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“Não vale mais a pena abrir grandes restaurantes”, diz dono de 18 casas em Curitiba e SP
Remando contra a maré da crise econômica alardeada por tantos restauranteurs brasileiros, o empresário curitibano Raphael Zanette beirou o fechamento de quatro restaurantes em 2014, se reinventou e hoje comanda 18 casas em Curitiba e São Paulo. Apesar de ter dado a volta por cima em anos de queda no número de clientes, o empresário reafirma que não há uma receita para o sucesso.
O ex-corretor de seguros que decidiu encarar o mercado de alimentação diz que o segredo para crescer é centralizar funções e se reinventar – de preferência todos os dias. Zanette diz ainda que hoje não vale mais a pena abrir grandes restaurantes e muito menos se apegar ao que tem. “Não deu certo, pare e mude”, exclama.

Raphael Zanette conversou com o Bom Gourmet sobre a trajetória de dono de uma franquia de loja de vinhos a dono de 18 estabelecimentos em Curitiba e São Paulo:
Em um país em que um negócio de alimentação geralmente não dura mais do que dois anos segundo o Sebrae e a Abrasel, você conseguiu não só manter as suas operações abertas como ampliar a atuação até mesmo para fora de Curitiba. Como explica esse caminho?
Eu concordo com esses colegas que falam das dificuldades enfrentadas nesta crise, o mercado nos últimos anos está muito difícil, isso é fato. Só que ao mesmo tempo que está difícil enfrentar o mercado, a crise nos obrigou a fazer uma dura lição de casa de 2014 para 2015, melhorando a gestão, enxugando a equipe e identificando custos que são pesados se você tiver apenas uma operação. No meu caso, nós centralizamos algumas das funções do C La Vie, Terra Madre e Olivença em Curitiba, e do Terra Madre Osteria, de São Paulo, reunindo em um só lugar questões como gestão, compras, recursos humanos, entre outras. Assim a gente consegue diluir custos e contratar pessoas mais bem qualificadas.
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Mas não basta apenas ter uma boa gestão sem clientes consumindo, ainda mais com a quantidade de restaurantes abertos e disputando espaço. E sabemos que as pessoas gostam de novidades, de ter um motivo para voltar. Como se sobressair no meio de tantos?
O cenário de crise nos obrigou a sermos mais criativos nestes anos todos. Quando eu abri o Terra Madre em 2005, devo ter demorado uns dois anos para mudar o cardápio, simplesmente porque não precisava. Só tinha que me preocupar em preparar uma comida bem feita, com um bom serviço e manter um padrão. Hoje em dia você tem que pensar em novas ações, campanhas, festivais e menus harmonizados todo mês pensando, ter assunto e despertar a curiosidade para o cliente voltar sempre. Nesse ramo de restaurantes você pode ter 300 opções na cidade, mas se você perguntar para as pessoas elas vão lembrar de uns quatro ou cinco que frequentam mais, sempre os mesmos. Então se você já é um desses, tem que manter o interesse dele. E se não é um dos quatro ou cinco e quer se tornar um deles, precisa ter algo de diferente dos outros, um atrativo que faça as pessoas irem uma primeira vez e voltarem ao restaurante.
Então o segredo de tudo é centralizar funções e criar novidades, mas isso é suficiente para crescer tanto como você conseguiu? De quatro restaurantes e uma importadora de vinhos você passou para 18 operações em cinco anos.
A gente passou por esse processo de reformulação de 2014 para 2016, quando vimos que dava para voltar a querer crescer. Aí surgiu a ideia do Vino Bar, com uma estrutura muito mais enxuta com um custo menor de implantação. Foi ele que oxigenou todo o grupo e nos fez olhar para um formato que está dando certo. No lugar de grandes operações, começamos a implantar formatos menores e mais acessíveis. O Vino Bar, em especial, nos abriu os olhos para isso. Já são cinco operações abertas (3 em Curitiba e 2 em São Paulo) e mais duas previstas – em Florianópolis (SC) e Recife (PE). Elas custam 1/5 de um restaurante normal. Hoje em dia não vale mais a pena abrir grandes casas, a não ser que se tenha um propósito viável financeiramente ou faça parte de uma rede de restaurantes. O desafio hoje em dia é a rentabilidade, e já estamos conscientes de que a recuperação da economia não virá mais neste ano.

Mas você abriu os restaurantes Extásia em São Paulo e em Curitiba no ano passado, que são grandes operações, e se tornou recentemente sócio do La Varenne, em um grande shopping da capital paranaense. Não vai contra essa afirmação?
Estes são dois casos bem distintos. Tanto o Extásia como os outros restaurantes que já estavam abertos, eu peguei lugares prontos e remodelei, dando uma ‘maquiada’ e levando em conta o que gostaria de fazer e a localização deles. Em São Paulo, por exemplo, são casas que atendem mais aos moradores do bairro, com uma oferta menor de restaurantes. Já o Extásia de Curitiba foi aberto onde antes funcionava o Olivença (no bairro do Batel), que não atendia mais a proposta que tinha sido pensado – um bar de tapas informal, mas que foi considerado por muitos anos pelos clientes como um restaurante para você chegar e ter um jantar completo. Já o La Varenne veio porque eu sempre quis ter uma operação em um shopping center, e surgiu essa oportunidade com os donos do Pátio Batel.
E para quem está entrando agora no mercado ou que já tem um restaurante, qual a receita para se manter em pé?
Primeiro precisa ficar ligado no que está acontecendo, na tendência do mercado. Depois o tamanho da operação, não vale a pena abrir um restaurante do zero. Também tem que racionalizar a gestão e ser criativo para atrair os clientes. E, acima de tudo, ter menos sentimentos pelo negócio. Não deu certo, pare e mude, não é um fracasso pessoal. É melhor admitir um erro antes que seja tarde. Eu mesmo quase fui vítima disso com o primeiro Vino, quando ainda era uma adega anexa ao C La Vie da Rua Comendador Araújo, em Curitiba. Eu fiquei lá de 2002 a 2013, mas devia ter parado uns três anos antes. O prejuízo que você vai acumulando pode custar caro e ser muito difícil de reverter depois.
Grupo Vino!
O grupo comandado por Raphael Zanette é dividido em duas áreas de atuação: a importadora Magnum corresponde a 60% do faturamento e os restaurantes a 40%, segundo ele. Além dos estabelecimentos citados pelo empresário na entrevista, também fazem parte da sociedade a Mercadoteca de Curitiba (espécie de centro gastronômico com diferentes operações); os bares Glasso Beer & Drinks (Mercadoteca), Vino! (Mercadoteca, Shopping Hauer e Mercado Sal, em Curitiba, e Pinheiros e Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo) e Bacobuque Winebar (São Paulo); o Restaurante Bacobuque (São Paulo); e a cervejaria Way Beer (Curitiba).