Experiência
Conheça a cafeteria em que todos os atendentes têm Síndrome de Down
FLORIANÓPOLIS (SC) — Ninguém vai a uma cafeteria somente pelo café. Vai-se, mesmo sem saber, pela experiência, baseada em elementos tão complexos que superam os cinco sentidos. Experiência única no Brasil é visitar a Cafeteria Especial, em Blumenau.
O lugar é bonito. Um jardim com deck de madeira cercado por plantas e árvores. Mas o privilégio é o atendimento. Não estranhe se, ao pedir um cafezinho, venha antes um abraço. Leandro Garcia, 27 anos, Fernando Manerich, 22 anos, e Guilherme Prim, 18 anos, recebem os clientes com afetuosidade genuína e sincera.
Os funcionários têm o cromossomo do amor, como é conhecida a trissomia no cromossomo 21, característica das pessoas com a síndrome de Down.
A inspiração do negócio veio da Chefs Especiais, o primeiro café inclusivo do Brasil, aberto em setembro de 2017, na rua Augusta, em São Paulo, que por sua vez se inspirou em um café em Dublin, na Irlanda. Porém, os atendentes não tinham vínculos trabalhistas, eram voluntários, e a cafeteria fechou no ano passado – atualmente os chefs participam de eventos promovidos pelo Instituto com o mesmo nome.
O Chefs Especiais serviu, no entanto, para que Delfino Pellegrini, formado em direito e filosofia; Giorgio Sinestri, que tem formação em filosofia, teologia e psicologia; e Mayara Lopes, que é administradora, se inspirassem no modelo.
Mesmo sem dinheiro na conta e dependendo de empréstimos de R$ 100 mil, os sócios apostaram no projeto. A Cafeteria Especial foi inaugurada no dia 8 de dezembro de 2018, na rua Uruguai, 422, no bairro Ponta Aguda, pertinho do Centro. Desde então, funciona de segunda-feira a sábado, das 14h às 20h.
Cardápio também é inclusivo
Atento à inclusão, o cardápio tem opções sem glúten, lactose, veganas e vegetarianas. As fatias brownie custam entre R$ 8 e R$ 12. Entre os salgados, o destaque vai para a mini pizza de brócolis com palmito, que custa R$ 12, e para a coxinha de jaca (R$ 10).
O carro-chefe da casa é a torta Red Velvet, que tem recheio de leite condensado cozido e pedacinhos de morango. A fatia é generosa e custa R$ 12. O espresso médio está R$ 5 – e pelo mesmo preço tem café coado.
O primeiro passo para abertura da cafeteria foi dado com bastante antecedência, em setembro de 2017, após retorno de Giorgio de São Paulo. “Um amigo disse me levaria num lugar que eu ia adorar. Fomos até a Chefs Especiais. Voltei para Santa Catarina com o coração cheio”, contou.
Giorgio trabalhava como voluntário da Sorrir para Down, ONG do município, e foi lá que começou o projeto Culinária Down, com 15 alunos. Sete se mostraram aptos nas várias etapas de estudos gastronômicos, três foram selecionados – mas a meta é que a equipe aumente. Leandro, Fernando e Guilherme são contratados com carteira assinada por 36 horas semanais.
Os três profissionais recebem, paralelamente, treinamentos de comunicação e relacionamento interpessoal. Nesse ano, iniciaram aulas de braile – para receberem clientes cegos -, matemática financeira – para ajudar no uso dos salários -, e manipulação de alimentos. Leandro ainda faz curso de barista.
Os cursos são dados pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em parceria com a Educare Desenvolvimento Humano, empresa de Giorgio.
Também faz parte dos planos adequar todo espaço para acessibilidade, dinheiro que tentaram buscar num quadro de perguntas e respostas do Caldeirão do Huck, programa da Globo, que foi ao ar dia 18 de março. Eles não venceram a prova, mas arrecadaram R$ 33,5 mil numa vaquinha online divulgada pelo apresentador.