Bebidas
Não caia nessa, não existe vinho naturalmente azul
Dois novos vinhos azuis do Brasil e da Espanha chegaram ao mercado recentemente sob críticas de especialistas. Os rótulos Azul Ice e o Vindigo, das vinícolas Casa Motter (Brasil) e Bodegas Perfer (Espanha), respectivamente, embarcaram na tendência que apareceu no verão do ano passado na Europa e deve se repetir novamente este ano: a dos vinhos azuis.
Não é difícil encontrar nas redes sociais fotos de pessoas enchendo as taças com o vinho azul, geralmente em bares descolados ou na beira da piscina. E é exatamente a isso que estes rótulos se propõem, um momento de descontração segundo o enólogo Michel Giacomelli Motter, da vinícola gaúcha Casa Motter.
O Azul Ice é o lançamento mais recente entre os vinhos azuis, e foi criado por Motter após dois anos de pesquisas. Ele contou que experimentou diversos rótulos semelhantes na Europa, testou o uso de corantes naturais de algas e plantas, mas acabou usando um corante alimentício para dar a tonalidade azul à bebida.
“Não existe vinho naturalmente azul no mundo, todos eles levam corante. Uns mais, outros menos, mas todos são ‘colorizados’ artificialmente”, explica. O processo de produção é o mesmo de um vinho branco, e o corante é adicionado ao final antes de ser engarrafado. O Azul Ice é produzido com uvas moscato e tem um paladar levemente adocicado que, segundo o enólogo, não é afetado pelo corante.
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Já o Vindigo, da vinícola espanhola Bodegas Perfer, foi lançado em meados do ano passado se dizendo totalmente natural, pois utilizaria um método diferente de produção. Segundo a fabricante, a tonalidade azul seria obtida através da antocianina, um pigmento orgânico presente na casca da uva Chardonnay, informação não confirmada pela reportagem do Bom Gourmet.
Para o sommelier Wagner Gabardo, da escola de difusão da cultura do vinho Alta Gama, em Curitiba, os produtores elaboram estes vinhos azuis apenas por uma questão de marketing. O sabor em si acaba ficando em segundo plano.
“Sobretudo porque é uma coisa induzida, manipulada, para chegar nessa cor. É diferente de quando a gente fala de vinho laranja, por exemplo, em que há um processo secular de produção. O vinho azul é um vinho super simples, pra mim não combina”, critica o sommelier. Para ele, é uma invenção de moda que não deve ter futuro.
Bom para foto
Da mesma opinião de Gabardo é a sommelier curitibana e jornalista Elis Cabanilhas Glaser, que foi à Espanha recentemente para provar o Sopié Frizzante Chardonnay. O vinho, da vinícola La Navarra, também se diz colorizado azul de forma natural, com a maceração das cascas da uva. A sommelier explica que o vinho é melhor na foto do que no paladar.
“É um vinho descontraído, algo que ficaria entre um coquetel e um vinho doce, para um dia de diversão entre amigos”, conta.
Tanto o Sopié que a sommelier provou como o Azul Ice e o Vindigo têm tonalidades azuis que variam do claro ao mais intenso, e aromas frutados e florais com uma acidez levemente equilibrada.
Polêmicos perante a lei
Embora sejam fotogênicos e agradáveis para dias de calor, os vinhos azuis seguem à margem da legislação. O primeiro, lançado em 2016, colocou a startup espanhola Gïk em rota de colisão com a União Europeia.
Pelas regras do bloco comercial, os vinhos azuis não se encaixam em nenhuma das 17 classificações de produtos vinícolas. A empresa precisou reformular o rótulo e a descrição, vendendo-o como uma bebida alcoólica comum feita de “99% de suco de uva e 1% de mosto”, disse Taig Mac Carthy, um dos co-fundadores do Gïk, ao jornal The New York Times na época.
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No Brasil acontece o mesmo, já que a legislação não reconhece a existência de vinhos azuis. O Azul Ice, da Casa Motter, é classificado como um coquetel composto para beber. O rótulo pode ser encontrado em bares e empórios do Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo e Minas Gerais em torno de R$ 25 a R$ 30. Já o Vindigo é vendido apenas em bares e lojas da França a 12 Euros (cerca de R$ 54).
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