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Pesquisa mostra teor de álcool elevado em pães de forma. Saiba por que isso acontece
Em alguns pães de forma, pesquisa da Proteste encontrou teor alcoólico superior a 0,5%. Bigstock
Pesquisa da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), divulgada nesta quinta-feira (11), mostra que há presença de álcool em produtos de diversas marcas populares de pães de forma. De acordo com o levantamento, se os pães fossem bebidas, os produtos de cinco marcas seriam considerados alcoólicos, ou seja, com teor de álcool superior a 0,5%.
Existem duas explicações para o problema. Segundo Relatório Técnico e Mercadológico da Proteste, toda fabricação de pães passa por fermentação, quando os açúcares da massa são fermentados e transformados em álcool etílico e gases. A maior parte desse álcool evapora ainda no forno, mas o que o relatório recente revela é que, quando chega ao consumidor, alguns pães ainda registram teores alcoólicos elevados para o tipo de produto que são.
Ainda de acordo com a Proteste, por ser um alimento extremamente perecível, a indústria usa conservantes diluídos em álcool e borrifados no produto antes de embalar, para evitar o mofo e garantir que o pão chegue intacto ao consumidor - a associação informa que 10% da produção de pães no Brasil se perde por causa do mofo. A aplicação exagerada desses produtos eleva consideravelmente o teor de etanol.
“O álcool usado para diluição do conservante [colocado após o pão passar pelo forno] deve ser evaporado até o consumo em si do pão, mas se houver um abuso na quantidade do antimofo ou em sua diluição, isso pode não ocorrer e ocasionar em um pão com um teor de etanol muito elevado”, diz o texto da pesquisa.
O questionamento feito pela Proteste é que, se há álcool no pão, tanto o gerado pelo processo de fermentação quanto o utilizado nos conservantes, é preciso que a população seja informada sobre isso. "Embora alguns estudos da Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA) sugiram que não há malefícios comprovados à saúde com uma dosagem elevada, outros indicam que o propionato de cálcio, quando utilizado em grandes quantidades no pão, pode causar danos ao consumidor", informa o texto do relatório da associação. O propionato de cálcio é o conservante anti-mofo mais comum utilizado pela indústria da panificação. A legislação atual não estabelece uma quantidade máxima para o uso dos conservantes em pães.
“Para grávidas e lactantes, a ingestão recorrente de álcool, mesmo que em baixas doses, pode afetar o aprendizado e ocasionar problemas de memória. A síndrome alcoólica fetal (SAF), ocasionada pela ingestão de álcool, é caracterizada por anormalidades no neurodesenvolvimento do sistema nervoso central, retardo de crescimento e problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade”, diz o texto da pesquisa.
O estudo mostra ainda que, caso os pães fossem medicamentos fitoterápicos, seria necessário haver advertências nas embalagens de oito marcas brasileiras. De acordo com as diretrizes pediátricas europeias, o valor limítrofe de advertência para a presença de álcool em medicamentos fitoterápicos é de 6 miligrama por quilo (mg/kg) de peso corporal para crianças. Considerando uma criança de 12,5 kg, a taxa limite seria de 75 mg.
Entre as marcas que a pesquisa revelou apresentarem teor de álcool superior a 0,5% estão Visconti (teor alcoólico de 3,37%), Bauducco (1,17%), Wickbold 5 Zeros (0,89%), Wickbold Sem Glúten (0,66%), Wick Leve (0,52%), e Panco (0,51%).
O que dizem as empresas
Em nota, a Pandurata Alimentos, responsável pela fabricação dos produtos Bauducco e Visconti, disse que que adota rigorosos padrões de segurança alimentar em todo seu processo produtivo e na cadeia de fornecimento. "A empresa possui a certificação BRCGS (British Retail Consortium Global Standard), reconhecida como referência global em boas práticas na indústria alimentícia, e segue toda a legislação e regulamentações vigentes."
O Grupo Wickbold, proprietário das marcas de mesmo nome e Seven Boys, informa que todas as receitas de produtos e todas as áreas da empresa seguem protocolos de segurança e qualidade com o mais alto controle. Informa ainda que cumpre toda a legislação vigente dentro dos parâmetros impostos pelas normas estabelecidas. E diz que, por não ter sido notificada sobre o estudo da Proteste, não é possível se manifestar sobre ele. Mas que prestará esclarecimentos necessários após ter acesso ao levatamento e à metodologia empregada.
A Panco informa que, com mais de 70 anos de presença no mercado brasileiro, "sempre teve sua atuação pautada pela conduta ética e compromisso com a qualidade de seus produtos, bem como com a saúde e segurança de todos os seus públicos".
"A companhia atesta a adoção de práticas totalmente alinhadas aos mais rigorosos padrões de mercado e o cumprimento de todas as normas e legislações específicas vigentes para a produção de alimentos."A companhia atesta a adoção de práticas totalmente alinhadas aos mais rigorosos padrões de mercado e o cumprimento de todas as normas e legislações específicas vigentes para a produção de alimentos. Para assegurar esses padrões, a companhia possui rígidos controles de qualidade (internos e envolvendo fornecedores externos), além de estabelecer mecanismos criteriosos de homologação de seus fornecedores de matérias-primas."
A empresa informa ainda que também não foi notificada pela Proteste a respeito do estudo, e que portanto desconhece a metodologia. E esclarece que não utiliza etanol na fabricação do pão, mas que ele pode ser resultado do processo de fermentação, e que "resíduos não intencionais são aceitos pelas normas e legislações vigentes". A nota reforça o compromisso da Panco com a qualidade de seus produtos e que "está empenhada em realizar análises complementares para entender os pontos levantados e avaliar a necessidade de eventuais adaptações em seus processos". E que seus produtos chegam aos pontos de venda em até no máximo 48 horas depois de produzidos, "garantindo a maciez, frescor e sabor que os consumidores merecem".