Bom Gourmet
Brigadeiros ganham novas versões na briga pelo mercado

O velho e tradicional brigadeiro, quem diria, é motivo de inspiração e de negócios lucrativos para muitos empreendedores. Na busca por um diferencial, a saída é investir em sabores exóticos — tem brigadeiro até de vinho e queijo brie — e combinações inusitadas. Mas a estratégia vai além das lojas e quiosques em shoppings. No radar, estão vendas pela internet e casamentos.
Mas o segmento tem desafios e paixão pelo doce não basta. Segundo doceiras ouvidas pelo Agência GLOBO, é preciso muito planejamento para iniciar o negócio. Um exemplo é o da veterinária Carolina Sales, que cursava sua segunda faculdade e percebeu que precisava complementar sua renda para arcar com as despesas extras do curso de medicina. Assim, há 11 anos, teve a ideia de apostar em um de seus pratos favoritos: o brigadeiro e criar a “Carolina Sales – Patisserie de Brigadeiros”. Ela lembra que, recém-casada na época, decidiu montar uma pequena fábrica no próprio apartamento de apenas um quarto.
“A casa virou uma pequena fábrica em poucos meses. Percebi que o Rio de Janeiro era muito carente de doces melhores, mais bem elaborados. Sempre gostei do doce, mas minha avó era quem preparava para minhas festinhas de criança. Quando decidi desenvolvê-lo em uma versão gourmet, minha avó Cora deu os primeiros passos comigo. Criar os doces é muito prazeroso”, recorda-se Carolina.
Apesar da popularidade dos doces, os primeiros passos foram de “muito trabalho e pouco lucro”, como a própria Carolina define. Por isso, decidiu adaptar sua estratégia: em vez de crescer com lojas em shoppings, decidiu criar um site e fornecer para redes de supermercados, como o Zona Sul. Hoje, a empresa conta com 21 funcionários e prevê aumentar o faturamento em 40% neste ano em relação a 2014.
“Iniciamos uma ideia de expansão através de quiosques em shoppings e vimos que não era interessante. Dá mais trabalho do que lucro. Então mantivemos nossas lojas mais importantes (BarraShopping, Condado de Cascais e Barra Square) e estamos expandindo de outras formas. Temos hoje freezeres com nossos doces congelados no Supermercado Zona Sul, temos a parte de encomendas para festas, temos a parte de eventos”, detalha Carolina.

Por isso, a doceira-empresária diz que planejamento é fundamental. Isso ajuda, diz ela, a evitar prejuízos e ganhar tempo. Por isso, ela orienta a qualquer empreendedor a buscar uma consultoria financeira. Carolina destaca ainda que controlar a gestão em uma empresa que está crescendo fica ainda mais difícil:
“Controlar a gestão de uma empresa caseira é mais fácil. Quando fica maior, vem o desafio. A gestão é o maior deles, tanto de pessoas quanto do dinheiro. Quando abri não fiz um planejamento grande. Era um teste, não sabia que teria tanto crescimento. O mais difícil é produzir o que se vende e ainda mais sendo artesanal. No meu caso, o produto é super perecível, então dependo de excelentes funcionárias em meus pontos de venda para mantê-los com qualidade.”
Casamentos assustam
Assim como Carolina, a paixão pelo doce também acompanha a vida da paulista Giuliana Cupini, formada em administração e com pós-graduação em marketing. Giuliana Cupini — hoje chef — brinca que faz brigadeiro desde os seis anos. Na adolescência, vendia os doces e, com o dinheiro, investia em cursos. Com as economias, chegou a ir para Chicago estudar na escola Wilton School of Cake Decorating, especializada em formar “cake designers”.
“Depois do curso, voltei, pedi demissão da empresa em que trabalhava e comecei meu próprio negócio. Para minha surpresa, meu pai havia preparado um apartamento dele que tinha ficado vago para iniciar minha carreira solo. Pintou o apartamento inteiro, preparou a cozinha, tudo surpresa! A minha experiência (ela já tinha trabalhado em duas multinacionais) foi imprescindível para saber como iniciar um projeto e acompanhar a administração dos resultados”, lista a chef.
Giuliana decidiu, então, apostar em brigadeiros trufados. Mas ela costuma brincar que, mesmo pequeno, o brigadeiro é complexo:
“Um simples brigadeiro tem um custo complexo, pois envolve, além da matéria-prima, os custos com mão de obra, embalagem e estrutura do local de trabalho (aluguel, luz, água, gás, etc). E, por ser um produto com custo menor e preço de venda baixo, o ideal é ganhar na escala de produção e venda. É preciso tomar cuidado com a qualidade do produto, pois um brigadeiro açucarado é a pior coisa do mundo. Manter o frescor é fundamental”, opina.
A chef lembra ainda do seu primeiro grande desafio: uma encomenda de três mil doces para um casamento.
“Chamei até minha avó para ajudar! Foi um momento inesquecível. Busquei ajuda de uma prima que também tem confeitaria no interior de São Paulo, em Marília, para ajudar no planejamento da produção das massas e depois da finalização para entrega. Depois de 18 anos, com toda a experiência acumulada, ainda me dá um frio na barriga quando vou montar um casamento”, recorda.

Mas o que move o seu cardápio são os sabores inusitados. Ela cita o caso do brigadeiro de goiabada com vinho branco e um pedacinho de queijo brie. Outro exemplo: brigadeiro de framboesa com calda de amora ou o brigadeiro de vinho do Porto. Por isso, ela — que hoje conta com oito funcionários e pretende aumentar em 30% seu faturamento em 2015 — dá algumas dicas para quem está começando.
“A maioria dos brasileiros sabe fazer brigadeiro. A concorrência é sempre maior. O segredo é não desistir e persistir. Fazer o preço de venda, escolher a melhor forma de divulgação, fazer um cadastro de clientes para explorar, tudo contribui para evitar o fracasso. E se atualizar sempre, buscando inspiração para se diferenciar no mercado.”
E exemplos como a de Carolina e Giuliana não faltam. A doceira Fabiana D’Angelo também começou na área de modo experimental, fazendo doces por paixão para os amigos. Assim, naturalmente, passou a aceitar encomendas para ter uma renda extra enquanto cursava faculdade de Belas Artes. Nascia assim, há 15 anos, a marca que leva seu nome — e que hoje conta com três lojas no Rio (Fashion Mall, Rio Design Leblon e Shopping da Gávea).
“Eu não achava que fazer brigadeiros poderia ser uma profissão de verdade. E foi justamente essa minha ligação com o mundo das artes que me fez perceber que poderia reinventar a maneira de consumir o docinho predileto dos brasileiros, transformando cada brigadeiro em minha pequena obra de arte”, diz Fabiana. “Há 15 anos, não existia o mercado dos brigadeiros gourmet. Hoje, posso dizer que a escolha de trabalhar com brigadeiros foi acertada.”
Para ela, o maior desafio foi levar o doce diferente para as festas de casamentos.
“Até então brigadeiro não era servido em casamentos, porque não era chique e realmente não era mesmo. Mas com a mudança do visual do brigadeiro, consegui o primeiro casamento há uns nove anos”, ressalta Fabiana.
Por isso, Fabiana diz que passou também a buscar novos sabores. Na lista, há opções de limão, de doce de leite e Ovomaltine. Além disso, diz ela, há as combinações de cookie (biscoito) com brigadeiros. Com o cardápio ampliado, Fabiana confessa que já recebeu propostas até para abrir franquias.
“Mas ainda não aceitei porque faço questão de estar presente na produção diária da minha fábrica e acredito que a expansão de atividades de produtos artesanais precisa ser muito bem planejada para que não se perca qualidade. Brigadeiro todo brasileiro faz. É uma receita tradicional. Então, a minha dica é se preocupar com o frescor e a apresentação do produto”, diz ela, que conta com 28 funcionários e espera alta de 20% no faturamento.