Se há algo em que os limenhos são especialistas é em fazer barulho. Lima, a capital do Peru, é agitada. Por vezes, caótica. As ruas são uma sinfonia de sons, das cumbias – ritmo musical que lembra a salsa e embala nove em cada dez bares ou comércios de rua – à orquestra de buzinas. E como há buzinas. O trânsito parece prestes a entrar em colapso. É uma síntese confusa e charmosa das grandes cidades latinas.

De tão barulhenta, Lima conseguiu ser ouvida mundo afora. E não pelo seu caos, mas, sim, por um som muito mais sensível: o das panelas. Há uma década a cidade assumiu o papel de nova Meca da gastronomia. Graças a uma cozinha tão encantadora quanto as paisagens de Macchu Picchu e que reflete o modo de viver do peruano: é simples, rústica e calcada no que a mãe natureza tem a oferecer. E em um país de terroir rico e vasto, o foco é no ingrediente, seja ele da Amazônia, do litoral ou das montanhas.

Foram os chefs visionários, sobretudo Gastón Acurio, que colocaram as terras peruanas na rota dos bons de garfo, refinando essa cozinha – “pero no mucho” para não perder a essência – para um público europeu e exigente. Hoje, casas como Astrid & Gastón (de Acurio), Malabar e Central encorpam as listas de melhores do mundo. Mas, além delas, há muito a se descobrir pelas centenárias ruas da cidade. Em comum, os diversos endereços gastronômicos da metrópole têm orgulho em servir seus pratos locais, que dominam absolutamente os cardápios.

Exatamente no centro de Lima ao lado do Palácio do Governo, residência oficial do presidente Ollanta Humala, o Bar Cordano é o mais tradicional da cidade. A casa aberta em 1905 conserva um ar decadente do início do século passado. É simples e charmosa. Dizem que o próprio chefe de estado faz refeições eventuais por ali. Se ele atravessa a rua atrás de um Jamón del País (sanduíche de pernil típico do Peru, servido frio) é impossível precisar. Mas, se o fizer, certamente estará experimentando um dos mais saborosos de Lima.

No Cordano, a comida do dia a dia do peruano, chamada de criolla, dá as caras. Há as causas limeñas (purê de batata com recheio de carne), arroz de galinha, arroz de mariscos. Tudo pode ser acompanhado de uma gelada chicha morada (suco feito de milho roxo).

A algumas quadras dali, apreciadores podem se deliciar com o fresquíssimo ceviche de polvo do De Cesar. O prato é uma das mais saborosas versões do clássico definitivo da cozinha peruana, servido nesta casa de pouco mais de 20 lugares. Os pedaços carnudos de polvo combinam perfeitamente com o molho cítrico chamado de leite de tigre (feito de limão, coentro e especiarias) e com o milho, acompanhamento obrigatório.

Para um lanche rápido, vale a pena uma passada na sanduicheria criolla La Lucha, com duas unidades, uma no Shopping Larcomar e outra na área boêmia de Miraflores. O chancho al cilindro é o carro-chefe. São pedaços de carne suína assados em uma churrasqueira no formato de um vaso gigante. Eles ficam pendurados e, com isso, a gordura escorre e a carne fica crocante, incrivelmente sem ressecar. Há uma versão feita com frango.

No charmoso Café Café, também em Miraflores, o happy hour é a grande pedida. Além de degustar um bom pisco sour, a mais emblemática bebida do país – feita de destilado de uva (pisco), xarope de açúcar, limão e clara de ovo –, pode-se optar por uma certa variedade de cervejas locais. A Cusqueña é a mais pedida. Vale conferir também os petiscos (piqueos) como os tequeños, que lembram nosso pastel, porém com um formato de canudo. Os recheios são variados.

Embora Gastón Acurio tenha como a sua obra-prima o Astrid & Gastón, restaurante em que ele desfila sua cozinha autoral, o mais famoso e respeitado chef peruano também é um astuto empresário, com quase uma dezena de casas de diversas vertentes espalhadas pela cidade.

Vale conferir de perto principalmente três delas. O Tanta é uma rede com restaurantes em vários bairros de Lima e mostra uma versão de Acurio voltada aos clássicos da cozinha peruana. É impossível não se encantar por pratos co-
mo o lomo saltado (pedaços de filé salteados em panela wok com tomate, cebola, pimentões e servido com arroz) ou pelo ceviche clássico, feito com o peixe do dia – ambos os pratos estão para o peruano como o arroz com feijão está para o brasileiro. A unidade do shopping Larcomar tem uma bela vista para o oceano.

No La Panchita, em Miraflores, Acurio criou um ambiente que lembra nossas churrascarias premium e tem as carnes como estrela do cardápio. A pancetta de cerdo con papas y maiz salteado (barriga de leitão com batatas e milho salteado) é impecável. E aqui vale uma dica: os pratos são bastante robustos, portanto, pegue leve na entrada.

Mas o melhor é, sem dúvida, o La Mar, em San Isidro. A conhecida cevicheria de Acurio – que tem inclusive uma filial em São Paulo – tem uma aura própria que evoca o frescor dos frutos do mar, seus carros-chefes. Um imenso balcão à frente da cozinha exibe os peixes do dia, devidamente refrescados com gelo. O cliente pode avaliá-los e escolher o seu prato com base nas boas opções. O trio de ceviches (em porções degustação, de peixe, polvo e atum) é obrigatório para visitantes de primeira viagem.

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Malabar. Av Camino Real, 110, San Isidro.

Astrid y Gastón. Av. Paz Soldán 290, San Isidro Central. Jirón Santa Isabel, 376, Miraflores

Bar Cordano. Esquina das ruas Carabaya e Ancash, s/nº, Centro.

Di Cesar. Jirón Ancash, 300, Centro

Café Café. Shopping Larcomar (Malecón de la Reserva, 610, Miraflores) e Jirón Martir Olaya, 250, Miraflores.

La Lucha Sanguchería Criolla. Vários endereços – www.lalucha.com.pe

Tanta. Vários endereços – www.tantaperu.com.

La Panchita. Calle 2 de Mayo, 298, Miraflores

La Mar. Av. La Mar, 770, San Isidro