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Dóla, dono do Bar dos Passarinhos, morre aos 70 anos
Que “um Passarinho bateu asas e voou”? Se eu abrisse estas memórias com um clichê como esse, certamente o Marco Dolabella, 70 anos, acharia pobre. É que ele não apreciava clichês, espalhava cultura e informação por onde passasse. Talvez seja por isso que tanta gente importante frequentava o Bar dos Passarinhos, sua casa. Por isso, e por causa das receitas “irrepreensíveis” – como registrou o jornalista e muito amigo do “Dóla”, Luiz Augusto Xavier.

O primeiro endereço, no Bigorrilho, do outro lado da rua da Igreja dos Passarinhos no início da década passada. Eis a razão do nome do pequeno templo que mal comportava 40 pessoas. A disputar espaço: prefeitos, governadores, jornalistas estrelados, profissionais de alto escalão de empresas, todo mundo ia até o Bar dos Passarinhos para ser recebido pelo próprio.
Atrás do balcão da minúscula cozinha aberta, ele era o protagonista de noites memoráveis. Grande anfitrião, era bom de conversa, mas melhor ainda para ouvir. Sábio Dolabella, conhecia muito sobre muita coisa e bastante gente. De temperamento tranquilo, questionado ou confrontado, simplesmente sorria. Ele tinha muito mais o que fazer. Preparar a lula ao shimeji, por exemplo. O prato recebeu muitos prêmios, tornou-se um clássico entre os clássicos do Bar dos Passarinhos.

Fora do Bar, também cozinhava. Por anos foi confrade na tradicional Confraria do Armazém. Dentro do bar inaugurado no início dos anos 2000, aos domingos recebia o Padre Figura, que saía depois de celebrar uma das missas mais disputadas da cidade e atravessava a rua. O Padre Figura gostava de passar horas proseando com o Dolabella e com a Dona Aparecida – companheira de vida – enquanto ela literalmente tricotava.
Em meados de 2013, Marco Dolabella baixou as portas na Princesa Izabel. Foi reabrir em 2016, em um endereço quase secreto na Ermelino de Leão. O novo estabelecimento fica no jardim interno da Latam Travel, no imóvel do amigo que se tornou sócio, Alcimar Ribeiro. Logo os amigos descobriram o “esconderijo” e, felizes, voltaram a encher as mesas em busca da lula ao shimeji, dos camarões crocantes, da pescada amarela, dos grelhados e dos salteados.
De dia, Marco frequentava os cafés da redondeza, revirava o centro da cidade. Passava as tardes no restaurante com nome de bar recebendo os fornecedores, organizando o jantar, lendo, assistindo todos os noticiários. Tinha sede de informação, sempre foi politizado. À noite ia para trás do pequeno balcão. Novamente a cozinha aberta. Novamente os amigos chegando, querendo estar em torno dele.
Hoje o Marco Dolabella partiu. Deixa a companheira Maria Aparecida Alves, a filha Andrea Alves Dolabella, o Bar dos Passarinhos, muitos amigos e muita saudade. Deixa a gastronomia um pouquinho menos boêmia, um pouco menos charmosa. O criador do Bar dos Passarinhos foi-se embora como costumava chegar, sem grandes alardes, quase sem fazer barulho. E eu, boicotado na minha inspiração, só consigo pensar no clichê: o Dolabella bateu asas e voou. O motivo da morte não foi revelado.
O velório de Marco Antônio Dolabella é realizado na Unilutos, Rua Desembargador Benvindo Valente, 348, Capela Eixo Sul. Das 19h30 até meia-noite.
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