Hack pela Gastronomia
Redefinindo o restaurante pós-pandemia: como promover um ambiente mais seguro para os clientes
Desde o simples distanciamento das mesas nos restaurantes até a criação de cápsulas de vidro para o isolamento das pessoas durante as refeições, mudanças nos ambientes dos estabelecimentos começaram a ser feitas por conta da pandemia do novo coronavírus. São medidas que acabam por redefinir espaços que atendam aos diversos protocolos de combate ao Covid-19 sem deixar de lado a importância das relações humanas.
O último talk do Hack pela Gastronomia do Bom Gourmet, mediado pela editora de HAUS, Daliane Nogueira, reuniu o arquiteto e professor da Escola de Gestão em Negócios da Gastronomia, Herbert Holdefer, a gerente técnica da Associação Nacional de Restaurantes (ANR), Eliana D. Alvarenga, e a proprietárias dos estabelecimentos Casa do Porco e Bar da Dona Onça, Janaina Rueda, para discutir o processo de adaptação do ambiente e o que fica desse processo no pós-pandemia.
De acordo com Eliana, quando a pandemia começou, a ANR precisou prever como a situação impactaria o setor e, também, como seria possível preparar os donos de estabelecimentos para o que estava por vir.
Ela explica que, diante de inúmeras legislações específicas para cada município, a associação se viu diante da necessidade de produzir cartilhas que informassem os empreendedores sobre como proceder. Seguir os protocolos, segundo Eliana, se tornou prioridade para manter os clientes fiéis aos negócios.
“O cliente está muito mais exigente e também informado sobre as normas técnicas. Para que ele se sinta seguro agora e no pós-pandemia, é preciso não apenas redefinir o espaço físico, como também o espaço de confiabilidade”, explica.
A técnica da ANR adiciona, ainda, que, mesmo para o pequeno estabelecimento que tem poucas condições de investir na redefinição do espaço, é possível se adequar às regras estabelecidas. Estabelecimentos maiores, como ela explica, implantaram as placas de acrílico para o distanciamento social, por exemplo, mas isso pode ser feito com o simples reposicionamento das mesas.
Para a proprietária Janaina Rueda, a preocupação de não conseguir se adequar ao protocolo de segurança se dissipou no momento em que ela percebeu que seus estabelecimentos já eram adeptos de várias medidas muito antes da pandemia.
Mesmo as normas novas que tiveram de ser implantadas com urgência, segundo ela, beneficiaram o espaço de alguma maneira. A Casa do Porco, por exemplo, teve de eliminar o conceito de mesas coletivas, o que, apesar de impactar o negócio, permitiu o trabalho mais elegante e tranquilo no local.
“É lógico que tivemos uma redução na receita, mas também tivemos a oportunidade de refletir sobre o espaço em que comemos, o respeito que devemos a ele, e sobre quem está comendo ao nosso redor”, diz Janaina.
Veja na íntegra como foi o bate-papo:
Utilização
do espaço externo
do espaço externo
A valorização de espaços externos, como calçadas e estacionamentos, é um conceito em ascensão no Brasil. Os participantes do talk acreditam que, além de ser uma abordagem que contribui monetariamente para os estabelecimentos, se trata de uma oportunidade de exercitar a interação humana e com o meio ambiente.
Ao contrário de alguns países europeus onde a utilização do espaço urbano faz parte da cultura gastronômica, a aprovação do uso desses espaços é um processo mais demorado no Brasil.
De acordo com o arquiteto Herbert Holdefer, projetos de uso de calçadas e estacionamentos contribuem para a maior segurança das ruas, além de gerarem mais empregos e mobilidade. Para ele, a pandemia irá impulsionar o desenvolvimento desses projetos. No entanto, eles não devem ser vistos como momentâneos.
Um exemplo de projeto de uso externo que promete expansão a longo prazo é o Ocupa Rua, idealizado pela prefeitura de São Paulo em parceria com empresas voluntárias. A Casa do Porco foi selecionada para servir como protótipo do projeto por ser um estabelecimento que, antes da pandemia, gerava muita aglomeração de pessoas.
Como explica Janaina, reduzir a aglomeração em um estabelecimento tão popular e turístico serve como exemplo para outros restaurantes e a ideia é de que o Ocupa Rua seja implantado em mais de 40 bairros da capital paulista.
“Quando eu fui procurada para participar do projeto, fiquei muito surpresa com a grandiosidade dele. Percebi que todos os envolvidos estavam pensando muito mais na doação para estimular a maior segurança do que no dinheiro”, afirma.
A proprietária explica, ainda, dentre os desafios do projeto estava o de repassar os protocolos de maneira educativa e divertida para os clientes. Mesmo no espaço aberto, ela relembra que as normas são essenciais, mas afirma que, até o momento, foram bem recebidas por todos.
Cozinhas
transparentes
transparentes
Outra tendência evidenciada durante a pandemia foi a preocupação das pessoas com a procedência e qualidade dos alimentos que consomem. Diante disso, vários restaurantes passaram a adotar a ideia de “cozinha transparente” que estabelece uma relação mais íntima entre o estabelecimento e os clientes.
Para o arquiteto Holdefer, a ideia de cozinha aberta precisa ser expandida, porque garante mais segurança ao cliente e, principalmente, permite aos funcionários o olhar para fora.
“Quem trabalha dentro de uma cozinha deve colocar carinho naquilo que produz, já que será consumido por outra pessoa. Permitir que o funcionário enxergue para quem ele produz, faz com que a dedicação seja maior ainda”, explica.
O cuidado com o funcionário, como explica a técnica da Associação Nacional de Restaurantes, é tão importante quanto o cuidado com o cliente. Segundo Eliana, alguns funcionários passam suas vidas nos estabelecimentos e, diante da situação pandêmica, nunca foi tão importante se preocupar com a satisfação deles.
“O setor gastronômico está sendo muito valente nesse momento, pois está enfrentando as dificuldades com dignidade, valorizando os seres humanos tanto quanto os aspectos técnicos”, finaliza ela.