Bebidas
Único “sake samurai” da AL dá dicas de como beber saquê
O Brasil é o primeiro e único país da América Latina a contar com um sake samurai. O título foi concedido em 2015 ao brasileiro Alexandre Tatsuya lida, da loja Adega de Sake, em São Paulo. O especialista estuda e vende o saquê, tradicional bebida japonesa obtida da fermentação do arroz, há mais de dez anos.
Além de um título bastante honroso, o sake samurai é equivalente ao embaixador da bebida para um país. Ele é concedido desde 2006 pela Associação Japonesa de Produtores de Saquê que anualmente seleciona de cinco a sete personalidades do mundo todo que trabalham para disseminar a cultura da bebida.
Tatsuya faz parte de um seleto grupo de profissionais. Atualmente, apenas 60 especialistas receberam o título no mundo, sendo a maioria do Japão, além de alguns de outros países como Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido, Austrália, Hong Kong e Tailandia. Ele é também certificado pelo Sake Service Institute, em Tóquio, como kikisake-shi, título equivalente ao sommelier de saquê, e professor da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS).
Para entender melhor o universo da bebida fermentada de arroz, o Bom Gourmet conversou com Tatsuya, que esteve em Curitiba para participar da Noite do Saque, no restaurante Tuna.
Quais tipos de arroz podem ser usados para fazer a bebida?
Vários, são mais de 100 espécies. Também é possível fazer saquê com o arroz comum japonês, mas não é recomendável produzir com o nosso arroz de mesa brasileiro, por exemplo, que é uma outra subespécie, muito pobre em amido. Para se produzir o saquê, o arroz precisa ter mais amido.
Como acontece a fermentação?
Ela acontece em uma única etapa, mas é uma fermentação paralela. Ou seja, enquanto há a conversão do amido em açúcar, já vem a levedura que transforma o açúcar em álcool. Chama-se fermentação paralela ou simultânea.
Quais são os tipos de saquê?
São 12 tipos de saquê, 5 categorias e 20 classificações. Cada saquê é uma combinação de tudo isso, o que resulta em milhares de possibilidades de saquê. Mas destes 12 tipos, os mais conhecidos no Brasil e no mundo, são o saquê sem adição de água destilada, que chamaremos de Junmai, e o Honjouzou. O Junmai é um saquê bastante encorpado, com uma finalização mais persistente, enquanto que o Honjouzo é mais leve, com um final mais curto. Isso apenas falando do corpo da bebida. Qualquer um destes tipos de saquê pode ser seco ou suave.
O que harmoniza com saquê?
Como são milhares de tipos de saquê, é difícil responder à pergunta. Mas vamos falar dos dois saquês mais comuns. O Junmai, que é bastante encorpado, combina muito bem com todas as carnes: bovino, suíno, aves e peixes. Elas podem ser fritas, à milanesa ou empanados, caem super bem. Já o Honjouzou fica melhor com pratos que não têm fritura, como um filé de frango. Ele combina com pratos mais leves, com pouco tempero.
O saquê pode ser usado para cozinhar?
Sim, existe um saquê próprio para isso, o saquê culinário. Nada que impeça usar qualquer tipo de saquê, mas aí é preciso consultar o bolso.
A temperatura altera o sabor do saquê?
Sim, e muito. Alguns saquês, inclusive, não devem ser aquecidos. Saquês mais básicos, que normalmente são mais em conta, podem ser aquecidos, enquanto os saquês mais refinados, de alto percentual de polimento do arroz, recomenda-se não aquecer. Em sua grande maioria, esses saquês são mais frutados ou florais, e se você aquecer, ele vai ficar com um aroma muito intenso, então é bom obedecer a um certo equilíbrio.
Na internet há muitas pessoas comentando que é possível beber saquê da mesma maneira que se bebe tequila, com sal. Isso é recomendado?
Nunca. No período feudal os japoneses tomavam saquê dessa forma, mas isso quando o saquê era caseiro, não era coado, não era filtrado, era extremamente leitoso e doce. Para equilibrar a papila, lambia-se uma pitada de sal. Hoje o saquê já é coado e a grande maioria é filtrado, então não há necessidade de tomar saquê com sal. Se fizer isso no Japão, o cara te expulsa do recinto.
O que distingue um saquê de qualidade?
A gente não costuma apontar a qualidade do saquê, mas existe o nível de sofisticação. Quanto mais polido for o arroz, mais refinada fica a bebida. Mas isso não significa ser melhor ou pior. Isso vai variar de acordo com o paladar de cada um. Quanto mais polido o arroz, mais frutado fica o sabor — e tem gente que odeia bebida frutada.
Como é o consumo de saquê no Brasil?
Algumas pessoas ainda acham que a bebida é consumida só em lugares frios, porque pensam que o saquê só se toma morno. Mas é apenas um direcionamento, porque o saquê se toma desde quente até gelado. Então pensei, aqui no Brasil, vamos beber saquê gelado, e aí comecei a desenvolver o mercado. No começo, lá em 2004, havia três marcas de saquês e cinco rótulos. Hoje já são 114 rótulos no Brasil. A partir deste ano, eu mesmo vou começar a fazer a importação e já tenho mais 40 rótulos engatilhados.
E o Brasil produz saquê?
O Brasil produz quatro rótulos de saquê, o Azuma Kirin, o Jun Daiti, o Thikará e o Ryo. Não é uma produção gigantesca a ponto de abraçar o mercado todo, mas dos poucos produtores de saquês do mundo, o Brasil está lá, o que já nos deixa feliz. Quem produz é a Austrália, recentemente a Nova Zelândia, Coréia, Taiwan, Noruega, Estados Unidos, Canadá, Espanha, Inglaterra, Brasil e, claro, o Japão.
Quais são os planos para o futuro da Adega de Sake?
A nossa ideia é de, lá por agosto ou setembro, abrir a primeira loja da Adega de Sake fora de São Paulo, aqui em Curitiba. Eu quero descobrir o mercado. Foi assim que eu criei o mercado de saquê. É um mercado pequeno. Não há um número para se exibir, mas é a garantia de que eu consegui mover isso. É uma pequena força, individual, mas a ponto de ser reconhecida pelo governo japonês.