Experiência
Cozinha mineira se funde a outros estados para criar novos sabores brasileiros
Foi a primeira vez que o chef Marcelo Petrarca, de Brasília, cozinhou em Tiradentes, cidade histórica no interior mineiro, onde sediou um dos eventos mais importantes de gastronomia do país no início deste mês. Ao lado do chef mineiro Felipe Oliveira, do restaurante Ora, ele teve a audácia – sim, ele usou esse termo – de levar para Minas o doce de leite de Brasília para colocar na sobremesa com churros de banana, um dos pratos que assinou no jantar nos moldes de festim.
“Fazemos essa sobremesa há dez nos restaurantes Reverso e no Bloco C, e sempre usamos o nosso doce de leite feito de forma caseira”, afirmou. “Fiz a prova com quem mais entende desse doce no país, que é Minas Gerais, e ainda bem que foi super aceito. No início, o pessoal da cozinha ficou meio preocupado e receoso, mas depois aprovaram o sabor”, disse ele sobre a experiência.
Petrarca preparou um menu a quatro mãos ao lado do chef Felipe Oliveira como um dos convidados para integrar a programação dos festins: jantares com chefs convidados e anfitriões mineiros para um público mais restrito. Mesmo encerrado o Festival Gastronomia e Cultura Tiradentes, os convocados da edição desenvolveram aprendizados e encontraram até novas inspirações para serem aplicadas em suas cozinhas. Este é o legado da experiência de dividir um menu.
“Essa é a melhor parte da troca de experiência em outras cozinhas. Percebo que a culinária mineira preza muito pelo sabor. Tem muita gente preocupada com a técnica, mas o cuidado com o produto e com o sabor vale muito mais do que isso. São ideais que eu busco e vou levar para a minha cozinha”, contou o chef, que trabalha com ingredientes DOCG (Denominação de Origem Cearense Garantida), sempre valorizando a cultura da região.
Se Petrarca levou o doce de leite de Brasília para Minas, a hortaliça típica mineira ora-pro-nóbis foi o que encantou o chef. Para ele, o uso dessa Panc (planta alimentícia não convencional) é uma prova de como a cozinha mineira usa, com maestria, ingredientes diferentes. “Me encoraja a usar e pensar em novos sabores e combinações”, disse. Já o chef Marco Gil, de Fortaleza, no Ceará, trouxe um pouco dos seus ingredientes encontrados na sua região para assinar o jantar na Escola Senac ao lado do chef Ronie Peterson, como a lagosta assada com picles de caju. Ele também assinou a entrada, um atum selado com espuma de coco e biju de tapioca mas, sobre o jantar, fez questão de destacar outro prato: a sobremesa do seu parceiro mineiro.
“Ele fez uma choux com ingredientes típicos de cada serra mineira – Canastra, Mantiqueira, Espinhaço, Caraça e Piedade. Receitas assim fazem a gente descobrir, conhecer e absorver novas ideias para integrar a nossas gastronomia em nossos restaurantes”, disse ele, após o jantar, sobre a oportunidade de conhecer ingredientes que representam o Estado de origem de cada chef.
Ronie Peterson acredita que a troca com o português Marco Gil é maior do que as receitas em si. “É reconhecer a valorização daquilo que é regional, do nosso terroir e da nossa região. Ser bairrista naquilo que realmente é necessário, sabe? E valorizar o que o seu ‘chão’ te proporciona, do quiabo com frango à lagosta tostada na pedra que se faz tão bem no Ceará”, disse o chef.
De São Paulo, a chef Morena Leite levou sua cozinha leve e delicada com referências baianas para a cozinha do Ora. Ela fez ravióli de tapioca recheado com queijo serra mineira do Canastra ao molho de ervas e um linguado recheado com palmito pupunha acompanhado de gateau de banana da terra. Participar de outras cozinhas não é nada novo para ela. “Mas eu faço isso há mais de 20 anos e, mesmo assim, é sempre uma troca de aprendizado muito gostosa. Acabamos aprendendo técnicas não só com os chefs, mas com qualquer outra pessoa na cozinha, até com quem está na pia tirando limão de outra forma.”, enumera.
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