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“União das cozinhas amazônica e mineira representaria o Brasil”, diz o chef-mago Ofir
Depois de ter participado da edição do Festival Fartura Belém, no mês de janeiro, o chef Ofir Oliveira, 68, desembarcou em Minas Gerais para o Festival de Cultura e Gastronomia Tiradentes para contar histórias e mostrar sua cozinha de ingredientes para o público no início do mês. Os 50 lugares estavam todos preenchidos antes mesmo de a aula começar.

O chef preparou uma de suas emblemáticas receitas, oferecida no restaurante Sabor Selvagem, localizado em Belém: o peixe à capitoa. A pedida consiste em um filhote assado acompanhado do molho de arubé, um acompanhamento criado antes mesmo do descobrimento do Brasil e que tem como base o tucupi. “Por sorte da vida, uma amiga que havia viajado para o Amazonas me contou sobre o arubé. Então, decidi resgatá-lo. Fui pesquisar, acabei encontrando citações, passei a falar dele como uma questão”, relembrou.
O chef explica que o peixe à capitoa é uma homenagem à entidade de São Benedito, em Bragança do Pará, uma tradição afro-amazônica. “O arubé é à base do tucupi, suco da mandioca, engrossado com a própria mandioca. O peixe é assado e recebe um refogado de camarão fresco com o molho”, explicou sobre o prato, apresentado na Pousada Escola Senac.

Ofir, que começou a cozinhar por influência da mãe, aproveitou para contar também que em 1989, quando tinha 39 anos, foi à capital francesa para trabalhar em um restaurante brasileiro e se tornou um dos pioneiros em levar um pouco desses sabores a Paris. “Fui o primeiro a ser reconhecido em Paris como introdutor da culinária da Amazônia na Europa. Quando ainda ninguém falava nisso, e eu me tornei o melhor chef estrangeiro, falando de cultura. Para jantar comigo em Paris, eram 30 dias de antecedência”, relembra, cheio de si.
Confira a entrevista com o chef Ofir Oliveira
Como foi o seu interesse, ainda na infância, pela cozinha por meio da sua mãe, até se tornar um dos maiores representantes da cozinha amazônica no mundo?
Nasci literalmente dentro da floresta. Minha mãe é filha de português com índio, meu pai, filho de cearenses. Tive a sorte de ter em casa as duas melhores cozinhas do Brasil, por parte das minhas avós maternas. Minha mãe era uma exímia cozinheira, foi professora de cozinha em Bragança, isso já nos anos 60. Comecei a cozinhar arubé aos 6 anos.
Nasci literalmente dentro da floresta. Minha mãe é filha de português com índio, meu pai, filho de cearenses. Tive a sorte de ter em casa as duas melhores cozinhas do Brasil, por parte das minhas avós maternas. Minha mãe era uma exímia cozinheira, foi professora de cozinha em Bragança, isso já nos anos 60. Comecei a cozinhar arubé aos 6 anos.
Algumas pessoas te conhecem como chef de cozinha, mas a maioria das pessoas prefere te chamar de “mago”. O que você acha desse título e como você honra o cargo de “mago” na cozinha?
Na Amazônia, não temos apenas sabores, temos o encanto, o sobrenatural. Acreditamos em coisas que ninguém da cidade grande acredita, os seres da floresta, das árvores. Por isso, eu digo que não cozinho: eu encanto, faço feitiços. Sou feiticeiro.
Na Amazônia, não temos apenas sabores, temos o encanto, o sobrenatural. Acreditamos em coisas que ninguém da cidade grande acredita, os seres da floresta, das árvores. Por isso, eu digo que não cozinho: eu encanto, faço feitiços. Sou feiticeiro.

Qual é o diferencial da sua cozinha dentro do Brasil?
O diferencial que sempre me coloquei é vender maniçoba para os franceses. O exotismo é a base do meu negócio, que está na raiz da culinária da Amazônia. Não vendo um prato de comida, vendo um prato de história.
O diferencial que sempre me coloquei é vender maniçoba para os franceses. O exotismo é a base do meu negócio, que está na raiz da culinária da Amazônia. Não vendo um prato de comida, vendo um prato de história.
O que seriam esses sabores e saberes do caboclo amazônico que você frisa a importância de difundir?
Culinária não tem gosto: é cultura. Todas as comidas são boas. Quem não gosta da nossa
comida é porque ainda não conhece. Ela tem cultura milenar como qualquer uma. Mas
algumas têm sabor universal. No nosso caso, ela é universal.
Culinária não tem gosto: é cultura. Todas as comidas são boas. Quem não gosta da nossa
comida é porque ainda não conhece. Ela tem cultura milenar como qualquer uma. Mas
algumas têm sabor universal. No nosso caso, ela é universal.
Quais ingredientes você tem preferido trabalhar ultimamente e que fazem parte constante da sua cozinha?
O fundamento da nossa culinária é a mandioca, ela é a rainha da festa. Ela foi e é o elemento base da nutrição no Brasil. Como referência à Amazônia, os ingredientes que eu gosto são o arubé e o tucupi, o jambu e a maniçoba.
O fundamento da nossa culinária é a mandioca, ela é a rainha da festa. Ela foi e é o elemento base da nutrição no Brasil. Como referência à Amazônia, os ingredientes que eu gosto são o arubé e o tucupi, o jambu e a maniçoba.

Como você enxerga o seu papel em difundir o cenário da gastronomia do Pará para o mundo todo?
O que me proponho é mostrar para o mundo que o Pará tem cultura gastronômica de sobra. Costumo dizer que o choque da cozinha amazônica com a mineira a tornariam uma só, que representaria o Brasil em uma conjunção única.
O que me proponho é mostrar para o mundo que o Pará tem cultura gastronômica de sobra. Costumo dizer que o choque da cozinha amazônica com a mineira a tornariam uma só, que representaria o Brasil em uma conjunção única.
Como você acredita que a nossa gastronomia pode romper fronteiras no mundo?
Na verdade, já temos a técnica. Falta sabermos falar dela. Uma forma de introduzir uma culinária é contar uma história sobre ela. Afinal, culinária não é uma questão de receita, mas de cultura. Cultura é fator preponderante para uma culinária ter sucesso. Não é a comida, é a história que tem nela. Não tem comida ruim, mas falta de conhecimento e de cultura.
Na verdade, já temos a técnica. Falta sabermos falar dela. Uma forma de introduzir uma culinária é contar uma história sobre ela. Afinal, culinária não é uma questão de receita, mas de cultura. Cultura é fator preponderante para uma culinária ter sucesso. Não é a comida, é a história que tem nela. Não tem comida ruim, mas falta de conhecimento e de cultura.
O senhor já esteve com o Anthony Bourdain, que faleceu recentemente. Como foi esse encontro, em 2013?
Foi o suprassumo do reconhecimento de um trabalho real. Para minha surpresa, ele bateu na minha porta, antes de qualquer um – não foi de graça, ele pagou para gravar um programa comigo. Anthony Bourdain era uma pessoa muito espirituosa. Quando fui servir a sopa caribé, eu disse que era afrodisíaco. Ele me respondeu dizendo que tudo na Amazônia era afrodisíaco.
Foi o suprassumo do reconhecimento de um trabalho real. Para minha surpresa, ele bateu na minha porta, antes de qualquer um – não foi de graça, ele pagou para gravar um programa comigo. Anthony Bourdain era uma pessoa muito espirituosa. Quando fui servir a sopa caribé, eu disse que era afrodisíaco. Ele me respondeu dizendo que tudo na Amazônia era afrodisíaco.
Quais os seus próximos projetos?
Vou realizar o evento “Amazônia: Novos Portugais”, em 15 de dezembro, na vila de Porto Salvo, no município de Vigia (PA), local onde aportaram os primeiros pés de café no Brasil. É um projeto macro que busca fazer uma ligação com Portugal, a porta de entrada da Europa para os nossos produtos.
Vou realizar o evento “Amazônia: Novos Portugais”, em 15 de dezembro, na vila de Porto Salvo, no município de Vigia (PA), local onde aportaram os primeiros pés de café no Brasil. É um projeto macro que busca fazer uma ligação com Portugal, a porta de entrada da Europa para os nossos produtos.
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