Bebidas
Entrevista com o enólogo Adriano Miolo
Em Curitiba para apresentar a safra 2012 do Lote 43, a última a chegar ao mercado, Adriano Miolo conversou com o Bom Gourmet sobre o presente e o futuro da enologia no Brasil. Historicamente dominado pelas castas francesas, o cenário, segundo ele, começa a mudar: “Os produtores estão se voltando para as variedades italianas como Sangiovese, Nebbiolo e Teroldego. Na Miolo estamos testando o Nero D’Avola e o Primitivo”, explica o bisneto do fundador da vinícola gaúcha.
Mas, enquanto os testes avançam, o consumidor brasileiro ainda prefere e busca uvas francesas, que além de serem sinônimo de qualidade tem uma produção consolidada no país. Não por acaso, as castas da França são as que compõem os rótulos do Lote 43, corte de 60% Merlot e 40% Cabernet Sauvignon, e que hoje é o vinho ícone da vinícola. O nome deriva do primeiro pedacinho de terra de 24 hectares, só 19 dos quais são cultivados, que foi comprado em 1897 pelo viticultor italiano e fundador da marca, Giuseppe Miolo.
A primeira safra é de 1999 e, em 17 anos, apenas sete rótulos foram lançados. “São safras excepcionais e não é todo ano que conseguimos essa qualidade. Cada safra rende cerca de 90 mil garrafas”, conta Miolo. As safras 2004, 2005, 2008, 2011 e 2012 foram apresentadas numa degustação vertical realizada no começo de junho em jantar harmonizado na Vin Bistro.
Confira a entrevista.
Quais são as características da safra 2012 do Lote 43?
É um vinho de guarda, que envelhece muito bem, produzido num pequeno lote de terra de 24 hectares, embora só 19 sejam cultivados, com um terroir único, como se fosse um grand cru francês. O 2012 é intenso, encorpado e vai muito bem com carnes.
De todas as safras do Lote 43 produzidas até hoje, na sua opinião, qual se destaca?
É difícil dizer, são diferentes uma da outra e não tem como comparar.
Embora o Sul do Brasil tenha sido colonizado por imigrantes italianos, a produção brasileira foca nas castas francesas. Por quê?
Os imigrantes italianos trouxeram as castas da Itália, mas não deu certo e eles passaram a cultivar as variedades americanas. Nos anos 1970, quando chegaram ao Brasil os grandes grupos franceses como Moët & Chandon, foram introduzidas as castas francesas e graças às novas técnicas a produção deu certo. Das italianas daquela época, só a Moscato sobrevive.
Porém atualmente há tentativas de introduzir novas castas.
Sim, os produtores estão se voltando para as variedades italianas como Sangiovese, Nebbiolo e Teroldego. Na Miolo estamos testando o Nero D’Avola e o Primitivo.
E o consumidor brasileiro prefere quais castas?
A procura por Cabernet Sauvignon é muito forte porque é uma casta que tradicionalmente é associada a vinhos de melhor qualidade.
O que falta ao Brasil para despontar na produção vinícola?
O principal fator que trava o setor é o consumo per capita que ainda é muito pequeno. Só se aumentarmos o consumo vamos conseguir avançar. Um dos problemas, porém, é o preço muito alto da bebida que só um grupo restrito da população pode pagar. Isso depende dos impostos que são muito altos no Brasil. Enfrentamos também a concorrência da cerveja barata que um hábito de consumo enraizado na população.
E do ponto de vista técnico?
A técnica já temos, mas falta disseminá-la. Hoje já temos seis regiões produtoras, quatro no Rio Grande do Sul, o planalto catarinense e o Vale do São Francisco, e outras estão despontando como Paraná, Minas Gerais e Goiás. E com certeza daqui a dez anos teremos mais regiões ainda.
Olhando globalmente, quais regiões vinícolas no mundo estão despertando mais interesse atualmente?
A Austrália cresceu muito em termos de produção nos últimos anos, mas agora estabilizou. Outro grande gigante adormecido é a China, tem um futuro de grande produtor em volumes, embora a qualidade dos vinhos do Velho Mundo – França, Itália e Espanha – continua sendo indiscutível. No Novo Mundo, a Califórnia foi a locomotiva de muitos outros países como Argentina, Chile, África do Sul e Brasil.