Bom Gourmet
Dia da Cachaça: Curitiba tem um templo dedicado ao destilado mais brasileiro de todos
O Templo da Cachaça, em Curitiba. Mais de 6 mil rótulos no acervo. divulgação
Comemorado no dia 13 de setembro, o Dia Nacional da Cachaça foi criado pelo Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac) em 5 junho de 2009, durante a feira Expocachaça, em Belo Horizonte (MG). Conta a história que a destilação da mistura fermentada de cana-de-açúcar apareceu por volta de 1520, duas décadas depois da chegada dos portugueses ao país. Como em uma espécie de tributo, o Templo da Cachaça, em Curitiba, tem 900 metros quadrados dedicados ao exclusivamente ao destilado mais brasileiro que se tem notícia, com mais de 6 mil rótulos disponíveis.
Entrar no templo é uma experiência que impressiona. As paredes da loja são decoradas por garrafas e barris de cachaça. Marcas de todo o Brasil compõem a lista. Garrafas e rótulos impressionam pela criatividade e pelo arrojo. Os preços variam entre R$ 40 e R$ 3 mil. A entrada para o museu acontece em uma espécie de passagem secreta, como nos filmes de espionagem dos anos 60: uma parte de uma das estantes que abrigam garrafas de cachaça se abre; atrás dela, o museu com um acervo impressionante de garrafas e marcas antigas.
Entre uma infinidade de garrafas, marcas e variações, há a Extra Premium Sepultura, cachaça concebida em parceria com a banda de thrash metal Sepultura, em edição limitada e em estojo de luxo de madeira feita com pedaços do barril em que a bebida ficou armazenada, R$ 900. Já a cachaça Pinga Ni Mim é uma homenagem pelos 80 anos do cantor Sérgio Reis, produzida na fazenda Meia Lua, Minas Gerais. Outra, em uma garrafa de cerâmica da Germer, chega a R$ 1200. Há ainda a Hemp, primeira aguardente do Brasil elaborada com cannabis. Produzida pelo Alambique do Deley, no Rio de Janeiro, tem em sua composição terpênicos idênticos ao natural da planta, mas sem a presença do CBD (componente medicinal) e THC (que causa efeitos alucinógenos), preservando o aroma e sabor da planta. É bem herbal e autorizada pelo MAPA (Ministério da Agricultura e Pecuária), com registro e certificado, por R$100.
A cachaça é o terceiro destilado mais consumido no mundo, atrás apenas da bebida coreana soju e da vodka. São mais de 2 bilhões de cachaças produzidas anualmente no Brasil, com 1217 cachaçarias registradas, responsáveis por 5998 marcas. Segundo o Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), o Paraná é o sexto maior produtor da bebida e o terceiro maior exportador do país.
O Templo
A história do Templo da Cachaça, uma construção imponente de três andares em uma das principais vias do bairro do Uberaba, começa em 2015. Orlando Osmar Regis, proprietário da cachaçaria Regui Brasil, desejava expor sua coleção, à época com 4 mil exemplares, então guardadas em caixas. Vieram mesas para degustação, eventos, jantares mensais para reunir amigos e entusiastas da cachaça. O espaço virou lugar obrigatório para quem consome a bebida e entendeu que o caráter pejorativo ligado ao produto, como de baixa qualidade, ficou no passado.
Um dos maiores colecionadores do Brasil, seu Orlando, como é conhecido, entende ter uma missão: derrubar o mito de que a cachaça é uma bebida alcoólica de qualidade inferior. Para isso, realiza, no próprio templo, jantares mensais harmonizados com cachaça. Nesses encontros, antes da degustação, leva os participantes a uma história da aguardente e de seu processo complexo de produção e armazenamento, até ser engarrafada. E reforça sua crença na bebida como um destilado de qualidade e o único legitimamente brasileiro. Os encontros são embalados por música ao vivo e boas conversas.
Seu Orlando resgatou a antiga marca Trivisan em 2019. Produzida desde 1923 em São José dos Pinhais, foi descontinuada em 2008. Histórica, foi pioneira na produção de cachaça em lata, nos anos 60. Em nova fase, lança a Trivisan Edição Turismo, edição especial da marca. Com uma garrafa leve e de fácil transporte, chega ao mercado com objetivo de ser uma boa recordação para o turista que visita Curitiba. São quatro rótulos diferentes, que fazem alusão a ícones da cidade: Jardim Botânico, Museu Oscar Niemeyer, Ópera de Arame e Parque Tanguá.
"O que vai aumentar o consumo da cachaça é o coquetel", projeta seu Orlando. Com Turismo, a ideia é que ela seja também utilizada na criação de drinks. "Uma cachaça pura de alambique, boa para degustar pura, inclusive gelada, ou também para fazer excelentes drinks e coquetéis,” define.
Em maio deste ano, a Regui Brasil Carvalho Americano, marca do Templo da Cachaça, conquistou o terceiro lugar no VI Ranking Cúpula da Cachaça. A bebida já estava entre as 50 classificadas que passaram pela avaliação do juri. O concurso da Cúpula, o mais abrangente e participativo de cachaças do país, teve três fases. Todas as cachaças legalizadas do país foram convidadas a participar.
Uma fase de votação online aberta a todas as pessoas interessadas em cachaça - são quase 6 mil marcas registradas - classifica as 150 cachaças mais citadas, que passam para a segunda fase. Então, especialistas de todo o Brasil escolhem as 50 finalistas. Na última fase, o juri realiza a degustação às cegas, que ranqueia as melhores cachaças em três categorias, e escolhem a Cachaça do Ano. A Regui Brasil conquistou medalha de bronze na categoria Armazenadas/Envelhecidas.
"A conquista do 3º lugar é uma alegria imensurável, aquela sensação de que todo o trabalho e todo o esforço valem a pena porque há reconhecimento”, comemora Orlando.
Com o tempo, a cachaça deixou de ser algo não só apreciado exclusivamente por homens como também produzido apenas por eles. O Templo da Cachaça é um bom exemplo da mudança positiva de comportamento também no setor. Hoje, reúne em sua loja uma lista considerável de destilados cuja produção é liderada por mulheres. Entre os destaques, está o o blend Cinco Almas, bebida colaborativa elaborada pela cientista de alimentos Aline Bortoletto, que reuniu cinco produtoras relevantes do Brasil, de quatro estados diferentes, para criar um destilado único lançado no Dia Internacional da Mulher. A partir das cinco amostras das convidadas e de dois anos de trabalho, a cachaça foi harmonizada em madeiras de umburana, carvalho, freijó, jaqueira e jequitibá. Elk Barreto Silva é uma das “almas” e acredita que a iniciativa é uma forma de mostrar que as mulheres também se destacam no mundo da cachaça.
O Museu
Nas instalações do Templo, o Museu da Cachaça reúne atualmente 2 mil rótulos de garrafas muito antigas, produzidas em diversas épocas: dos anos 50 aos 80. Conta com 250 rótulos produzidos ao longo desse período na região agrícola de Curitiba, o que envolve a cidade, Região Metropolitana e litoral. Era esse o entendimento geográfico do Ministério da Agricultura na ocasião. Curiosidade: Curitiba nunca teve alambique registrado, mas reunia centenas de marcas padronizadas e engarrafadas na cidade.
Raras, as 250 garrafas deste acervo específico não são comercializadas - grande parte delas foi produzida há mais de 40 anos. Há ainda um pequeno alambique para o visitante poder visualizar e entender o processo de fabricação da cachaça. Aos visitantes, seu Orlando se posta diante desse espaço e explica, como um professor, todas as etapas da produção da aguardente.
As visitas no museu precisam ser agendadas, sobretudo para grupos. O preço é de R$ 30 por pessoa, que pode ser revertido em até 10% de desconto nas compras individuais realizadas visitante no dia. Ou seja, se o cliente gastar R$ 300 na loja, a visita no museu fica gratuita.
Aulas e Workshops
O espaço também promove eventos e aulas show com a curadoria da mixologista e master distiller Cissa Mariah, CEO do Grupo by CM e bartender residente no Templo.
Entre os cursos e formação da Cissa, está o de especialista em “Cachaças e Madeiras”, pela LABM de Minas Gerais – um dos principais laboratórios do país.
Serviço:
Templo da Cachaça
Av. Senador Salgado Filho, 3156 – Uberaba
@templodacachaca / (41) 99972-5055
Loja e museu de terça a sexta, das 13h às 18h e aos sábados das 10h às 18h.
*O museu também funciona excepcionalmente durante os eventos previamente marcados.