Mercado e Setor
Apagão nos restaurantes: mesmo com desemprego alto, sobram vagas para trabalhar
O prato servido à mesa, bem montado e saboroso,
é apenas a ponta final de uma estrutura que já começa muito antes do cliente
entrar no restaurante. Ao longo dela, estão auxiliares, cozinheiros, garçons e
todo um pessoal que está difícil de recrutar.
é apenas a ponta final de uma estrutura que já começa muito antes do cliente
entrar no restaurante. Ao longo dela, estão auxiliares, cozinheiros, garçons e
todo um pessoal que está difícil de recrutar.
A dificuldade para contratação e retenção de trabalhadores foi o assunto do primeiro encontro deste ano promovido pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Paraná (Abrasel-PR), na manhã desta quarta (23), em Curitiba.
Durante pouco mais de uma hora, empresários do setor buscaram respostas a perguntas como “porque não consigo contratar mesmo com tantos desempregados no Brasil” ou “porque a minha cozinha tem uma alta rotatividade”.
Muito disso é respondido por conta de uma
mudança de perfil dos candidatos a um emprego. Salários pouco atrativos e
jornadas engessadas demais são alguns dos pontos que podem influenciar no
interesse ou não por uma vaga.
mudança de perfil dos candidatos a um emprego. Salários pouco atrativos e
jornadas engessadas demais são alguns dos pontos que podem influenciar no
interesse ou não por uma vaga.
Nelson Goulart Junior, presidente da Abrasel-PR,
resume essa dificuldade toda em apenas uma afirmação: depois da Covid-19,
contratar virou o maior desafio dos empresários.
resume essa dificuldade toda em apenas uma afirmação: depois da Covid-19,
contratar virou o maior desafio dos empresários.
“A pandemia passou a ser o nosso segundo maior problema dos restaurantes. Hoje, o maior é realmente a contratação e a manutenção de pessoas, está muito difícil”, disse.
E isso é comprovado pelos números. Ozeias
Teixeira de Oliveira, proprietário da Gold Food Service, trouxe pesquisas de
mercado que indicam o item remuneração como um dos principais fatores para a
retenção ou não de colaboradores no negócio.
Teixeira de Oliveira, proprietário da Gold Food Service, trouxe pesquisas de
mercado que indicam o item remuneração como um dos principais fatores para a
retenção ou não de colaboradores no negócio.
“As pessoas estão em busca de emprego, mas a remuneração está muito baixa. Assim, as pessoas buscam oportunidades melhores mesmo depois de contratadas. Mais de 42% das negociações salariais no Sul são com ganho real, acima da média. Se ficar como está, os restaurantes vão perder mão-de-obra”, afirmou.
Para ele, a taxa de desemprego (11,6% em 2021) não pode ser levada em consideração na hora de justificar a dificuldade em contratar para o restaurante. Há muitas outras variáveis.
Mudança de hábito
Wagner Villaverde, gestor das operações da rede
Outback em Curitiba, fez uma análise certeira do atual cenário de quase
pós-pandemia: os trabalhadores querem mais flexibilidade nas suas jornadas,
melhor remuneração dentro do que é possível e, principalmente, a certeza de
como pode progredir na empresa.
Outback em Curitiba, fez uma análise certeira do atual cenário de quase
pós-pandemia: os trabalhadores querem mais flexibilidade nas suas jornadas,
melhor remuneração dentro do que é possível e, principalmente, a certeza de
como pode progredir na empresa.
“É preciso ser claro com que o funcionário pode ter no restaurante, carreira e crescimento. Devemos escutar ele com transparência, o que ele pretende ao trabalhar ali. Isso ajuda a formar melhor as pessoas e a segurar os talentos”, diz.
Embora gerencie grandes operações com alto fluxo
de clientes e benefícios que podem ser mais atrativos, em especial melhores
salários, Villaverde explica que pequenos operadores também podem propiciar
melhores condições de acordo com o que o novo mercado exige.
de clientes e benefícios que podem ser mais atrativos, em especial melhores
salários, Villaverde explica que pequenos operadores também podem propiciar
melhores condições de acordo com o que o novo mercado exige.
Entre elas, estão um diálogo mais franco e
transparente com os funcionários, criar uma rotina de ouvi-los com mais
frequência, entender as demandas deles.
transparente com os funcionários, criar uma rotina de ouvi-los com mais
frequência, entender as demandas deles.
“Às vezes o vale-transporte pode já estar defasado e ele tem vergonha de chegar e pedir para aumentar, ou o horário de trabalho conflita com algo em casa que o faça chegar sempre atrasado, tem que ter uma visão humana além de simplesmente ‘business’”, completa.
É a mesma visão que Fábio Voelz, diretor de
recursos humanos do Grupo Madero, tem sobre o novo perfil de colaboradores e
que precisou aprender durante a pandemia. Ele ressalta que as pessoas não buscam
mais apenas uma remuneração.
recursos humanos do Grupo Madero, tem sobre o novo perfil de colaboradores e
que precisou aprender durante a pandemia. Ele ressalta que as pessoas não buscam
mais apenas uma remuneração.
“No Madero nós somos atrativos, muitas das nossas vagas são para primeiro emprego. Temos nossos atrativos, mas também tivemos que nos adaptar às novas formas de trabalho e de gestão do dia a dia, reavaliando o perfil de contratação, como são as pessoas que vão se adaptar melhor ao nosso negócio de hoje”, conta.
De acordo com ele, não há uma receita pronta,
mas clareza no que se oferece. Tanto que a rede conseguiu, em apenas um mês,
contratar mais de 800 pessoas para trabalhar nas operações abertas pelo país.
mas clareza no que se oferece. Tanto que a rede conseguiu, em apenas um mês,
contratar mais de 800 pessoas para trabalhar nas operações abertas pelo país.
Sem rotatividade
Essa é a expressão mais sonhada por praticamente todos os empresários do setor, e difícil de ser alcançada. No entanto, a gestora de recursos humanos do Grupo Madalosso, Mari Werner, tem sentido que conseguiu chegar neste patamar.
Durante o encontro da Abrasel-PR, ela revelou que alcançou a marca de três meses sem rotatividade na cozinha – algo considerado difícil em um restaurante tão grande e complexo como o Novo Madalosso, em Curitiba.
E, se levar em consideração que o negócio tem
uma gestão familiar que precisou se profissionalizar “na marra” durante a
pandemia, a marca é ainda mais celebrada.
uma gestão familiar que precisou se profissionalizar “na marra” durante a
pandemia, a marca é ainda mais celebrada.
“Entendemos que seria necessário criar programas de gestão de pessoas e de carreiras, criando oportunidades desde o cargo de garçom até lideranças e outros setores. Precisamos começar a identificar melhor o perfil dos trabalhadores, para encaminhar para as funções ideais sem precisar desliga-los, além de estabelecer uma comunicação transparente com eles”, analisa.
Outra dificuldade foi deixar claro para os
funcionários que promover reajustes salariais de acordo com o pretendido por
eles seria difícil neste momento, já que o movimento no restaurante ainda não
foi retomado plenamente – apenas 30% do que seria normal.
funcionários que promover reajustes salariais de acordo com o pretendido por
eles seria difícil neste momento, já que o movimento no restaurante ainda não
foi retomado plenamente – apenas 30% do que seria normal.
Liderança e cultura
Para se chegar a um relacionamento cada vez mais
claro e transparente com os colabores, é preciso formar boas lideranças que
reforcem e repliquem a cultura da empresa. Um dos pontos levantados por
Villaverde, por exemplo, é a da falta de uma identificação do funcionário com o
seu gestor.
claro e transparente com os colabores, é preciso formar boas lideranças que
reforcem e repliquem a cultura da empresa. Um dos pontos levantados por
Villaverde, por exemplo, é a da falta de uma identificação do funcionário com o
seu gestor.
“A cozinha está com muito trabalho e o gestor ou líder não está lá, está no salão tomando um vinho, por exemplo. Isso não pode acontecer, o gestor tem que ser um espelho para quem trabalha na operação, e dar o exemplo do que deve ser feito”, afirma.
O que vai de encontro com a opinião de Voelz, do
Grupo Madero. A boa liderança é que faz os colaboradores se sentirem motivados
e capazes, em quem se espelham como uma projeção de carreira.
Grupo Madero. A boa liderança é que faz os colaboradores se sentirem motivados
e capazes, em quem se espelham como uma projeção de carreira.
“Os líderes não nascem prontos, temos que formá-los. E mostramos todo o caminho que o novo colaborador tem até chegar neste cargo. Pegamos muitos funcionários como primeiro emprego, e treinamos de 21 a 45 dias para o cargo, mostrando todo o caminho dele na empresa”, conta.
Transparência
Nelson Goulart Junior, da Abrasel-PR, complementa lembrando que tudo isso demanda uma conversa adulta e muita análise transparente sobre o trabalho dos funcionários: “às vezes temos muita expectativa e, quando não se cumpre, gera uma grande frustração que afeta a gestão do trabalho”.
Ele ressaltou que muito disso é um reflexo do que as próprias escolas de gastronomia ensinam ou deixam de ensinar.
“Um trabalho mais humanístico que algumas escolas já perceberam a necessidade”, completou.
Presente também ao debate, Gilberto Pereira
Dias, representante do Senac-PR, afirma que a escola já faz um trabalho assim,
cobrando dos instrutores um reforço na formação de habilidades como
comprometimento com o trabalho, cumprimento de horários, etc.
Dias, representante do Senac-PR, afirma que a escola já faz um trabalho assim,
cobrando dos instrutores um reforço na formação de habilidades como
comprometimento com o trabalho, cumprimento de horários, etc.
“E também levamos os alunos para visitas técnicas em estabelecimentos, como Madero, Madalosso, entre outros”, finaliza.