Restaurantes
Restaurante tem 70 mil bilhetes pendurados no teto e nas paredes
Se tem um restaurante que pode ser considerado patrimônio catarinense é o Bar do Arante. Ali o sucesso de mais de seis décadas está literalmente estampado nas paredes. Na última contagem, feita há dez anos, havia mais de 70 mil bilhetinhos. Eles cobrem o teto e as paredes e transformam o local num ponto turístico imperdível em Florianópolis.

Os recados escritos em pedacinhos de papel ou improvisados em guardanapos nos mais variados idiomas, do espanhol dos vizinhos hermanos ao alfabeto árabe, elogiam frequentemente a beleza do lugar e, claro, a comida típica. Bom humor não falta. Lê-se, por exemplo: A comida é muito boa. É verdade esse ‘bilete’ e Ainda bem que moro longe daqui, se não ficaria pobre e gorda! E viva a boa comida!
Começou quando um visitante embalado pelo vai e vem do bar, a pinga oferecida de graça e a beleza da praia rabiscou qualquer coisa num pedacinho de papel e o Arante colou na parede. E ainda brincou que todo mundo vira poeta com essas combinações (pinga, sol e mar).
Localizado à beira mar, bem na entrada do Pântano do Sul, uma das praias mais bonitas de Florianópolis, o Arante começou como uma vendinha. Seu Arante Monteiro e a esposa Osmarina Maria vendiam verduras, frutas, ovos, peixes, bolachas, fumo de corda e pratos de comida para os pescadores. Tudo na caderneta.
A Bodega do Arante ficava na “Rua de Cima”, mas logo nos primeiros anos foi para beira da praia com o nome de Pesqueiro Velho – que aliás, não pegou. Na época, o Pântano não era quase visitado e o ônibus aparecia somente em dois horários. Saia do Centro às 6h e voltava às 17h. Mas quem perdia noção das horas diante da beleza estonteante, não se preocupava. A fama do Seu Arante já percorria a cidade. “Ele não deixava ninguém dormir na rua, sempre arrumava um quartinho”, conta seu filho, Amarildo Monteiro, 56 anos, que ao lado do irmão Arantinho, administra o restaurante.
Seu Arante era uma figura muito querida na cidade, morreu em 2012 e foi homenageado por centenas de pessoas. Querida também era sua irmã Hilda, que morreu no ano passado aos 104 anos, e era a benzedeira mais antiga de Santa Catarina. Curava cobreiro, mal olhado, calor de figo e zipra. Manezinha raiz ela apreciava muito um peixinho frito com pirão de mandioca feito em água de fervura, um clássico.
No cardápio do Arante é encontrada a boa e simples comida caseira de pescador. Ali não tem peixe congelado. Tudo é fresco e pescado na baía do Pântano. “Nós oferecemos para os fregueses o peixe do dia. Em junho ele vai comer tainha, em julho, anchova, no começo do verão a pescada e a tainhota. Em janeiro, espadas e linguado. Em fevereiro lulas e camarões, os três tipos, o pintado, o legítimo e o perereca”, conta Amarildo.

Um dos pescadores que abastece o Arante é Armando, irmão de Amarildo e Arantinho, que seguiu a mesma profissão do avô. Das janelas com vista para o mar também é possível ver dezenas de barquinhos de madeira coloridos. Eles estão pescando os peixes de pedra, sorgo, robalo, garoupa e os mariscos.
Para aproveitar o menu tradicional a dica é pedir de entrada um pastelzinho de berbigão ou de camarão R$ 10 cada, que veem bem recheados, ou a porção de camarão à milanesa muito sequinha e saborosa, R$ 82.
Dos pratos típicos, veem com esse nome no cardápio, destaque para as seis postas de peixe do dia, acompanhadas de arroz, salada, feijão e pirão, R$ 89 – serve até três pessoas. E o camarão, que era receita da dona Osmarina, com molho de tomate e queijo gratinado. É para duas pessoas, mas também serve três tranquilamente, R$ 159. Para quem quer se esbaldar vale provar o buffet livre de frutos do mar, R$ 69 por pessoa.
Cortesia da casa é a cachacinha, produzida em alambiques da Ilha. Aliás, graças a ela que o Arante virou o bar dos bilhetinhos. “Na década de 70, o Pântano virou reduto de mochileiros, estudantes que vinham principalmente de São Paulo e do Rio Grande do Sul, naquela onda hippie, e acampavam por aqui. A pinga, o mar, o vai e vem dos barquinhos, as gaivotas, quando víamos eles viravam poetas”, ri Amarildo.
Foi um poeta errante que colou o primeiro recado no Arante, desde então vieram milhares para agradecer a hospitalidade e a comida generosa, boa pro corpo e pro espírito. E apesar do lugar ter sido tomado por eles, é só procurar com calma que sempre cabe mais um – como o coração de Arante e Osmarina.