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De remédio a drink: estudiosos afirmam que caipirinha chegou aos 100 anos
Suco de limão, alho e mel. A receita original da caipirinha pouco se assemelha com a o que consumimos hoje em dia acompanhando a feijoada de sábado ou qualquer outro momento em uma mesa de bar. Mas, em meados do século 20, mais precisamente em 1918, era essa mistura que os doentes da gripe espanhola tomavam como remédio em cidades do interior de São Paulo. E colocavam uma dose de cachaça para potencializar o efeito e facilitar a absorção do medicamento.
Esta talvez seja a história de como surgiu o drink mais típico do Brasil, mas fica apenas na ‘hipótese’ pela falta de registros oficiais. Em um país de dimensões continentais e múltiplas culturas dentro de um território só, definir quando e onde surgiu a caipirinha é uma tarefa difícil até mesmo para os estudiosos de plantão.
Que o diga Carlos Eduardo Cabral de Lima, diretor executivo do Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac). Ele explica que existem várias hipóteses para o surgimento do nosso coquetel, mas que tem outra ainda anterior aos doentes da gripe espanhola. “Uma das vertentes da história da caipirinha é defendida pelos moradores de Paraty, no estado do Rio de Janeiro, em que os marinheiros e navegadores tomavam uma dose de cachaça misturada com suco de limão para evitar o escorbuto [doença provocada pela grave falta de vitamina C] em alto-mar em meados de 1856”, conta.
Piracicaba, o berço da caipirinha
Já em 1918, o remédio desenvolvido pelos paratienses ganhou o mel e o alho na cidade de Piracicaba, no interior de São Paulo. Foi lá que a caipirinha ganhou sua hipótese mais aceita por especialistas e historiadores. Segundo Carlos Eduardo, os moradores de lá continuaram a tomar o tal do medicamento mesmo depois que a doença foi erradicada. “Eles foram fazendo algumas modificações na receita, colocando o açúcar no lugar do mel, tiraram o alho, que não devia dar um gosto muito agradável, e adicionaram o gelo”, explica ele ao dar a receita original.
Aos poucos, a nova receita foi ganhando a preferência nos bares e rodas de amigos e chegou até a Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, o grande marco da brasilidade. Lá, os intelectuais pregaram a valorização da cultura do país, e a pintora Tarsila do Amaral elegeu a caipirinha como a bebida oficial do movimento. “Dizem que o apelido dela era caipirinha, mas ninguém sabe dizer ao certo de onde surgiu isso”, explica o diretor executivo do Ibrac. Uma possibilidade é de que seja por causa da origem de Tarsila, nascida na cidade de Capivari, no interior paulista.
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“Caipirinha de verdade leva apenas cachaça”
Assim como o remédio para a gripe espanhola foi sendo modificado até virar a nossa caipirinha, a versão de 1922 também foi ganhando novos preparos ao longo dos anos. O consultor gastronômico Flávio Guersola, da Guersola Consultoria, de São Paulo, diz que existe apenas uma receita original, com limão, açúcar, gelo e cachaça, mas que a adaptação para outros sabores não é de tudo condenável. “Atualmente temos uma gourmetização de vários produtos que, há tempos atrás, eram mais simples, e isso acabou elevando o patamar da caipirinha que muito me agrada”, explica.
A mesma opinião é compartilhada por Carlos Eduardo Cabral de Lima, que considera que a evolução da caipirinha não é errada. “Não tem problema fazer com morango, uva, seja lá o que for, o complicado e incorreto é não utilizar a cachaça. Caipirinha de verdade leva apenas cachaça”.
Já o presidente da Confraria Paulista da Cachaça, Alexandre Bertin, polemiza dizendo que os bartenders usam a criatividade como forma de personalização do drinque. “No entanto, com outras frutas que não limão, o coquetel não poderia ser chamado de caipirinha, teoricamente”, explica.
Polêmica ou não, para muita gente a ‘caipirinha raiz’ não é das mais agradáveis, seja por causa do sabor forte da cachaça ou do azedinho do limão. O empresário Juliano Todeschini, do bar Lotus Sunset, de Curitiba, diz que há muito tempo deixou de fazer a receita original. “Há uns dez anos eu fazia festas de aniversário, e as pessoas vinham me pedir para fazer caipirinhas que fossem além do limão. Então comecei a oferecer de melancia e de jabuticaba, e fazia muito sucesso”, conta.
Quando ele abriu o próprio bar, há dois anos, já começou preparando caipirinhas mais diferentes, nada que se assemelha à receita original. Mas também nada que seja apenas com frutas, açúcar e algum destilado. “A gente flerta bastante com ingredientes que possuem alguma utilidade a mais do que apenas usar em coquetéis, alguns tem até fins medicinais”, conta Juliano Todeschini ao explicar a caipirinha Sauna. A bebida foi uma criação dele com um antigo bartender do Lotus Sunset, após várias idas ao Mercado Municipal em busca de ervas aromáticas que proporcionassem um frescor ao drink.
Surgiu então a caipirinha que tem, junto da receita original, o capim-santo, a citronela e a redução de maracujá ou de jabuticaba. Ele serve com cachaça (tal qual a original), mas também com destilados como vodca e saquê.
Seja apenas com limão ou frutas diversas, as marcas caipirinha e cachaça só podem ser usadas para produtos feitos no Brasil graças a um decreto que protege a autenticidade do drink, considerado um patrimônio brasileiro. A lei 4.851/2003 garante a propriedade intelectual sobre as marcas caipirinha e cachaça na legislação internacional.
A original
Veja como é a receita original da caipirinha:
Ingredientes:
– 1 limão
– 6 cubos de gelo
– 2 colheres de sopa de açúcar
– 70ml de cachaça
– 1 limão
– 6 cubos de gelo
– 2 colheres de sopa de açúcar
– 70ml de cachaça
Modo de preparo:
Comece cortando o limão ao meio e retire a parte branca dele (o miolo), pois ele causa amargor à bebida. Depois, coloque o açúcar e macere com um pilão. Adicione o gelo até a borda do copo e complete com a cachaça. Mexa tudo com uma colher de bar (com um cabo longo) até dissolver o açúcar, e sirva. Você também pode usar uma coqueteleira para mexer toda a mistura. Dica dos especialistas ouvidos pela reportagem: não use gelo picado, pois ele derrete rapidamente e altera o sabor da Caipirinha.
Comece cortando o limão ao meio e retire a parte branca dele (o miolo), pois ele causa amargor à bebida. Depois, coloque o açúcar e macere com um pilão. Adicione o gelo até a borda do copo e complete com a cachaça. Mexa tudo com uma colher de bar (com um cabo longo) até dissolver o açúcar, e sirva. Você também pode usar uma coqueteleira para mexer toda a mistura. Dica dos especialistas ouvidos pela reportagem: não use gelo picado, pois ele derrete rapidamente e altera o sabor da Caipirinha.