Bebidas
Gostar de vinho faz de você um progressista? Um crítico de vinhos diz que sim
Quando estamos escolhendo um vinho para acompanhar o jantar, nossa decisão depende basicamente de questões como, “será que é bom?”, “cabe no meu bolso?”. Talvez possamos ainda escolher um vinho porque seu rótulo é atraente. Ou por ser local. Alguns vinhos apoiam causas filantrópicas. Alguns nos atraem pelos avisos de que são orgânicos, amigos do meio ambiente, sustentáveis. Algumas pessoas preferem consumir vinhos de pequenos produtores familiares ao invés de grandes empresas.
Essas escolhas refletem quem nós somos e o que buscamos em nossa vida. Mas será que há um ponto, ou uma filosofia ou ideologia política que define todos os amantes do vinho? O crítico de vinhos britânico Andrew Jefford afirmou em janeiro em uma coluna no site decanter.com, o site da principal revista sobre vinhos na Grã-Bretanha, que há sim um ponto em comum — ou, pelo menos, deveria haver.
Jefford chamou essa ideia de “vineísmo”. E é com certeza uma visão progressista, que apoia a inclusão e a tolerância, o que pode ser controverso. Ele se referia a reação a três movimentos políticos que colocaram em perigo a livre circulação do vinho: o movimento de independência da Catalunha, que ameaça a separação da Espanha; a saída do Reino Unido da União Europeia; e a cobrança de tarifas e o ceticismo sobre as mudanças climáticas do presidente norte-americano Donald Trump.
O vinho foi uma commoditie importante no comércio internacional nos tempos medievais, e sempre promoveu e beneficiou o livre comércio. “Nosso vinho só é o que é hoje por conta dos 800 anos de comércio internacional”, argumenta Jefford. “Seu refinamento e complexidade, e a prosperidade daqueles que produzem e negociam o vinho iriam ao colapso sem o comércio internacional.” O amor ao vinho é propício para uma perspectiva internacional. Argumenta contra o paroquialismo.
O vinho celebra a diferença. “Se você beber uma vodca de marca, uísque ou cerveja, vai repetir a mesma experiência todas as vezes”, escreveu Jefford. “Se tomar vinho, mergulha em um mundo de múltiplas diferenças” — colheita, local de origem, tipo de uva, etc. “O vinho nos ensina a lição valiosa de que nada acontece exatamente da mesma forma duas vezes no lugar ou no tempo, e essa diferença é digna de respeito.”
O vinho também se recusa a ser confinado em uma única identidade. Pode ser tinto, mas também é americano, californiano, cabernet, merlot ou pinot, de Napa ou de Santa Bárbara, da Howell Mountain ou Happy Canyon. E eu não sou só um homem branco. Tenho alma francesa dentro de um corpo escocês-irlandês-americano, e abraço diferentes identidades e contradições.
E em vez de “Reino Unido primeiro” na saída da União Europeia, ou “Estados Unidos primeiro”, Jefford defende o “meio ambiente primeiro”. “Vinho é agricultura, e a agricultura é totalmente dependente do meio ambiente e da nossa relação com ele”, afirma, nos lembrando que “não há fronteiras entre nações na natureza”.
Isso nos traz de volta à questão de como gastamos nosso dinheiro quando compramos vinho. Muitas adegas dedicam uma parte ou todo o lucro de alguns vinhos para causas sociais. A Smith Story Wines doa roupas para mães sem lar e seus filhos. A Colby Red apoia a pesquisa em doenças cardíacas. A Lubanzi Wines retorna seu lucro à África do Sul para ajudar os produtores de uvas, com o slogan “Vendido localmente, pensado mundialmente.”
A vinícola Iron Horse, produtora de espumantes top de linha, lançou vinhos que apoiam causas como a garantia dos direitos da comunidade LGBT e um rótulo para celebrar a lei da Suprema Corte para a equiparação dos casamentos.
Recentemente, a vinícola também lançou a 10ª leva da sua reserva que fica dentro do oceano, processo que beneficia a Associação Nacional Geográfica dos Estados Unidos. A Iron Horse doa 4 dólares de cada garrafa vendida para que a associação possa continuar estabilizando as áreas marinhas protegidas e promover a pesca sustentável.
A CEO Joy Sterling afirma que isso reflete na relação da vinicultura com o meio ambiente. “A saúde do oceano é a chave para o nosso microclima e a habilidade de fazer champanhe neste nível de elegância”, disse Sterling em um e-mail. “Está tudo entrelaçado.”
Entrelaçadas também estão as decisões que fazemos na hora de escolher um vinho. Céticos não precisam se sentir deixados de lado. Eles podem preferir um delicioso Russo Cuvée ou talvez um saboroso espumante da vinícola Trump.
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