Bom Gourmet
Há quatro gerações na mesma família, Bar Makiolka mostra que é possível atravessar os anos sem perder tradição

Leandro Makiolka, proprietário, corre de ponta a ponta do balcão para servir todos os clientes. Crédito: Gabriel Faria
Quem entra pelas portas do Bar Makiolka sente como se tivesse aberto uma cápsula do tempo. Nas paredes, são expostas garrafas, máquinas e peças de decoração antigas, algumas com mais de cinco décadas de existência. Sobre chão de azulejos, daqueles decorados com cubinhos, fica um balcão de fórmica vermelha típico dos armazéns do passado. Tudo é iluminado de cima por um velho letreiro que anuncia: “desde 1932”.
A atmosfera não é criada apenas pelo visual. Atrás do balcão, o proprietário, Leandro Makiolka, atende aos pedidos e fala com os clientes, chamando todos pelo nome e fazendo a proeza de manter três conversas diferentes ao mesmo tempo. O ambiente remete ao passado, mas o movimento deixa claro que o que importa aqui é o presente – e o bar está mais vivo do que nunca.
Enquanto cada vez mais bares tradicionais fecham as portas, o Makiolka atesta que ainda existe lugar para fazer as coisas “à moda antiga”, desde que adaptadas aos novos desafios do mercado. A casa não só perdura por quase um século, como também passou todo esse tempo administrada pela mesma família – um feito surpreendente quando apenas sete de cada cem empresas chegam à terceira geração, segundo dados do IBGE.
“Para tocar um bar, precisa ter feeling. A gente tem uma pegada, que eu aprendi com meu pai, de sempre ter pessoalidade. Lembrar os nomes das pessoas, o que fazem e o que gostam. Isso cria um vínculo e fortalece a afinidade com o negócio”, explica Leandro.
No Makiolka, tudo foi passado de geração em geração. Leandro assumiu o posto do seu pai, Luís Cláudio, que por sua vez, sucedeu os tios Leonardo e Antônio. Quem começou o negócio foi o bisavô Theodoro, que abriu um armazém de secos e molhados nos anos 1920 e, em 1932, construiu o prédio que ainda hoje abriga o bar.
A hora da sucessão
Para Leandro, assumir o balcão foi uma decisão óbvia. “Eu estou aqui desde criança. Sempre ajudei e trabalhei aqui”, conta. Por conta dessa afinidade com a operação, o empresário soube como tocar o negócio e a transição pode ser feita de forma gradual. Luís Claúdio começou a aparecer menos vezes por semana, até que, durante a pandemia, passou o bastão em definitivo.
Os clientes da casa não sentiram a mudança. Continuam chegando no balcão e pedindo a clássica batida de maracujá ou os famosos espetinhos da casa e, claro, encontrando a boa resenha de sempre. “A grande sacada foi não mudar, mas manter a tradição", diz Leandro.
Claro, algumas mudanças aconteceram. Principalmente ligadas à presença do bar nas redes sociais e ao gosto do filho pelo rock, que se tornou obrigatório nas caixas de som do Makiolka. Mas as bebidas, os petiscos e o funcionamento da casa continuam intactos.
A gente foi de ser um bar regional que não passava cartão para manter redes sociais da casa. As redes sociais são o melhor caminho para oferecer aquela mesma coisa que sempre deu certo. É preciso expor e dizer ‘estou aqui’. O ‘boca a boca’ não funciona mais, hoje ele acontece nos aplicativos e na internet, explica Leandro
Nas redes, o Makiolka conseguiu aproveitar de sua história para usá-la como chamariz à novos clientes. A partir do estudo das plataformas, Leandro entendeu que era preciso mostrar aos consumidores que ali estava um dos bares mais antigos da cidade, e isso foi essencial para quebrar a barreira da regionalidade.
“Antes, para vir aqui, as pessoas precisavam passar na porta e ver que o bar está aberto. Hoje, é possível saber se o lugar está funcionando pela internet e pedir um Uber do outro lado da cidade”, explica.
O segredo para uma transição de sucesso
Ricardo Urso, sócio fundador da Urso Consultoria Empresarial, explica que conhecer a operação com detalhes é fundamental para uma sucessão bem-feita. “Muitas vezes os filhos entram na empresa sem ter a preparação para assumir um cargo de gestão. O pai está lá há 30, 40, 50 anos. Ele que fundou, deu a cara e a metodologia de trabalho. Quando vem um filho, ele vem com outra visão. E aí mora o perigo da falta de preparação”, explica.
Para o especialista, a sucessão deve ser tratada como um processo longo e complexo, e por isso é importante planejar tudo com antecedência. “Uma boa prática é registrar e mapear os processos de forma clara, para que quem chegue lá possa ter acesso a esse manual de boas práticas”, diz.
No caso do Makiolka, foram os anos de experiência que Leandro adquiriu junto com o pai que ditaram o sucesso. Desde adolescente, o empresário aprendeu não só a servir e conversar com os clientes, mas também cuidar do caixa e toda a parte administrativa da operação. E até hoje, quando enfrenta alguma situação em que não sabe bem o que fazer, Luís Cláudio é a primeira pessoa que procura.
“De alguma maneira, ele já fez aquilo que eu estou tentando fazer durante suas décadas no balcão. Saber a hora de tirar ou colocar algum item no cardápio, se subo ou baixo o preço da cerveja, se preciso mudar alguma receita... Ele tem conselho para dar sobre cada momento’, conta.
Olhar para o futuro
Leandro se preocupa em ensinar a operação a todos os que trabalham ao seu lado, desde a parte administrativa até o atendimento. “Quem trabalha com a gente consegue tocar o negócio ou abrir sua própria empresa. Seja para garantir a longevidade ou para que o legado continue em um novo empreendimento, sempre estou ensinando”, compartilha.
O empresário tem um filho de nove anos, e já adianta que irá apoiá-lo independente da carreira profissional que decidir seguir. Seja quem for que irá carregar a tocha do Bar Makiolka, Leandro diz entender a importância de preparar o terreno e repassar o que aprendeu, da mesma forma que seus antepassados fizeram ao longo das décadas.
Ricardo Urso ressalta que empresários que buscam a sucessão podem procurar a assistência de profissionais especializados no processo, para entender como o conduzir e adaptar conforme as necessidades do negócio.
“Não existe receita de bolo na sucessão. Cada caso é um caso e o processo é complexo. Profissionais como advogados e psicólogos podem ajudar a tornar isso mais simples”, explica. “Espaço para sobrevivência sempre vai existir para quem faz um bom negócio, entrega um bom produto e tem um bom atendimento”.
Bar Makiolka
Local: Avenida Monteiro Tourinho, n° 1000 - Tingui.
Funcionamento: segunda a sexta, das 15h às 00h; sábado, das 11h às 00 horas; e domingo, das 11h às 16h.
Instagram: @makiolka.bar32



