Experiência
Capitalismo e gastronomia: como valores individuais afetam o coletivo
Capitalismo. substantivo masculino. Economia. sistema econômico baseado na legitimidade dos bens privados e na irrestrita liberdade de comércio e indústria, com o principal objetivo de adquirir lucro. Sociologia. sistema social em que o capital está em mãos de empresas privadas ou indivíduos que contratam mão de obra em troca de salário. Por metonímia. conjunto de indivíduos, países etc. capitalistas. Origem ETIM 1 capital s.m. + -ismo.
O capitalismo é, sem dúvida, o maior sistema de inovação e cooperação social que conhecemos. Ele proporcionou a bilhões de pessoas a oportunidade de participar da inigualável experiência de ganhar o próprio sustento e realizar desejos. As novas tecnologias vieram facilitar o percurso, abrindo caminho para mais e mais inovações, experimentações, liberdade e criatividade.
O que não podíamos adivinhar é que esse sistema acabaria resultando em uma grande desigualdade social ao colocar o lucro como objetivo fim do mercado, deixando grande parte do capital na mão de poucos, e que, tempos depois, nos depararíamos com um entrave chamado “recursos ambientais” – que tem limite e já não dá conta de nossa demanda.
O estímulo ao consumo desenfreado, incitado pelo capitalismo, toca a gastronomia quando deixamos de prezar pela qualidade e passamos a colocar o lucro à frente de qualquer coisa. Viajando pela Europa, pude notar uma diferença cultural na forma como consumimos gastronomia. A Suíça é conhecida pela qualidade inquestionável de seus bens de consumo. Não à toa, muito reconhecida por seus relógios caríssimos e vitalícios. Em duas semanas por lá, pude notar que esse valor se estende também ao que comem.
Nas prateleiras, os selos de orgânico e local quase silenciam os produtos que vem de fora ou não são “bons o bastante”. Em pergunta à um amigo suíço sobre os queijos servidos nos restaurantes, ele me disse: “Seria uma vergonha pra um restaurante não servir um bom queijo, produzido localmente com a qualidade suíça”. Caminhávamos pelo supermercado e, ainda que ele não fosse muito ligado à gastronomia, olhava atentamente os rótulos e não comprava nada que não condissesse com seus valores.
Me peguei pensativa: quantas vezes seguimos tendências e consumimos produtos sem saber de onde vem, como foi produzido, compramos por impulso, sem noção da qualidade, sem respeitar o tempo das coisas, valorizamos o que vem de fora e viramos as costas para o que nos caracteriza como nação/território?
Em meio aos meus constantes questionamentos, penso que a crise que vivemos hoje (econômica e ambiental) é, na verdade, um reflexo de uma crise interna, de valores e de consciência, que enfrentamos individualmente. É um reflexo da nossa educação e estilo de vida, que esqueceu do coletivo, da cooperação, e do que é de fato essencial. E só há um jeito de resolver esse conflito: entender que somos parte de um todo. Que somos fruto da sociedade e do ambiente que nós mesmos criamos. É cíclico e, portanto, basta um passo diferente para redesenhar todo o percurso.
Clichê, mas verdade: nunca chegaremos a diferentes lugares, fazendo as mesmas escolhas. Durante esse mês, te faço um convite: Escolha comprar de um produtor local, perguntar de onde vem o produto que você está prestes a comprar, questione os ingredientes, a embalagem, a mão de obra envolvida, a logística, fomente a economia da sua comunidade e estimule o trabalho de alguém que, assim como você, sonha e está tentando materializar seus sonhos de forma transparente e genuína, gerando menos impacto no meio ambiente (afinal, transporte é um dos maiores impactos da cadeia de produção alimentícia), e colaborando mais para uma sociedade menos desigual. Escolha qualidade! Escolha pelos seus valores! Escolha um mundo melhor! O que você tem comprado representa o que você tem como valores pessoais?
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