Histórias
Divina união em torno da mesa: Festa do Divino Espírito Santo de Guaratuba atrai pela fé e pelos sabores típicos
Romaria do Divino registrada em 2016 Jonathan Campos/Gazeta do Povo
Durante vários dias de quermesse,uma linha de produção alimenta a barraca do pastel da Festa do Divino Espírito Santo de Guaratuba e, consequentemente, a fome dos fiéis e turistas. Um grupo rala o queijo, outro faz o refogado de carne moída, um terceiro frita os pastéis e um último fica encarregado das vendas.
Esse pequeno recorte é um reflexo da união de voluntários e de doadores em torno da construção do sucesso da festa, que celebra o Espírito Santo, Terceira Pessoa da Santíssima Trindade da fé cristã, e acontece desde a fundação da cidade, em 1771, todo mês de julho. Em 2024, a celebração será de 3 a 14 de julho.
Quem organiza essa linha de produção é o casal Márcia e Jucemar Henrique, voluntários há 14 anos. Além de trabalhar das 8 da manhã até a hora que a festa termina, em geral perto da meia-noite, os dois montam a escala dos voluntários da barraca, em uma rotatividade entre cerca de 36 pessoas por dia. O trabalho é intenso, mas, para Márcia, que é de Mafra (SC), tudo vale a pena pela fé e pelos amigos que fez ao longo dos anos em Guaratuba por causa do evento. “O mais importante de tudo na vida é ter amigos. Tendo bons amigos, você vai longe”, opina.
A gastronomia típica é, em conjunto com a celebração católica, o que torna a festa tão popular. A quermesse, como é chamada pela organização toda a atividade no pátio, fora da igreja, inclui uma ampla praça de alimentação com churrasco, pastel, pinhão, quentão com gemada, lanche de pernil e, como o local pede, bolinho de camarão e até almoço com frutos do mar.
As carnes assadas são o prato mais famoso, e ganham destaque pelo tempero tradicional, feito pela própria comunidade. Ao longo dos dias de festa, a carne é temperada três vezes, garantindo sabor fresco a todos os visitantes. Outro quitute aguardado é o bolo do Divino, servido apenas no último dia da festa. De segunda a sexta-feira, caravanas de idosos chegam de todo o Litoral para um almoço com pirão, camarão e peixe. E para alimentar quem trabalha na cozinha, de 400 a 500 refeições doadas são servidas por dia gratuitamente aos voluntários.
Além do verdadeiro exército que se reveza em diferentes tarefas na praça de alimentação que funciona em três turnos nos 12 dias de festa — tradicionalmente ela dura dez dias, mas, em 2024, se estende por mais dois — as doações e o patrocínio de empresas e de pessoas são fundamentais para a realização do evento. Este ano, por exemplo, todas as massas dos pastéis que serão vendidos com lucro revertido para a igreja foram doadas pela Romanha Alimentos.
“Para nós, não apenas como fábrica, mas como seres humanos, é extremamente gratificante colaborar com uma celebração tão linda e tradicional. A Festa do Divino não só movimenta um grande número de pessoas, mas também impulsiona o turismo para o nosso Paraná. Levar o pastel da Romanha, nosso produto mais tradicional, é uma maneira de compartilhar amor com as milhares de pessoas que visitam a Festa”, diz o CEO da Romanha, Cesar Kulpa.
Também é o caso dos pinhões, comida típica paranaense com presença cativa em festejos de inverno. Os mais de 350 quilos da semente estão sendo doados pelo casal Ângela Maria Farias de Souza e Nelson De Souza, donos de uma loja de presentes local. “O comércio todo ajuda e vai construindo a festa”, comenta Ângela. Cada empresa ou família contribui como pode, com parcerias, apoio financeiro, brindes para a pescaria, entre outras formas de ajudar.
O objetivo deste ano é arrecadar dinheiro para a restauração da Igreja Nossa Senhora do Bom Sucesso, conhecida entre os moradores como “Igrejinha do Centenário”, a primeira da cidade e um marco turístico local, além de gerar fundos para as pastorais e outras paróquias que a Igreja Matriz ajuda. É o que relata Marcela Farias Pires, que junto com o marido, Rafael Mosconi Arnulf, forma o casal festeiro de 2024, escolhidos pela comunidade como os responsáveis pela organização da edição. “Eu sempre falo que a festa é uma união, acolhemos todo mundo. É um encontro de famílias, de amigos, de pessoas distantes que se unem para sentar ao redor da mesa. Essa união é muito importante”, comenta Marcela. Como um dos maiores eventos religiosos e culturais do estado, a festa conta com duas celebrações católicas diárias, confissões e igreja aberta para receber os fiéis.
Graças à Festa do Divino
A gratidão por pedidos atendidos move muitos fiéis a ajudarem na realização da festa. É o caso de Márcia Henrique, da barraca do pastel. Ela já ajudava no evento quando, em 2016, sofreu um acidente de carro e ficou 16 horas presa no veículo. Nos momentos que misturaram angústia e esperança, ela prometeu a Nossa Senhora Aparecida que, se saísse dali com vida, continuaria ajudando a Festa do Divino sempre. Foi resgatada, perdeu o movimento de um dos ombros, e agradece até hoje por ter a vida preservada. “É preciso ter fé e nunca se afastar de Deus. Com fé e com amigos, você tem tudo na vida”, reflete.
Graças à Festa do Divino, o atual casal festeiro passou a ser um casal, em primeiro lugar. Filhos de casais festeiros de diferentes épocas, eles se conheceram quando Rafael atuava como voluntário do passeio de motociclistas organizado na festa, enquanto Marcela trabalhava na parte da alimentação. “Eu digo que foi o Divino que nos uniu”, conta ela. O primeiro beijo foi no evento, assim como a descoberta, depois anos depois, de que Marcela estava grávida.