que a pandemia está trazendo é a consciência da fragilidade. "Aprendemos que somos vulneráveis e que precisamos ser humildes para pensar os próximos passos com planejamento e cuidado", diz. Ele lembra que, em toda a história, sempre houve crises, o que exigiu adaptações.
Nesta, em especial, estará em jogo uma das principais qualidades do Celler, a hospitalidade. "Abraçar, saudar, é um dos direitos dos clientes, mas vamos ter que mudar essas relações, com distanciamento, uso de máscaras e tudo o que for necessário", diz o chef. A previsão de reabertura do salão do El Celler é para meados de junho a início de julho, enquanto que outros empreendimentos do grupo, como a sorveteria e a fábrica de chocolate, reabrem este mês. "Já estamos trabalhando no novo menu para o verão. Depois do susto, voltamos a pensar coisas novas".
A gastronomia é mais forte do que os protocolos. (Joan Roca - El Celler de Can Roca)
Já o chef Andoni Aduriz, também um dos mais influentes da atualidade, afirma que, fatalmente, boa parte dos restaurantes de pequeno porte na Espanha tendem a fechar até o final da pandemia. "Depois da crise social e sanitária, está vindo a crise econômica", lamenta ele, que comanda o espanhol Mugaritz, um dos sete melhores do mundo.
No entanto, ele destaca que é nos momentos de dificuldades que a criatividade se fortalece. "Quem é criativo segue sendo criativo e aproveita as oportunidades que surgem, apesar da situação econômica desastrosa".
Quem trabalha com gastronomia ou muda com a criatividade, ou desaparece. (Andoni Aduriz, Mugaritz)
Anduriz cita, por exemplo, o uso mais efetivo da tecnologia na Espanha para aproximar pequenos restaurantes de consumidores locais. "Antes o uso de plataformas era reservado aos grandes. Hoje a tecnologia está sendo usada para a aproximação", diz.
Experimentações
O casal de chefs peruanosVirgilio Martinez (Central de Lima) e Pía León (Kjoele) reconhece as grandes dificuldades, especialmente financeiras, que o coronavírus traz. Mas também reforça a importância de aproveitar o tempo para refletir. "É tempo de parar para pensar e colocar em prática ideias que ficaram paradas em meio à correria", diz Pía.
Uma das novidades que a quarentena trouxe ao Central foi a intensificação do delivery, que a partir da semana que vem passa a funcionar com uma proposta diferente: é o consumidor que vai montar o próprio prato em casa.
Para o futuro, mais do que nunca, a dupla acredita na importância da educação como agente transformador nos modos de produção e consumo, ensinando os jovens a comer melhor e a pensar sobre o que come. "O objetivo da gastronomia não deve ser focar apenas no dinheiro. É ir além, usar a criatividade para nos sentirmos úteis", finaliza Virgilio.
Nesta terça-feira (5), o streaming prossegue, a partir das 8h (horário de Brasília), com nomes como Alex Atala, Henrique Sá Pessoa, Ana RoS, Gaggan Anand e Dan Barber.