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“Alta cozinha se faz também com ingredientes simples”, diz chef Andoni Aduriz
“Quem entende o que é melhor na gastronomia?” É com esse questionamento que o chef Andoni Aduriz, do premiado restaurante espanhol Mugaritz (duas estrelas Michelin e 9º no ranking 50 Best Restaurant), conduziu uma das palestras da segunda edição do seminário Fruto, realizado nesta sexta-feira (25) em São Paulo. Ele explicou como ingredientes muitos simples podem fazer parte da alta cozinha ao lado de ícones como o foie gras e o caviar, por exemplo.

Para mostrar a versatilidade de ingredientes muitas vezes renegados, Aduriz mostrou um prato que leva acelga no preparo, e que ele serve em seu restaurante. Um ‘chorizo vegano’ com a verdura que ele considera como a mais humilde da cozinha, comida desde a época de Cristo pelos pobres.
“Por que coloquei a verdura mais humilde num restaurante de alta gastronomia? Porque o conceito de luxo está nas ideias, na forma de fazer a comida, na qualidade que você imprime a ela”, explica o chef.
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Esta foi uma forma de mostrar que pratos bem elaborados não precisam ser feitos apenas de ingredientes caros, com processos de produção que levam muito tempo e acabam, por consequência, custando mais. Aduriz considera que muito do que se usa na alta cozinha passa longe da sustentabilidade, mas muito perto do desperdício.
“Um prato que servíamos no Mugaritz até o ano passado era de um corte de carne de porcos que normalmente era descartado da cozinha. Só se fala em jamón ibérico, mas eu peguei essa peça que ia parar no lixo e a transformei em um prato conceituado, que passou a ser bem visto por outros chefs depois disso”, conta ressaltando que o porco ibérico leva pelo menos oito anos para chegar no ponto de abate, e que é esse tempo que o faz ser tão caro.
Paradoxo

Além de questionar o que é o luxo na alta gastronomia, Andoni Aduriz faz uma reflexão sobre como o mundo está comendo. Para ele, há um paradoxo que precisa ser explicado e que não condiz com a evolução da humanidade.
“Por que comemos tão mal? Por que todo o conhecimento e tecnologia acumulados desde o período neolítico [quando o homem aprendeu a domesticar os animais] não foram colocados na busca de uma forma hedonista de melhorar as coisas? Nós conseguimos produzir mais gastando menos, mas tanta gente dando de comer para cada vez menos, sem qualidade e pouco sustentável”, questiona.
Aduriz considera que a pirâmide de consumo deveria ser invertida do que se pratica hoje em dia. Enquanto se valoriza cada vez mais a troca de produtos de um lugar para o outro, com ingredientes vindos de longe, o certo seria incentivar o uso de alimentos locais, o mais perto possível do consumidor final.
“Eu entendo que um alimento só se mantém no mercado se ganha escala global. Mas, onde está a sustentabilidade disso? Hoje temos tecnologia e conhecimento para comer melhor do que nunca, selecionar o que vamos utilizar, plantar com eficácia gastando o mínimo de água possível”, analisa.
Para o chef, esse paradoxo só será resolvido quando se incentivar cada vez mais a produção local e as pessoas aprenderem a consumir sem gerar desperdício.
“Quando morre um ingrediente? Quando se deixa de cozinhar e de comer. E quando morre uma ideia? Quando seguramente se deixa de discutir sobre ela”, finaliza.