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Como construir um negócio promissor no café: premiada família de Curitiba conta o segredo
A paranaense Geórgia Franco de Souza figura entre as grandes baristas do Brasil. Premiada e reconhecida como pioneira na difusão da cultura do café, treinou baristas que, hoje, são premiados em todo o país. Em Curitiba, construiu uma história de sucesso com o Lucca Cafés Especiais - cafeteria responsável por difundir a bebida na capital paranaense e reconhecida por valorizar os produtores brasileiros. Mas, Geórgia não está sozinha, tem uma "trupe do café", que dá suporte ao negócio promissor: o marido Luiz Otávio Franco de Souza e os filhos do casal, Camila e Marcelo Franco de Souza, todos apaixonados por café.
Eles se reuniram para contar essa história de sucesso familiar em um dos mais importantes eventos do setor, a Semana Internacional do Café (SIC), que acontece anualmente em Minas Gerais. Na SIC deste ano, que aconteceu em formato digital no mês de novembro, a barista e a família compartilharam algumas dicas para quem deseja empreender nessa área.
Aliás, a primeira razão apontada por ela para o sucesso da cafeteria curitibana é essa: a família foi fundamental para alcançar a excelência. “O fato de não termos sócios externos nos traz muita flexibilidade. As decisões se tornam muito rápidas”, explica Geórgia. A dinâmica de trabalho, que envolve toda a família, é bastante ágil e flexível na tomada de decisões. Uma empresa é formada por diversos departamentos que, juntos, tomam decisões sobre o negócio. No Lucca, por ser uma empresa familiar, cada pessoa representa um setor. “E cada membro da família é como se fosse um departamento conversando com o outro dentro de uma empresa”, afirma Luiz Otávio Franco de Souza.
Geórgia e Luiz Otávio eram engenheiros e abandonaram suas profissões para empreender na área do café. “Para entender o Lucca, acho que é importante a gente falar sobre vocação e sobre missão. Quem conhece a Geórgia vê nitidamente que ela tem uma vocação. E nós, que trabalhamos junto com ela, buscamos dar forma a um negócio que seja rentável, viável e sustentável”, afirma o empresário.
Essa vocação se estendeu para o resto da família. Hoje, os filhos gêmeos do casal, Camila e Marcelo, também cuidam do Lucca. Camila é mestre de torra - e já atuou em várias outras frentes no negócio da família - e Marcelo é responsável pela área administrativa, financeira e de compras. A outra filha do casal, Carolina, embora não esteja no Lucca, segue a veia da família: já ganhou troféus em dois mundiais e atualmente trabalha, com café, na Guatemala. Além da família, também integram o time do Lucca Eduardo Nicolau Feliz, o padeiro Eduardo Freire Feliz, a barista Anna Santos e João Vitor Mingorance, coordenador de cursos do Lucca.
Em 2002, quando o Lucca nasceu, um dos grandes desafios foi ensinar sobre o café aos clientes e fazer com que o produto fosse valorizado. “Num grande produtor do grão, como é o caso do Brasil, a oferta é muito grande e, por isso, o produto acaba sendo desvalorizado”, afirmou Geórgia. E a forma encontrada pela barista para educar esses consumidores e valorizar a bebida foi dividir os grãos por região de produção, mostrando que cada uma delas tem a suas particularidades e o café produzido por uma, é diferente do café produzido pela outra.
Com o crescente interesse dos clientes, o próximo passo do Lucca foi investir nos cafés de concursos, no treinamento dos baristas e, principalmente, na busca de novos cafés, conhecendo novas regiões e produtores. “Ao longo desses anos, cada vez mais buscamos investir em capacitação, levando nossos baristas para campeonatos e aprofundando o treinamento deles, além de promover experiências únicas para os nossos clientes”, explicou Geórgia.
Para ela, aproximar o produtor do consumidor é um exercício fundamental e que contribui para o interesse do cliente e para o sucesso do negócio. “É difícil que a gente possa levar o cliente até as fazendas. Então, trazer o produtor até o Lucca e promover esse encontro. Essa troca é muito interessante”, contou.
Sem cozinha, com espaço reduzido e servindo apenas café: foi assim que o Lucca começou. O negócio familiar cresceu e se adaptou às necessidades do consumidor. Por isso, os acompanhamentos, como doces e pães especiais, passaram a fazer parte da experiência do cliente. “Passamos por muitas etapas até chegarmos à nossa configuração atual. Hoje podemos dizer que temos um casamento que funciona, principalmente para o cliente, que é o mais importante.”
Ao longo desses anos o Lucca cresceu e se adaptou, mas, o que nunca mudou, é o investimento em treinamento. A barista foi categórica ao afirmar que o treinamento deve vir sempre em primeiro lugar. “Café não é só café. Café tem história e tem vários perfis, é preciso conhecê-los”, afirmou. E, embora possa parecer básico, toda a equipe deve ser conhecedora de café, deve entender o produto e saber explicar sobre ele para o cliente. Pensando nisso, o Lucca criou o laboratório-escola, que, além de certificar nacional e internacionalmente em diversas áreas de conhecimento relacionadas ao universo do café, também está disponível para os funcionários refinarem as suas habilidades sempre que necessário.
Muitas pessoas acham que para construir um negócio na área de café é só saber preparar a bebida, escolher um bom café ou, ainda, só torrar bem o grão. “Como você vai passar o produto para o cliente é muito mais importante e a experiência da equipe conta muito. É preciso que todos sejam apaixonados por café, não apenas o dono do negócio”, ressaltou.
Entre todos esses fatores também está a importância de valorizar o produtor, conhecer a produção e estabelecer uma parceria duradoura com quem produz. Segundo Geórgia, isso faz parte de garantir e manter a qualidade do café oferecido ao consumidor. “Construímos vínculos e parcerias profundas com os produtores ao longo da nossa história”, afirmou a barista.
A experiência do consumidor
A história de quase 20 anos à frente do Lucca, além do profundo conhecimento sobre o mercado, conferiram à Geórgia o entendimento sobre o comportamento do consumidor. “Ter feeling para perceber que cada cliente é único faz toda a diferença no negócio”, ressaltou.
E foi a partir desta percepção, que a barista aprendeu a entender, ao longo dos anos, o que o cliente de fato queria e compreendeu que o Lucca tem um público diverso e de diferentes faixas etárias.
A partir daí ela se aprofundou e buscou entender o perfil do consumidor e de cada geração, através da classificação das gerações: os baby boomers, nascidos entre 1940 e 1950, a geração X, que compreende aqueles que nasceram entre 1960 e 1970, e, por fim, os millenials, nascidos entre 1980 e 2000.
Durante este processo de estudo, Geórgia percebeu que atendia a todos esses públicos justamente porque o Lucca entregava, de formas diferentes, o que cada um procurava. “Os boomers buscam algo que nós prezamos muito, que é a qualidade em vez da quantidade. Já a geração X gosta de evoluir, de aprender mais e os millenials são conectados e querem conhecer a fundo o que estão consumindo”, explicou a especialista.
Além deste entendimento sobre o comportamento do público, a experiência possibilitou à Geórgia compreender que existem dois tipos de consumidores: os que comem para viver e os que vivem para comer. É no segundo grupo que se enquadram os clientes do Lucca, independente da idade e da geração. “É um grupo que gosta de socializar pelo prazer de comer”, afirmou. Não é novidade, aliás, que a comida muda o nosso comportamento social e que estabelecemos conexões emocionais com o que consumimos, buscando experiências e buscando vivenciar um momento único.
Segundo a barista, aí é que está a grande diferença entre quem consome o café normal e o café especial: a busca por uma experiência sensorial. O cliente busca estabelecer uma emoção com o que está consumindo. “A experiência em uma cafeteria é, acima de tudo, uma experiência sensorial”, conclui.