Experiência
Como o food design pode mudar a sua relação com os alimentos
Você pode estar pensando num belo prato apresentado por um chef, aquele de fazer qualquer artista renomado ficar com inveja. Mas, não, food design não tem necessariamente relação com uma apresentação mais apurada de um alimento ao sentido da visão. Mas, pode ter. Food design também não tem ligação direta com um cozinheiro ou chef, “um food designer é alguém que trabalha com comida, sem ter qualquer ideia de cozinhar”, referenciou a fotógrafa Inga Knölke sobre o tema. Mas pode ficar ainda melhor se um chef ou cozinheiro se apropriar de seus conhecimentos. Para a Rede Latinoamericana de Food Design, que fomenta o tema, a metodologia é toda e qualquer ação que melhore a relação das pessoas com os alimentos.
Renato Bedore, designer gráfico e chef de cozinha, prefere dizer que não é só food (comida) e nem só design, mas sim uma ação transdisciplinar, que atua de maneira sensível na construção e na afirmação das nossas relações com a comida. “Acredito que tanto a atividade de um chef de cozinha que se preocupa em apresentar da melhor forma um determinado ingrediente, amparado na comunicação sobre a sua produção, origem entre outros, quanto um designer que desenvolve um produto ou um serviço que tenha o mesmo objetivo, podem ser classificados como atuantes no food design. Em especial os projetos e estratégias que nos aproximem do que é uma comida de verdade, algo minimamente processado, que é carregado de técnicas e saberes tradicionais”, afirma.
O chef e designer esteve, entre em outubro, em Santiago, no Chile, para apresentar no 6º Encontro Latinoamericano de Food Design suas experiências profissionais transformadas em artigos técnicos na área. Elas dizem respeito aos serviços criados na Vivah, empresa da qual é sócio com mais dois empresários, um deles o designer Luiz Mileck. Um dos painéis foi sobre o Prove!, solução na área de gastronomia, formada por várias ferramentas do food design, com objetivo de promover produtos especiais, agregando conhecimento e devolvendo o potencial transformador da gastronomia.
“No Prove!, nosso desafio foi construir uma experiência que entretivesse as pessoas participantes, mas entregasse conteúdo e conhecimento para que elas compreendessem o universo daquele produto”, explica Bedore. Os produtos, no caso, eram cerveja, vinho e café. “Criamos vivências gastronômicas onde convidamos os participantes a imergir no universo do produto e conhecê-lo a partir dos sentidos, construindo melhores formas de consumi-lo. Queríamos, ao impactar a pessoa de forma sutil, indicar um caminho e, a partir dele, ela poder construir uma nova relação. Por exemplo, com o café os participantes entenderam que ele tem outras funções que não apenas acordá-las pela manhã. Na cerveja, derrubamos o mito de que ela deve ser sempre consumida gelada.” Foi nessa época que ele e o sócio, Luiz Mileck, fizeram mestrado na UFPR para delimitar melhor as vivências com food desing e criar metodologias para essa construção. “Foi o resultado desses dois mestrados que apresentamos no encontro da Rede Latinoamericana, do qual Mileck é o representante em Curitiba.”
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A Rede trabalha com nós – representantes nas regiões, aqueles que movimentam institucionalmente as ações – e os associados, no qual se enquadra Bedore. “A Rede funciona há 6 anos e está presente em 12 países latinoamericanos. A partir do nó, que é uma cidade como Curitiba, trabalha-se em prol de estratégias que melhorem a relação das pessoas com a alimentação. Caminhos assertivos e sustentáveis para melhor entender o alimento”, esclarece. É assim, facilitando a vivência com os alimentos que a metodologia atua desde seu reconhecimento por meio do food designer Martí Guixé, em 1997.
Para o precursor, o food design possibilita pensar o alimento como algo possível de ser projetado, um objeto ergonômico, funcional, comunicativo, interativo, visionário, mas contemporâneo e atemporal. Ou seja, o food design está ligado à indústria alimentícia e quanto mais ele é usado, mas a relação do consumidor com o alimento se torna estreita e verdadeira. Um impacto positivo. “Na medida em que o consumidor começa a ter mais autonomia nas suas escolhas alimentares, ele está sendo beneficiando pelas estratégias que são oriundas da metodologia. Que pode ser, por exemplo, a escolha de um suco mais integral e natural, com base nas informações do rótulo, até a formação do hábito de comprar produtos a granel ou em feiras livres com a utilização de recipientes retornáveis. Apesar de ainda ser uma área nova de atuação e de reconhecimento, muitas soluções que vemos implantadas na indústria de alimentos partem de métodos que são naturais ao food design”, enfatiza Bedore. Para ele, sem dúvida, o food design facilita nosso dia a dia com o alimento.
Design
Cada vez mais presente e interagindo com as mais diversas áreas, o design trabalha com processos, com planejamento, seguindo uma estrutura delimitada, uma lógica, com estética. Seu objetivo é trazer soluções para as necessidades do ser humano. O design é diferente de arte, porque traz soluções, muitas vezes inovadoras. O design supre necessidades, trazendo mais sentido às ações rotineiras das pessoas. Assim é quando um designer desenha uma cadeira para melhor atender as pessoas que precisam dela para longas horas de trabalho. Ou utensílios para facilitar os processos dentro de uma cozinha. “O design é uma área que veio para ficar, com mais e novas formas de resolver problemas crônicos da nossa sociedade e, também, para apontar caminhos sustentáveis para o futuro. Vemos isso claramente dentro das grandes empresas, que estão agregando ao seu escopo estratégicas de design. A comida não poderia ficar de fora”, afirma o chef e designer. Para ele, a nossa relação com os alimentos foi tomada por meios de produção que visam essencialmente lógicas econômicas, em detrimento da saúde e do bem-estar. “Comida acima de tudo é prazer e não só o ato de comer. É, também, o ato de cultivar, cuidar, preparar e servir”, confirma. Nesse cenário, o food design se apresenta como uma ferramenta potente capaz de catalisar as demandas e apresentar meios para aproximar as pessoas cada vez mais do que é uma comida de verdade.