Bebidas
Aquafaba, água do cozimento de grão-de-bico, substitui clara de ovo em drinks
Desde a descoberta fortuita de Joël Roessel, um culinarista e blogueiro francês, os vegetarianos passaram a guardar a água de cozimento de leguminosas. A aquafaba, líquido espesso resultante após o cozimento de feijões e de grão-de-bico, é rica em proteínas e tem substituído o ovo em preparos de confeitaria desde 2015 – em suspiros, suflês, merengues e macarons.
Não demorou para outros cozinheiros se interessarem pela técnica: na coquetelaria, a aquafaba entra como espessante no lugar da clara de ovo em drinks da categoria sour, que levam pelo menos um adoçante, um cítrico e um destilado. “Com a adição de um espessante é preciso bater o drink e isso cria uma crema: espuma por cima e um líquido encorpado embaixo”, descreve Vinícius Kodama, mixologista do Ponto Gin, bar de drinks em Curitiba.
A “mágica” acontece porque, quando agitadas, as proteínas envolvem bolhas de ar. Quanto mais se bate, menores ficam as bolhas, aumentando o volume da clara de ovo ou da aquafaba – e viram clara em neve. Nos coquetéis, no entanto, não é preciso atingir esse ponto.
A presença de um ingrediente cítrico dá estabilidade às proteínas, mantendo o drink “em pé” por mais tempo. “A aquafaba dá uma textura cremosa mais leve que a clara de ovo e você atinge um público maior, porque o drink é próprio para veganos”, avalia Rafael Welbert, mixologista do Balaio IMS, restaurante do chef Rodrigo Oliveira no Instituto Moreira Salles de São Paulo.
Em seus drinks, Welbert prefere usar lecitina de soja, pela facilidade de estocagem, validade e precisão e por uma questão logística. “Cozinhar o grão-de-bico requer tempo e mais processos no estabelecimento, nem sempre encaixa na questão de custos e de organização interna”, alerta. Foi essa a escolha do mixologista para o coquetel que apresentou na final do World Class 2019, em que os participantes deveriam criar um drink em homenagem à Escócia.
No Ponto Gin, a saída para usar aquafaba foi comprar o líquido do cozimento diretamente de uma empresa que vende leguminosas cozidas para food service. Por semana, são mais de dois litros usados pelo bar para fazer dois drinks: Elixer (R$ 28) e Metamorphosis (R$ 30), ambos incluídos na carta em julho. O primeiro leva gim, xarope de vinho com especiarias, suco de limão siciliano, aquafaba e canela queimada. O segundo é feito com gim, xarope de chá verde, suco de limão taiti, xarope de maracujá e damasco, aquafaba e pimenta rosa.
“A maior diferença está para quem faz o drink e não para quem bebe. Usar aquafaba economiza tempo de preparo: em vez de fazer o dry shake, bato uma vez só”, explica Kodama. O dry shake é quando o bartender bate duas vezes o coquetel: a primeira só com os ingredientes e a segunda, com gelo. Ao usar espessantes, seja clara de ovo, lecitina ou aquafaba, Welbert prefere fazer o dry shake reverso: a primeira com gelo e a segunda sem.
“Para emulsionar bem tem que bater bastante para arejar o líquido e formar a espuma. Se você bater só uma vez, não vai vai montar”, ensina Welbert.
Concentração é a chave
É possível ferver a aquafaba para reduzir o volume de água e concentrar as proteínas. Assim, a adição de líquido é menor no drink e o efeito, o mesmo. “A água de grão-de-bico cozido vendido em latinha é mais concentrada e fica mais fácil de manter um padrão”, indica Kodama. No Ponto Gin, Kodama substitui os 20 ml de clara de ovo pelo mesmo volume de aquafaba.
Das vantagens da aquafaba em relação à clara de ovo, Kodama elenca a validade e a facilidade em dosá-la. Em geral, a clara usada é a pasteurizada, vendida em embalagens tetra pak de dois litros. Porém, precisa ser consumida em até dois dias depois de aberta.