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Com drink inspirado nas festas juninas, bartender de SP é eleito o melhor do Brasil
SÃO PAULO – O bartender Gabriel Santana, à frente do paulistano Benzina Bar, na Vila Madalena, foi escolhido para representar o Brasil em setembro na final mundial do World Class Competition 2019, o maior campeonato de coquetelaria, em Glasgow, na Escócia. A última etapa nacional do campeonato ocorreu ao longo dos últimos dois dias, 17 e 18 de junho, durante a primeira edição do Bar Convent São Paulo, congresso que reuniu as principais tendências sobre mixologia.
Não é a primeira vez que Santana leva um título World Class. Em 2017, o bartender também ganhou o campeonato da Suíça, onde trabalhou com foco em hotelaria.
Como foi a final do World Class Brasil
Uma das últimas etapas do concurso que começou em março ocorreu em duas partes ao longo desta segunda e terça-feira. Na primeira, os competidores apresentaram dois drinks autorais com a temática “Home and Away” – um inspirado em seu país de origem e outro na Escócia, onde ocorrerá a final mundial, em setembro. Por fim, passaram pelo “speed challenge”, o desafio de velocidade. Cada competidor precisou preparar seis coquetéis em seis minutos, sorteados na hora.
“Recebemos uma lista de 30 coquetéis com clássicos como o Cosmopolitan e outros mais esquecidos, como o blood and sand [à base de whisky, vermute, licor de cereja e suco de toranja], o Boulevardier [com Campari, vermute vermelho e whisky bourbon] e o Paloma [feito com tequila e refrigerante de toranja]”, explica Vinícius Kodama, do Ponto Gin, em Curitiba. O bartender também chegou à final nacional do World Class em 2017.
A qualidade dos drinks e o bom uso dos ingredientes foram pontos que chamaram atenção da canadense Lauren Mote, uma das sete juradas do World Class e embaixadora da Diageo, empresa que organiza o evento. “O Brasil tem uma riqueza de diversidade com tantos ingredientes nativos. É muito legal ver os bartenders colocando essas referências nas suas apresentações. Todos os drinks estavam muito bons”, disse em entrevista exclusiva ao Bom Gourmet, durante o Bar Convent São Paulo.
Segundo a especialista, que levou o título World Class em 2015, o uso consciente dos ingredientes tem sido, mais do que nunca, um diferencial no processo. “Queremos que eles prezem pela sustentabilidade de uma forma criativa. O World Class é a chance que eles têm de mostrar isso a uma audiência global”.
Gabriel Santana cumpriu com o requisito especialmente em seu drink em homenagem ao Brasil, inspirado nas festas juninas. “O Brasil é um país cheio de tudo, não tem como colocar ele todo num copo. Mas vou tentar colocar os principais ingredientes dessa tradição”, brincou o bartender enquanto misturava cordial (licor) de pinhão e cacau feito com whisky Bulleit, licor de amendoim e espuma de canjica em um copo baixo de vidro.
“Eu torrei meu próprio cacau e com os resíduos e fiz um chocolate que acompanha este drink”, disse Santana. Ele reaproveitou outro ingrediente: do licor de amendoim, fez pé de moleque. “Não pode faltar em uma festa junina, né?”.
Os outros três competidores não ficaram atrás na inventividade – do caldo de mandioca brava fermentada de Rafael Welbert, bartender do Balaio IMS (restaurante do chef premiado Rodrigo Oliveira), à manteiga de cacau com fava tonka, a baunilha brasileira, de Vinícius Kodama, do bar curitibano Ponto Gin. Gabriel Bueno, do DOM, que fica na vila gastronômica Souq, em Curitiba, seguiu por um caminho mais fresco, mas tão brasileiro quanto seus concorrentes: apostou na combinação da tradicional tiquira, aguardente de mandioca muito popular no nordeste, e caldo de cana com limão taiti.
Veja os drinks criados pelos finalistas do World Class 2019
A versão “home” de Rafael Welbert, do Balaio IMS, foi um drink à base de mandioca brava. Com o rosto pintado uma faixa vermelha de uma têmpora à outra em homenagem às tribos amazônicas, o bartender explicou que processou e fermentou o ingrediente nativo da Amazônia por sete dias. “Depois, clarifiquei com agar agar até torná-la translúcida e reduzir um pouco os taninos, mas sem perder a acidez”, completou. Welbert usou também vermute branco, vodca com aroma de mel e extrato de pequi.
Em seu drink de homenagem à Escócia, o bartender se inspirou na flor de cardo, o maior símbolo do país. Ele traduziu a característica herbácea da planta através de um amargo de alcachofra, que foi combinado a uma tintura de aipo infusionado por duas semanas, vermute tinto e o clássico whisky escocês Johnnie Walker Gold Label. O coquetel foi servido em um cálice de vidro com uma espuma roxa de hibisco.
Gabriel Santana optou por outras referências escocesas. Usou uma base de scotch ale com bitter de lúpulo e toranja, finalizado com um splash de shortbread (tradicional bolinho feito de manteiga, farinha e açúcar) em seu coquetel “away”. A versão nacional foi uma homenagem às festas juninas brasileiras: em uma apresentação descontraída, o bartender serviu pipoca aos sete jurados e montou o drink com os principais ingredientes desta época do ano – fez um cordial de pinhão e cacau com whisky Bulleit, licor de amendoim levemente salgado e espuma de canjica.
Vinícius Kodama se inspirou em designers e arquitetos para criar seus dois coquetéis. O primeiro, “Rocks against Diamonds” teve como homenagem Lina Bo Bardí, italiana radicada no Brasil. Servido quente em um copo esférico de cerâmica, o drink foi feito a partir de Tanqueray Ten, café orgânico Minamihara com aroma floral e sabor cítrico, manteiga de cacau com tonka e mel de mandaçaia. Seu drink com inspiração escocesa foi o “Leaf and Flower”, inspirado em Charles Rennie Mackintosh: o bartender usou a base de Johnnie Walker Gold Label com hidromel, chá preto, limão siciliano e ácido lático para dar corpo à bebida.
Gabriel Bueno também usou whisky Gold Label em seu drink autoral em homenagem à Escócia, mas de uma forma inusitada. “Torrei a aveia, ingrediente que teve muita importância para eles em uma época de difícil acesso à alimentação, e fiz uma infusão simples de 24 horas”, conta. O destilado foi combinado a um shrub de framboesa feito com vinagre de maçã. Na versão brasileira, Bueno criou um drink mais leve. “Raízes” foi feito com cachaça Ypióca Cinco Chaves, tiquira (aguardente de mandioca), óleo de limão taiti, caldo de cana, hortelã e água tônica.
*A repórter viajou a convite do Bar Convent São Paulo
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