Mercado e Setor
Quatro em cada dez bares e restaurantes do país fecharam as portas definitivamente neste ano
“Quem conseguiu retomar as atividades entre julho e agosto, quando as regras começaram a ser flexibilizadas, tem chances muito menores de fechar se as restrições não aumentarem ainda mais”. É assim que o diretor-executivo da Associação Nacional de Restaurantes (ANR), Fernando Blower, analisa a situação do setor de food service passados nove meses do início da pandemia do coronavírus no Brasil.
A afirmação se baseia na pesquisa setorial mais recente feita em parceria com a Galunion Consultoria, com a participação de cerca de 500 empresários do setor de alimentação fora do lar de todo o país entre os dias 7 e 27 de novembro.
O levantamento divulgado na segunda-feira (14) apontou que praticamente 4 em cada 10 deles fecharam as portas de pelo menos uma loja ao longo da pandemia, entre os que possuíam duas ou mais unidades. Estima-se ainda que dois a cada dez negócios independentes (com apenas uma unidade) tenham encerrado as atividades neste ano.
Com isso, o número de fechamentos de vagas formais do setor chega a 236.350 em todo o país de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), entre os que trabalhavam nos bares e restaurantes que já fecharam as portas e nos que ainda estão abertos – 64% afirmam que demitiram na crise.
“Estes são números de empregos formais, mas o impacto na cadeia é extremamente maior por causa dos informais e dos dependentes do setor, como os distribuidores, por exemplo. Esse número pode chegar a um milhão de pessoas”, afirma Blower.
Simone Galante, CEO da consultoria Galunion, vai
além e lembra que além dos demitidos nas operações que continuam abertas, há um
contingente de 70% de empresários que acessaram os mecanismos da MP-936, de
redução de salários e de jornada. A medida provisória foi convertida na lei
14.020/20.
além e lembra que além dos demitidos nas operações que continuam abertas, há um
contingente de 70% de empresários que acessaram os mecanismos da MP-936, de
redução de salários e de jornada. A medida provisória foi convertida na lei
14.020/20.
Entre os trabalhadores que continuam empregados, 1/4 já está com o salário de novembro atrasado e pode ficar sem o 13º salário neste fim de ano, por falta de recursos em caixa dos empregadores. E isso pode se agravar ainda mais com o endurecimento dos decretos de diversas cidades do país nestas últimas semanas, um período crucial e importante para o setor.
“Essa questão é a média, mas os números são bem distintos entre as redes, com 16% delas sem conseguir pagar os salários, mas chegando a 33% entre os independentes. Então o que prevemos é uma sobrevivência muito superior das redes do que dos restaurantes independentes”, analisa Simone Galante.
Ano para esquecer
Cristiano Melles, presidente da ANR, afirma que 2020 vai se consolidando como o “pior ano da história do setor”, e com uma dificuldade concreta de se prever como será em 2021 – 56% dos empresários entrevistados dizem não ser possível enxergar como será o faturamento no ano que vem visto o aumento de casos da Covid-19.
“Nós temos duas condicionantes daqui para frente: a velocidade da vacina, que é um vetor positivo, e o aumento das restrições pelo país, um vetor negativo importante para o setor, como em São Paulo, por exemplo. Isso inviabiliza a retomada. Agora, de qualquer maneira, se não houver nenhuma restrição ainda mais impactante, veremos um crescimento gradativo até 2022 para recuperar aos patamares pré-crise”, completa Fernando Blower.
A pesquisa da ANR com a Galunion apontou que, no mês de outubro, mais da metade dos empresários perdeu de 1/3 para mais de 50% do faturamento na comparação com o mesmo período do ano passado. Isso, segundo a entidade, agravou até mesmo a arrecadação de tributos, um recorte importante feito neste levantamento.
De acordo com a Associação Nacional de Restaurantes, 4 em cada 10 negócios estão com impostos atrasados, sendo que 34% deles vão aguardar programas de refinanciamento ou parcelamento das dívidas, e outros 31% só vão pagar se tiverem desconto. Para o diretor-executivo da ANR, isso prova que não são apenas os empresários que são afetados pela pandemia e aumento das restrições, mas os próprios governos municipais, estaduais e federal que deixam de arrecadar.
“Os bares e restaurantes são, em sua maioria, empresas de pequeno porte, e os programas do governo como o Pronampe e o Peac (o de recebíveis nas maquininhas de pagamentos) não foram suficientes para aliviar os passivos que elas tiveram desde o começo da pandemia. Os empréstimos estão começando a vencer agora e vão se somando às contas do dia a dia, os impostos cobrados e o baixo faturamento”, explica.
Entre as soluções pedidas pela Associação Nacional de Restaurantes estão políticas setoriais específicas para cada segmento, levando em consideração os efeitos sofridos em casa uma delas, como programas de fomento e de refinanciamento de dívidas, prazos dilatados, isenção de multas e juros, entre outros. E ainda medidas regionais para o setor, como iniciativas de redução de tributos que vêm sendo discutidas em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro.
Sem clientes, sem caixa
A falta de recursos para pagar os salários de novembro e o 13º e os tributos se dá pelo baixo número de clientes por diversos fatores, segundo os empresários. Seja pela localização pouco privilegiada neste momento como zonas comerciais em que os funcionários seguem em home office (29%) como também pela falta de confiança do consumidor (27%) e limitações impostas por decretos (20%).
Este último, aliás, tem sido como um dos principais entraves para a retomada do faturamento, já que vem restringindo o funcionamento por algo que a ANR considera ser uma falha dos governos municipais e estaduais, e não dos restaurantes.
“O certo mesmo é dilatar o horário de funcionamento dos bares e restaurantes, e não limitar a poucas horas por dia. Passados nove meses de pandemia, as pessoas querem socializar e vão fazer isso na rua realmente gerando aglomeração. Mas é na rua, porque dentro dos estabelecimentos as regras estão sendo seguidas até mais do que se exige, segundo pesquisas setoriais feitas no Rio de Janeiro. Ora, se as pessoas não podem ficar dentro dos bares e restaurantes, elas vão para a rua, e aí não diz respeito aos restaurantes”, critica Fernando Blower.
Para ele, o setor vem sendo alvo de medidas paliativas para “dar uma satisfação pública de onde o estado é que deveria atuar”. A afirmação faz coro ao discurso da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Paraná (Abrasel-PR), que também criticou o endurecimento das regras em Curitiba há quase duas semanas, e da Abrasel de São Paulo sobre o último decreto do governador João Dória, que fecha os bares às 20h e limita a venda de bebidas alcoólicas nos restaurantes – esta última medida foi suspensa por uma liminar da justiça nesta terça (15).
“Nosso setor tem cumprido com rigidez todas as regras e protocolos de segurança e não queremos e nem devemos ser penalizados com novas restrições enquanto vemos quase todos os dias, em várias partes do país, eventos clandestinos sem nenhuma fiscalização”, afirma Cristiano Melles.
E depois?
Já em relação ao futuro, 41% dos entrevistados
dizem estar aberto a novas parcerias de negócios e investidores, 37% estão
investindo em formatos e novos canais (dark kitchen, cloud kitchen, varejo),
23% em novas marcas próprias, 22% buscam financiamento/investidores sem abrir
mão de controlar o negócio, e 22% querem vender a operação.
dizem estar aberto a novas parcerias de negócios e investidores, 37% estão
investindo em formatos e novos canais (dark kitchen, cloud kitchen, varejo),
23% em novas marcas próprias, 22% buscam financiamento/investidores sem abrir
mão de controlar o negócio, e 22% querem vender a operação.
“Teremos grandes desafios a colher em 2021 e é muito importante olharmos para novas estratégias e toda essa transformação digital”, completa Simone Galante, da Galunion Consultoria.
Evidenciando o momento de transição, o estudo apontou que 23% das vendas ainda são pagas em dinheiro em espécie, mas que a digitalização vem crescendo cada vez mais e será praticamente uma obrigação para os estabelecimentos que quiserem se manter em pé.